OPINIÃO

O custo do “déficit zero” para a população

Marco Aurélio Weissheimer / Publicado em 19 de dezembro de 2008

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Arte: Claudete Sieber/D3 Comunicação

Arte: Claudete Sieber/D3 Comunicação

Após um ano marcado por sucessivas crises e denúncias de corrupção, o governo Yeda Crusius (PSDB) chega ao final de 2008 tentando imprimir uma “agenda positiva”. A governadora e seus aliados apresentam o “déficit zero” como o carro-chefe dessa agenda que estaria saneando as finanças do Estado. Mas o que é, afinal de contas, o “déficit zero” e qual o custo dessa política para a população que precisa dos serviços públicos do Estado?

É sintomático que, no mesmo momento em que tal política é comemorada pelo governo, categorias importantes do serviço público, como professores e policiais, intensifiquem sua mobilização com greve, paralisações, marchas e protestos denunciando o sucateamento do Estado. A pauta dominante nos meios de comunicação do RS é marcada por um ruidoso silêncio sobre as condições de trabalho dessas categorias e sobre a qualidade dos serviços públicos que vêm sendo prestados à população. E não é a falta de dados e testemunhos que alimentam esse silêncio.

O Ministério Público de Contas, que emitiu parecer prévio desfavorável à aprovação das contas do governo Yeda no exercício de 2007, identificou uma série de problemas gerados pela política do “déficit zero”. Vejamos alguns deles:

– Descumprimento dos limites constitucionais mínimos de gastos com saúde, educação e pesquisa científica e tecnológica.

– Pendência de repasses aos municípios, referentes às quotas de salário-educação, multas de trânsito, ICMS, IPVA, entre outros itens, totalizando R$ 90,090 milhões.

– Sucessivas prorrogações de contratos emergenciais, burlando a exigência de realização de concursos públicos.

– Não-repasse integral ao Ipergs do produto das contribuições previdenciárias retidas junto à folha de pagamento dos servidores.

– Suplementação das despesas com publicidade em 55,01%.

Desmonte das políticas sociais

Outro exemplo do impacto dessa política aparece na área de políticas sociais sob responsabilidade do governo estadual.

Líderes do governo Yeda na Comissão de Finanças da Assembléia Legislativa, Nelson Marchezan Jr. (PSDB) e Adilson Troca (PSDB), rejeitaram, dia 13 de novembro, a emenda que propunha uma reserva mínima para o atendimento de 300 famílias de desempregados em 2009. Com a decisão, o projeto de Orçamento do Executivo para 2009, em tramitação na Assembléia, destinará zero de recursos para financiar as Frentes Emergenciais de Trabalho (FETs). Com isso, pelo terceiro ano consecutivo, a governadora descumprirá a legislação, aprovada em 2001, que garante as frentes para desempregados organizados.

Déficit Zero na Segurança

O Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia do RS (Ugeirm) divulgou alguns dados relativos à situação dos servidores da área da Segurança Pública, que refletem o impacto da política do déficit zero para o setor:

A Polícia Civil trabalha muito além da sua carga horária legal e opera, hoje, com menos da metade do número de policiais necessários. São cerca de 5 mil ativos, quando seriam necessários cerca de 15 mil. A Brigada Militar vive situação semelhante.

O governo do Estado não paga horas-extras aos policiais há mais de cinco meses. Antes disso, pagava, em média, 5 horasextras por mês. Os policiais civis fazem mais de 40 horas por mês em várias oportunidades (o excesso de jornada extraordinária é vedado pela Lei 10.098/94).

Cerca de 200 cidades do estado não têm plantão de prontoatendimento. Nesses municípios, os policiais ficam de sobreaviso – prática que não tem qualquer previsão legal para a Polícia Civil. O Estado não paga nada pelo sobreaviso, que o policial é obrigado a cumprir, sob pena de ser punido. Segundo o Ugeirm, o Estado é conivente com uma situação análoga a de escravos no tratamento que dispensa aos policiais.

Esse debate está ligado à definição do papel que o Estado deve desempenhar na sociedade. Uma das questões centrais que marca esse debate é: ao se reduzir as funções e serviços do Estado a uma condição de precariedade, como a descrita acima, não se está inviabilizando a própria função do Estado como promotor do bem comum?

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