OPINIÃO

Campanhas

Luis Fernando Verissimo / Publicado em 31 de julho de 2001

O racionamento de energia trará um grande desafio para o pessoal de marquetchim do governo, mas não será nada que eles não possam enfrentar. Como se recorda, a última realização do departamento de RP do Planalto foi a criação de uma secretaria para combater a corrupção, de grande atuação na investigação de todos os escândalos recentes – sob a liderança da inesquecível, inesquecível… Enfim, da inesquecível. O fato de não se ouvir mais falar no nome dela (era Djalmira?) é uma prova do sucesso da iniciativa, pois não há mais escândalos para investigar.

Dizem que já existe uma campanha publicitária pronta para ser lançada em substituição ao “Avança, Brasil”. Se chamará “Espera um pouco, Brasil”. Ou, para dar um tom mais coloquial, “Peraí, gente”. Como um exemplo do que a população não deve fazer, para conservar energia, a campanha começará com uma retrospectiva de tudo que o governo não fez no setor, nestes anos todos. A inércia govenamental deverá inspirar o público a também adiar o que tem que fazer para mais tarde, se chover. Cenas de máquinas paradas em todo o território nacional terão um acompanhamento musical não de um samba, mas de uma marcha lenta tocada em serrote. O fato de o presidente da República ter sido surpreendido pela crise energética será usado de maneira positiva. Parece que ele concordou em participar de cenas em que aparecerá distraído, não ouvindo o que lhe dizem e não lendo relatórios que lhe trazem, e que terminarão com a frase: “Faça como ele: desligue-se!”

O objetivo da campanha é desanimar as pessoas, sem que isto, no entanto, as desiluda por completo. É importante manter vivo o orgulho de ser brasileiro, mesmo parados. Por isso também está nos planos de RP enaltecer o que fazemos, hoje, melhor do que qualquer um. É a única área em que nos destacamos internacionalmente, ainda mais agora que nosso futebol está até ameaçado de não ir à Copa. Somos os melhores devedores da Terra. Pagamos nossas dívidas como ninguém, somos admirados por credores e banqueiros do mundo todo. E mantemos nosso prestígio mesmo que não sobre dinheiro para mais nada – uma clara evidência de que ser bom devedor é uma vocação nacional, está no sangue do brasileiro, não pode ser explicado racionalmente. E, é claro, ninguém consegue imitar os nossos juros, que também assombram o mundo. Grandes devedores. Quem pode pedir um epitáfio melhor?

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