SAÚDE

DIETA SIM, mas sem perder o humor e o prazer à mesa

Publicado em 5 de outubro de 2008

“Se não der para se segurar com a comida… te atira”. Quem faz dieta dificilmente vai ouvir um conselho assim, e justo da nutricionista! Mas a nutricionista clínica Ana Beatriz Cauduro Harb, professora do Curso de Dietoterapia da Unisinos, aprendeu com a prática que, em vez de adaptar o paciente à dieta, dá mais resultado adaptar a dieta ao paciente. “A gente acaba sendo uma grande negociadora, porque nem quando a pessoa está muito doente aceita proibições de comida – é preciso negociar conforme os hábitos de cada um”, explica. Por isso, quando não der mesmo para se controlar e obedecer à dieta, paciência, que seja aberto um precedente. “As escapadas são inerentes ao processo, o que não dá é para deixar de voltar ao condicionamento só porque abusou num dia e querer compensar comendo bem menos no outro”, ensina. Neste caso, o ideal é voltar para a dieta mesmo. A maleabilidade de Ana justifica por que suas pacientes viraram suas fãs: mais do que perda de quilos, a nutricionista aposta no bem-estar geral do indivíduo.

Ana lembra que, em nome da falta de tempo, as pessoas abrem mão de ligar para os amigos e até do lazer. Às vezes, deixam de almoçar porque estão com muita pressa. Fazem apenas lanches no intervalo do trabalho e acabam aumentando de peso. “Esse tempo do almoço é uma das poucas coisas que se poderia dominar, porque de resto se vive à mercê dos compromissos que te marcam”, diz. Então, o primeiro passo é organizar o tempo. Teoricamente, todo mundo pode comer de tudo, mesmo os mais gordinhos – só não podem comer muito. O problema é quem tem uma relação problemática com chocolate, ou com álcool, por exemplo, e isso leva a doenças – aí precisa de ajuda para impor limites, para se reeducar com a alimentação. A opção é sempre do paciente: pela doença ou pela qualidade de vida que quer recuperar.

Obesidade é considerada hoje uma pandemia, e até as crianças estão ficando doentes. A má alimentação é apenas um dos fatores. Em outros tempos, as mães ficavam mais em casa e cuidavam do que os filhos comiam. Hoje, as babás acham mais fácil dar uma bolacha para os pimpolhos ficarem sentados comendo na frente da televisão, porque fiar na rua é perigoso. Tempos modernos, dúvidas maiores. Os pais têm que dar o exemplo, lembra a nutricionista: “Um pai que toma Coca-Cola com pastel frito no café da manhã não tem como exigir que o filho se contente com um copo de leite e uma fatia de mamão”.

A modernidade trouxe também os agrotóxicos para a mesa competindo com os produtos orgânicos – mais saudáveis, mas mais caros. Neste ponto, Ana não é radical. “Se eu comprar um galinha caipira no campo sem inspeção pode ter também alguma doença, ou pode ter inspeção e conter hormônio”, pensa. “A gente fica entre a cruz e a espada, porque nem sempre pagar mais caro pelo orgânico é garantia de qualidade”.

A nutricionista desfaz alguns mitos e reforça: frutas são ó timas em qualquer horário, ao contrário do que anda dizendo um e-mail espalhado pela Internet. Tomar muita água pode ser um remédio para a constipação, essa doença do século 20. Carnes e os produtos derivados do leite contêm um tipo de proteína de alto valor biológico e com 70% de absorção que nenhum outro alimento proporciona – quem abolir do cardápio vai ter de repor de alguma forma. Tensão Pré-Menstrual (TPM) é fato: a mulher tem um aumento de progesterona neste período e uma redução da serotonina, que provoca a sensação de bem-estar. Para combater o mau humor, há uma vontade maior de comer carboidratos: pão, massa, arroz, mas especialmente chocolate. Se é para conter a fúria, diz Ana, não vale a pena ficar se enganando com iogurtes e produtos dietéticos, porque o final vai ser sempre o chocolate. Neste caso, ela sugere escolher logo o mais doce para saciar de vez a vontade. (CLARINHA GLOCK)
O que é ter qualidade de vida para você?
“O conceito de qualidade de vida é um todo: bem-estar físico, mental,
social. É trabalhar bem, seja no que for, com realização – não se trata de uma questão de dinheiro, mas de gostar do que se faz e organizar os tempos. Tem coisa de que não se pode abrir mão, porque não tem como recuperar depois. Às vezes, tem a ver com maturidade”.

ANA HARB, nutricionista clínica

Menos quilos e mais sorrisos
Creusa Maria Paula Gelatti, 58 anos, faz questão de tirar o casacão escuro para a foto. Quer mostrar como seu manequim passou do número 50 para 44 em um ano e meio. Os 13 quilos foram embora com a ajuda de nutricionista, terapia, malhação, mas, sobretudo, vontade de que desta vez a dieta desse certo.

Magra desde criança, Creusa não havia ainda experimentado a sensação de ter de controlar a comida, até que se viu em plena menopausa e começou a fazer reposição hormonal. A mudança trouxe junto uma fome incontrolável de doces: bombons, quindim, bem-casado. Engolia uma barra de chocolate inteira de tarde e de noite. Coincidiu que parou de fazer os exercícios físicos que mantinha desde os 23 anos. E o que é pior: não se via gorda…nem os avisos das filhas dizendo que estava exagerando a intimidavam. A cada quilo, sem perceber, foi colocando a auto-estima de lado. Deixou de botar um brinco bonito, parou de arrumar o cabelo. As roupas não serviam mais, nem a loja onde comprava normalmente tinha agora seu tamanho.

“A depressão aparece com a falta de vaidade, a gente pára de se arrumar”, conta. Viúva desde os 35 anos de idade, e bancária aposentada desde os 46 anos, com três filhos adultos e criados, decidiu que era hora de dar um basta no exagero com a comida quando foi ao médico e descobriu que tinha uma gordura abdominal que começava a prejudicar muito sua saúde. Ele recomendou que buscasse uma nutricionista. Foi então que pela primeira vez ela realmente enxergou no espelho a Creusa de 82 quilos – 22 acima do seu normal.

Foi difícil negar o prazer que lhe dava comer, reconhece, mas no seu caso não deu para balancear, foi preciso fazer escolhas. Substituiu o chocolate por uma laranja “bonita, gostosa e atraente”. Mamão e morango assumiram formas deliciosas que antes ela não via. O Pilates e a musculação ajudaram. Mas, de verdade, ela sabe que foi dentro da cabeça que a transformação foi mais forte. O resultado foi tão bom, que não sente saudades de doces, ainda que coma um ou outro. Voltou a estudar, quer viajar, e não nega que começa a pensar de novo em namoro. Qualidade de vida para ela é ter saúde e lazer. Essa é sua quarta dieta. “Não posso pecar de novo, agora é para sempre”, avisa. (CG)

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