EDUCAÇÃO

Saudades do futuro

Jimi Joe / Publicado em 26 de setembro de 2001

Parece coisa de ficção científica, mas é só a realidade. O processo de criação de máquinas inteligentes é cada vez mais apurado. Daqui a pouco teremos eletrodomésticos capazes de identificar o estado de ânimo de seus proprietários pelo tom da voz, casas dotadas de aparelhos com os quais os usuários poderão interagir plenamente. Mas se alguém aí está pensando em coisa tipo Blade Runner, replicantes e andróides, pode esquecer. As novas máquinas, por mais “humanizadas” que se tornem, dificilmente chegarão a tal ponto. Um dos pesquisadores que diz isso é o gaúcho Eduardo Reck Miranda, 39 anos, há 10 vivendo fora do Brasil, e atualmente trabalhando no laboratório de ciência da computação da Sony, em Paris.

“O computador do futuro não vai ser essa caixa que nós conhecemos. Vai haver uma evolução para a interação total. Não será mais uma relação como agora com o computador, mas sim uma identificação através do gesto, da voz,” diz Miranda. Segundo ele, a tendência é a uma interação geral, com tudo ligado em rede. Os utilitários domésticos nas casas estarão ligados a centrais capazes de identificar necessidades dos consumidores. Sobre a possibilidades de uma automação excessiva, Miranda reconhece que devem existir limites tecnológicos mas alerta que o futuro é uma incógnita em vários aspectos.

Miranda acredita que as inovações tecnológicas devem se popularizar com o tempo

Somente na Sony, onde ele desenvolve seu trabalho de pesquisa centrado no campo da síntese de sons, no qual é especialista, ele diz que há vários grupos estudando e pesquisando as mais diversas possibilidades na área da inteligência artificial. “São vários laboratórios que vão além da pesquisa básica. Na verdade, é um caldeirão de idéias de onde podem surgir novidades importantes nos próximos cinco ou seis anos. Já há coisas surgindo agora.” Uma dessas novidades deve ser o super CD. “Esse novo formato vai abrir novas possibilidades. Uma delas, por exemplo, é a do consumidor poder fazer a sua própria mixagem do disco, pois os canais de gravação, como foram gravados no estúdio pelos músicos, viriam em aberto.” Além da capacidade lúdica, o super CD insere-se num mercado específico formado por milhares de músicos e estudantes de música em todo o mundo. “Esse tipo de mídia pode ser usado para estudo. Um pianista ou um violinista, por exemplo, poderão ensaiar concertos sem a necessidade de arregimentar toda uma orquestra.”

Miranda também está envolvido na pesquisa de novos mecanismos de busca de músicas na rede. “A idéia é criar uma espécie de cadastro. Quando a pessoa acessa o site, deixa registradas suas preferências. Com isso, a empresa pode oferecer produtos semelhantes que muitas vezes o consumidor nem sabe que existem.” Mas o que parece entusiasmar mais a Miranda é a possibilidade da criação de máquinas inteligentes. “Meu trabalho com a síntese de som deve ser aplicado a máquinas que poderão dialogar com as pessoas, fugindo ao uso habitual do computador. A idéia é permitir o uso da audição, da fala, a identificação da emoção.”

Ciente de que trabalha no desenvolvimento de idéias que devem gerar produtos a princípio acessíveis a uma parcela privilegiada da população, Eduardo Reck Miranda acredita que todas as inovações tecnológicas que estão sendo engendradas nos laboratórios tendem a se popularizarem com o tempo. Ainda que levem alguns anos. “Foi assim com a televisão,” lembra. Atualmente, ele acredita que esse período para que uma inovação tecnológica atinja as camadas da população menos favorecidas economicamente tende a ser menor, como aconteceu com a telefonia celular.
Quem é Eduardo Reck Miranda

Eduardo Reck Miranda nasceu em Porto Alegre em 1963. Graduado em Processamento de Dados pela Unisinos em 1985, aos 22 anos, passou pelo Instituto de Artes da UFRGS antes de ir para a Europa. Em 1991 defendeu tese de Mestrado na Universidade de York, na Inglaterra, e em 1995 concluiu e defendeu sua tese de doutorado na área de Inteligência Artificial na Universidade de Edimburgo, na Escócia. Um dos fundadores do Núcleo de Computação em Música, Miranda tem participado e dirigido festivais e simpósios de música eletroacústica. Com dois livros editados (Computer Sound Synthesis for the Electronic Musician e Composing Music with Computers) e composições premiadas em concursos na França e Itália, ele prepara um primeiro CD solo com suas composições que são freqüentemente executadas em festivais de música contemporânea em diversos países.

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