HUMOR

Rango: o anti-herói brasileiro está de volta

Depois de mais de uma década longe da imprensa escrita, Edgar Vasques retoma a produção de tiras inéditas de Rango, que surgiu em 1970
César Fraga / Publicado em 21 de março de 2007

Rango surgiu a partir das vivências de Edgar Vasques

Foto: René Cabrales

Foto: René Cabrales

Parem as máquinas. Rango está de volta.

Depois de mais de uma década longe da imprensa escrita, Edgar Vasques retoma a produção de tiras inéditas desse personagem que surgiu em 1970, fazendo observações ácidas da vida social e política do Brasil, e que, apesar dos seus 37 anos, continua mais do que atual, necessário.

A partir desta edição, além de ilustrar a coluna do Fraga (que não tem qualquer parentesco com o autor deste texto), Vasques passa a ocupar lugar de destaque no Extra Classe, retornando a um lugar de onde nunca deveria ter saído, da imprensa, onde se destacou pela sua visão crítica e humorada da política nacional.

Diferentemente de outros personagens que povoam as páginas de quadrinhos dos jornais diários, Rango, com o perdão do trocadilho, sempre foi indigesto para veículos comprometidos com um projeto político mais conservador para o país.

“Sou um exilado da imprensa, justamente por dizer em minhas tiras o que os donos dos jornais não gostariam de ver publicado em lugar nobre. Hoje, os cartunistas e chargistas não podem ser contraponto do que pensam os empresários de comunicação e, salvo raras exceções, expressam o que é permitido pelo dono”, observa Edgar.

O personagem surgiu em uma revista do Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura da UFRGS nos idos de 1970, quando Vasques já atuava há pelo menos dois anos no jornalismo, na Companhia Jornalística Caldas Júnior, nas edições de sábado do Correio do Povo.

“Na época, a faculdade de Arquitetura era um centro de efervescência e inquietação cultural, no auge da ditadura militar. Era a época dos slogans ‘corrente pra frente’, ‘noventa milhões em ação’ e do ‘Brasil grande’.

A censura era muito forte nos meios de comunicação”, descreve o humorista. Apesar da revista chamada Grilus ter durado apenas uma edição, logo de cara, o personagem ganhou admiradores e fãs, que passaram a reproduzi-lo em camisetas e a cobrar novas tiras.

“Percebi naquele momento que havia tocado em algum ponto que provocava as pessoas, que havia eco naquele tipo de humor”, explica Vasques.

“Então, o Rango nasceu da minha vivência e desse clima político de censura e necessidade de contestação. E quem é o Rango? É justamente uma pessoa que, de tão miserável, não produz e também não consome, vive à margem da economia; porém, com uma visão particular da sua realidade e do mundo que o cerca. O resultado dessa equação é o meu estilo de humor”, contextualiza.

A origem

Criado na Rua da Praia (Rua dos Andradas), nas proximidades do Hotel Majestic, hoje Casa de Cultura Mario Quintana, Edgar Vasques, desde cedo, conviveu com as figuras humanas que inspiram seu personagem e que integravam – e ainda integram – o Centro da cidade de Porto Alegre, infelizmente.

“O trajeto que eu fazia para a faculdade, de casa até chegar à Avenida João Pessoa e depois descer para a Ufrgs, era um painel de miséria: bêbados, menores abandonados, mendigos, loucos, ladrões, lumpens, em contraste com o milagre econômico anunciado pelo regime. Ninguém falava, porque havia censura, e o Rango surgiu daí”.

Em certa ocasião, em setembro de 1977, o Pasquim chegou a ser recolhido das bancas devido à publicação de quatro tiras de Rango, porque, em uma delas, o personagem aparecia fazendo um churrasco com três pombinhas.

O detalhe é que os bichinhos eram símbolo da Semana da Pátria daquele ano, e os militares se ofenderam. Jaguar, do Pasquim, e Vasques foram processados, mas o inquérito acabou sendo arquivado.

Livro

Rango completa 35 anos

Arte: Edgar Vasques

Arte: Edgar Vasques

Em livro, a estreia de Rango foi também a primeira vez da então jovem editora L&PM, em agosto de 1974, com prefácio de Erico Veríssimo, que escreveu: “Cada uma de suas pequenas estórias em quadrinhos vale por um editorial de jornal”.

De lá para cá, foram 17 volumes, e o personagem tornou-se um clássico dos quadrinhos, publicado em centenas de veículos mundo afora.

Em 2005, por comemoração dos 35 anos do personagem, a editora lançou uma antologia organizada pelo autor, que intregra a coleção L&PM Pocket.

Quem tiver interesse em adquirir exemplares autografados pelo autor deste e de volumes anteriores, alguns fora de catálogos e até raros, podem fazê-lo pelo e-mail hqrango@gmail.com.

 

 

Rango tirinha linha da pobreza

Arte: Edgar Vasques

Arte: Edgar Vasques

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