CULTURA

Que fim levou a fogueira?

Publicado em 25 de junho de 1999

Foi engolida pelo progresso. Com o crescimento das codades , as comemorações de São João migraram para as escolas ou parques públicos. No interior, as festas de rua continuam mobilizando as comunidades que prservam danças, costumes e comidas milenares da tradiçào cristã

Uma tradição que nasceu antes de Cristo. Queimar fogueiras, naquela época, significava saudar a chegada do verão e apenas no século VI o catolicismo associou as comemorações pagãs ao aniversário de São João. Os portugueses, no século XIII, incluíram São Pedro e Santo Antônio e, no Brasil, a data é celebrada desde 1583. De lá para cá, porém, as fogueiras juninas rarearam tanto que é preciso descobrir onde elas vão queimar nas noites frias de 24 de junho.

Cada estado brasileiro brinda o nascimento do santo católico a seu modo. “Existe uma grande confusão com o culto ao caipira”, revela o diretor-técnico do Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, João Alberto Menine. No Rio Grande do Sul as festas geralmente preservam os trajes típicos do estado, em oposição ao tradicional chapéu de palha e roupa remendada do folclore paulista. No nordeste, a música é o forró.

As grandes cidades acabaram engolindo os festejos de São João, que cada vez mais ocorrem em recintos fechados. “Não dá para fazer a festa na rua por falta de segurança e problemas com o trânsito”, diz Cristina Moll, coordenadora de Eventos do Colégio Farroupilha, na capital. O colégio tem uma das mais animadas festas de Porto Alegre, que este ano será de 21 a 26 de junho.

“A cidade grande retira um pouco da referência de comunidade. Isto vale para qualquer festa popular aberta. Hoje elas estão cada vez mais esvaziadas”, acrescenta Menine. A realidade no interior, porém, é outra. Em municípios como Rio Pardo, Capivari, Taquari e Santo Antônio da Patrulha, a receptividade é mais forte e mantém viva a tradição. Uma das mais fortes é andar – descalço – sobre as brasas da fogueira.

Apresentação de coral, dança e grupos de teatro, pescaria, simpatias para arrumar namorado, fogueira, pipoca, pinhão e quentão são atrações garantidas na festa organizada pelo Museu do Carvão, em Arroio dos Ratos. A diretora Sandra Foques estima atrair cerca de mil pessoas para a festa no dia 11 de junho. “Teremos também bailão popular e contratamos uma rádio para apresentar os artistas. Aqui na região, a comunidade participa bastante”, conta entusiasmada.

Em Porto Alegre, a festa junina do Parque Harmonia (26 e 27 de junho) retorna após dois anos de ausência. Agora ela vai para o calendário oficial de Porto Alegre. No Colégio Bom Conselho a cada ano tem festa junina. A quermesse do dia 19, segundo a coordenadora dos eventos, Ana Vasconez, terá pescaria, cadeia, sorteios, argola, telegrama, rádio para dedicatórias, cama elástica e piscina de bolinhas. “Nossa festa não tem cunho folclórico. É beneficente. A verba arrecadada é direcionada a asilos e creches carentes”, explica.

Desde os rituais pagãos de outrora até os cultos religiosos da atualidade, a ordem é brindar com fogueira, dança, música e comida. Para os povos antigos, o solstício do verão (no hemisfério norte) sinalizava o início da colheita. O fogo, então, representava proteção contra os demônios da peste, da falta de chuvas e da aridez da terra. A quadrilha, por sua vez, veio para o Brasil com família real portuguesa e trouxe junto a contradança – originária dos camponeses da Normandia francesa e da Inglaterra – que animava os bailes da realeza.

No Rio Grande do Sul o ritmo é o vanerão, que faz sacolejar bombachas e os vestidos rodados das prendas. No sudeste e centro-oeste os sertanejos têm a sua vez mas, no nordeste, impera o forró com o baião e o xaxado. Características regionais à parte, a ordem é se divertir. No Parque da Harmonia, por exemplo, serão acesas três fogueiras, uma para cada santo. Não vai faltar também o pau-de-sebo, um tronco de árvore com quatro metros de altura untado com sebo animal. O desafio é atingir o topo e conquistar as prendas lá depositadas. A dança da batata é outra brincadeira. Nesta, os casais dançam com uma batata entre suas testas e ganha quem tiver mais destreza em não derrubá-la. Há ainda a corrida do saco e a do ovo na colher, além da dança do bastão. Tudo, é claro, regado a um bom quentão para espantar o frio.

Cada Santo tem a sua história

São João Batista

São João Batista nasceu em 24 de junho. Diz a história bíblica que, na antiga Judéia, as primas Isabel e Maria, mãe de Jesus, estavam grávidas. Como moravam distantes, elas combinaram que a primeira a ganhar o bebê anunciaria a novidade acendendo uma fogueira em frente à própria casa. Santa Isabel cumpriu a promessa quando do nascimento de seu filho, João Batista. Até hoje as fogueiras são acesas na tarde do dia 24 de junho, acompanhadas de foguetórios, jogos, prendas e bailes. É a fogueira mais tradicional. Tem a base redonda como se fosse uma pirâmide.

São Pedro

Foi o primeiro papa da igreja católica, também conhecido como o guardião das chaves do céu e o responsável pela chuva. Segundo a tradição, São Pedro era um homem simples, de boa fé e impulsivo. É protetor dos pescadores e das viúvas. Foi o primeiro dos Apóstolos, sendo crucificado sete anos depois de Cristo, em 29 de junho (data em que se acende a sua fogueira). Acredita-se que seu corpo está enterrado onde foi edificada a basílica do Vaticano, em Roma. A fogueira tem um formato triangular

Santo Antônio

É o santo casamenteiro por excelência. Nasceu em Lisboa, em 1195, e morreu aos 36 anos, no dia 13 de junho, em Pádua, Itália. Considerado o santo de maior apelo popular, pois é invocado durante todo o ano, auxilia também para achar objetos perdidos. Ansiosas por um casamento, algumas moças solteiras viram a imagem de Santo Antônio contra a parede, o afogam em poços ou o enforcam até que surja um candidato. Sua fogueira tem formato quadrado.

 

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