OPINIÃO

O avanço dos desertos verdes no Rio Grande do Sul

A inauguração da pedra fundamental da nova fábrica da Aracruz em Guaíba, dia 27 de agosto, aprofunda o processo de transformação do Rio Grande do Sul em um grande produtor de eucalipto e celulose. Os prote
Marco Aurélio Weissheimer / Publicado em 23 de setembro de 2008

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Jornalista relata o preço da devastação

Mas há uma exceção midiática nesta louvação à celulose. No final de agosto, o jornalista Lúcio Vaz, do jornal Correio Braziliense, publicou a terceira reportagem da série O preço da devastação, que apresenta os impactos econômicos, sociais e ambientais da produção de celulose no país. Nesta nova matéria, ele mostra como, com o apoio do governo da Bahia e de prefeitos do sul do estado, as papeleiras Veracel, Suzano e Aracruz ocuparam cerca de 300 mil hectares com plantações de eucaliptos nas últimas duas décadas, gerando impactos ambientais negativos. A Veracel, por exemplo, informa a reportagem, sofre ações por irregularidades na á rea ambiental e por supostas práticas de corrupção. Em julho deste ano, a Justiça Federal anulou as licenças concedidas à empresa na implantação de sua base florestal. Além disso, determinou a retirada de 47 mil hectares de eucaliptos, com a recomposição da Mata Atlântica, e multou a empresa em R$ 20 milhões.

A condenação da Veracel foi resultado de uma denúncia feita em 1992 por entidades como o Greenpeace e o SOS Mata Atlântica que registraram a derrubada de 64 hectares de vegetação nativa com o uso de correntes amarradas a tratores. A matéria do Correio Braziliense relata: “O juiz federal Márcio Mafra Leal, de Eunápolis, município onde está instalada a fábrica da Veracel, entendeu que as plantações de eucaliptos deveriam ter sido precedidas de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA), com o respectivo Relatório de Impacto Ambiental (Rima). O plantio em quantidades espetaculares de eucaliptos não só elimina a Mata Atlântica, mas também altera o quadro paisagístico da região”.

O juiz denunciou que não houve avaliação de impacto ambiental na região e que toda a abordagem foi feita sob o ângulo da empresa e de suas estratégias. Ele qualificou o parecer do Centro de Estudos Ambientais (CRA), que embasou as licenças, como uma cópia do estudo feito pela própria Veracel.

As reportagens publicadas no Correio Braziliense também mostram como as empresas de celulose distribuíram R$ 8,6 milhões em doações eleitorais a políticos nas últimas três eleições. Lúcio Vaz percorreu cerca de 7,5 mil quilômetros, registrando as conseqüências da implantação de quase 1 milhão de hectares de eucaliptos no Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Bahia, além dos plantios no Uruguai.

Consenso midiático

Não se vê nada parecido com essas matérias na imprensa gaúcha. Por aqui, o que aparece é um grande consenso midiático em defesa das empresas. O que aparece também é um grande volume de anúncios publicitários destas empresas nos meios de comunicação mais variados. Resta saber se essa relação simbiótica entre empresas de celulose e imprensa não se transformará em uma relação parasitária para o futuro do meio ambiente gaúcho.

 

Agronegócio quer flexibilizar leis ambientais

Nos dias que correm todos são a favor do meio ambiente e repetem discursos peremptórios sobre a importância do desenvolvimento sustentável. O que se vê na prática, porém, é uma crescente flexibilização da legislação ambiental em nome do lucro e da promessa de prosperidade. Além do caso da celulose, o agronegócio como um todo mobiliza-se para combater o que chama de “rigidez” das leis ambientais.

No dia 26 de agosto, parlamentares e entidades ligadas ao agronegócio solicitaram ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, uma completa revisão do Decreto 6.514, de 22 de julho de 2008, que torna a Lei de Crimes Ambientais mais rígida. Em audiência com o ministro, representantes do agronegócio entregaram uma carta expondo o que chamaram de “reflexos negativos da norma para a atividade econômica nacional, como a redução de área produtiva e da produção de alimentos, da renda do produtor e da geração de empregos”. E propuseram a criação de um Grupo de Trabalho para a “revisão” do decreto e da legislação ambiental brasileira. A idéia é flexibilizar a legislação, considerada demasiadamente restritiva pelo agronegócio.

Um dos líderes deste grupo, o deputado federal gaúcho Luis Carlos Heinze (PP), defendeu o “aprofundamento” das discussões sobre as leis ambientais vigentes no Brasil, com o objetivo de apresentar, em 120 dias, “propostas equilibradas entre a preservação ambiental e a produção agropecuária”.

Tudo isso vem acontecendo num ambiente de absoluta normalidade. O discurso em defesa do meio ambiente cada vez mais é apenas… um discurso.

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