“É o verdureiro!.” Aqui tem ele vendendo almeirão, coentro, cebolinha, taiobas, couvezinha fresca, alface com gosto de horta e outras verduras na porta da gente. Pregão delicioso das manhãs. Eu atravesso o lago dourado que aparece no meio da travessia, quente como oásis, um mimo das dunas, uma delicadeza delas com os nossos pés tolerantes, amorosos ao seu calor. É um lava pés na cerimonia do deserto. Aqui passarinho me acorda e me nina. Sem contar que tenho mais convívio com insetos o que abranda minha frescura de cidade. Reencontro formigas cabeçudas, embora ainda não tenha revisto as tenebrosas tanajuras que sucedem as chuvas. Todo dia faço tudo de bicicleta. Bicicleta, aqui entendida como transporte e passeio. No caminho para o riacho doce passamos por uma casa-teia de aranha que mais parecia uma mansão, tamanho era o seu tamanho e rebuscado de um sofisticado tear. Os olhos divertidos do meu amor batizaram-na- imediatamente “clã dos Mascaranhas”. Eu ri. Aqui o areado das panelas espelho meu, me comove. No ultimo dia do ano se pode ganhar um jardim de presente aqui. Um jardim reluzente de amarelas Alamandras, e Marias Sem Vergonha da cor lilás. Lilás a Maria e não a vergonha. Fôra isso o que se dera comigo ganhei um jardim de presente. Aqui reencontro pitadas de minha infância, Pinceladas finais, restaurações, vizinhanças onde todos tem quintal e há sempre uma dona Guiomar, dona dos ovos que saem de suas galinhas para vende-los a nós. Aqui levo acabamentos no meu barro primeiro. Recebo retoques necessaríssimos nas camadas que se esfolam na urbanidade. Não trago pra cá a cidade, nem é com ela que venho pra roça. Mas, atualizada de roça e remoçada, levo comigo pra cidade no meio do peito, um novo jeito. Essa roça.
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Nº 073 | Ano 8 | Jul 2003
Nº 073 | Ano 8 | Jul 2003
ELISA LUCINDA
Acabamentos e restaurações no barro da gente
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