AMBIENTE

Carvão mineral: herói ou vilão?

Quem explora o carvão mineral como fonte energética diz que o governo não pode abrir mão dessa riqueza, encontrada em abundância no Sul do país, mas ambientalistas condenam seu uso devido aos danos ambient
Por Cleber Dioni Tentardini / Publicado em 16 de julho de 2009

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Foto: René Cabrales

Foto: René Cabrales

Em tempos de escassez de chuva na região Sul, e maior demanda por energia com a recuperação gradual da economia, cresce a pressão dos setores empresariais pela inclusão de outras fontes na matriz energética brasileira. Ficar na dependência das hidrelétricas, dizem, é correr riscos desnecessários de um novo apagão energético, como em 2002.

A indústria carbonífera tomou a frente das discussões e já vê resultados positivos. Quem explora ou simplesmente defende o carvão como fonte energética diz que o governo não pode abrir mão dessa riqueza, encontrada em abundância no Sul do país. As reservas nacionais são quatro vezes maiores que as de petróleo. Quase todo o mineral está no Sul, onde estão concentradas as termelétricas, o que reduziria os custos. Outro ponto a favor seriam as novas tecnologias que tornam o produto menos poluente. Porém, os ambientalistas condenam seu uso pelos danos ambientais que provoca. Apontam prejuízos ao solo, água, ar e à saúde das pessoas. Classificam o carvão como um vilão do efeito estufa e não como uma solução energética.

O debate promete esquentar com o início das operações no próximo ano de mais uma usina a carvão em Candiota. A chamada Fase C da Termelétrica Presidente Médici, ou Candiota 3, vai gerar 350MW e impulsionar a produção gaúcha do combustível.

 

 

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Foto: René Cabrales

Foto: René Cabrales

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Foto: Tadeu Santos/Divulgação

Foto: Tadeu Santos/Divulgação

 

O consumo de carvão está em expansão. De acordo com o Balanço Energético Nacional/2008, o consumo do mineral foi o segundo que mais cresceu, 9,5% em relação a 2007. O petróleo e derivados avançou 3,7%, e o gás natural – o menos poluente – expandiu mais, 16,9% no período.

O avanço dos fósseis foi movido principalmente pela geração de energia por meio de termelétricas, cuja atividade cresceu 37,9%. Entre as fontes de energia renováveis, o destaque foi para o aumento do consumo de etanol, que cresceu 17,7%. A participação da energia hidrelétrica diminuiu 1,7% em comparação com 2007.

CRM vai dobrar produção

A Companhia Riograndense de Mineração (CRM) será fornecedora exclusiva de carvão para a UT Presidente Médici (Fase C), da CGTEE, com um contrato de 3,3 milhões de toneladas/ano podendo chegar a 5 milhões t/ano. Vai dobrar a sua produção, que hoje gira em torno de 1,8 a 2 milhões ton/ano.

O presidente da Companhia, Telmo Kirst, garante que vem investindo entre R$ 500 mil a R$ 1 milhão de reais, anualmente, na recuperação de áreas degradadas. “Cada hectare minerado deve corresponder a um hectare recuperado. Isso já está incorporado às operações e, consequentemente, ao custo de produção do carvão”, afirma o executivo.

Sobre os passivos ambientais de décadas passadas, Kirst ressalta que as áreas vêm sendo recuperadas de forma gradativa porque exigem recursos maiores. “Será necessária a aplicação de parte dos lucros extras da Companhia para alcançarmos a meta de zerar estes passivos nos próximos anos”, explica.

Empresa de economia mista criada pelo governo gaúcho em 1969, a CRM tem a concessão de exploração de três jazidas que somam cerca de 3 bilhões de toneladas.

Matriz elétrica brasileira
 Produção hidrelétrica – 84%
 Biomassa – 4%
 Gás natural – 4%
 Diesel e óleo combustível – 4%
 Nuclear – 3%
 Carvão – 1,4%

* Fonte: Balanço Energético Brasileiro, 2007

Geração de energia elétrica no RS (MW/média) %
 Hidrelétrica – 1.635 / 74,9
 Carvão mineral – 230 / 10,5
 Gás natural – 285 / 13,0
 Óleo – 0 / 0,0
 Fontes Alternativas – 34 / 1,6
 Total – 2.184 / 100

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Inventário de emissões de
gases-estufa sai no final de julho

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, informou que o novo Inventário Brasileiro de Emissões de Gases de Efeito Estufa vai ser lançado dentro do mês de julho. O último foi feito em 1994. Com o levantamento, governo e empresários podem adotar políticas a fim de reduzir as emissões de gases que causam as mudanças climáticas, pelas diferentes fontes de emissão – veículos, usinas térmicas, indústrias, queimadas, gado e outros usos da terra.

O governo vai utilizar as informações na elaboração da proposta que levará à 15ª Conferência das Partes, em Copenhague, Dinamarca, programada para dezembro. A COP é o braço executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQMC). Esta edição da conferência está sendo considerada a mais importante, porque pretende estabelecer o tratado que vai substituir o Protocolo de Kyoto, vigente de 2008 a 2012.

Minc informou que os Ministérios do Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia instalarão, neste mês ainda, o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, que o ministro definiu como um IPCC-Brasil. Ele vai reunir mais de uma centena de cientistas para produzir, até 2012, um relatório para orientar políticas públicas.

Para ambientalistas, combustível do passado

“É à energia fóssil que a economia mundial deve sua prosperidade, mas é esta mesma base energética que agora a arrasta à perdição”. A afirmação do sociólogo e economista Hermann Scheer, presidente da Associação Eurosolar, traduz os motivos da rejeição dos ambientalistas por esse tipo de energia.

A preocupação é que um dos maiores vilões do efeito estufa é considerado a solução mais barata para atender ao aumento da demanda energética. A geóloga Lúcia Ortiz, coordenadora do Núcleo Amigos da Terra (NAT/Brasil), refuta o argumento: “Acontece que os empresários e os parlamentares que defendem esse combustível não contabilizam esses passivos, porque não empenham os recursos suficientes para recuperar as áreas degradadas ou nem se consideram responsáveis pela poluição”, acusa.

Com base em dados de 2004, do Ministério de Minas e Energia, cada megawatt/hora de energia nova gerada a partir das hidrelétricas custava R$ 90,00; das pequenas centrais hidrelétricas – PCHs saía R$ 117,02, da eólica, entre R$ 180,18 e R$ 204,35, e das térmicas a carvão, R$ 138,00.

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Foto: René Cabrales

Foto: René Cabrales

Lúcia afirma ainda que as reservas brasileiras de carvão são pouco expressivas – segundo o Instituto Mundial do Carvão, o Brasil participa com apenas 0,2% na produção mundial desse combustível fóssil. São de baixa qualidade, com alto teor de cinzas (em torno de 40 e 55%) e enxofre (entre 1 e 2,5%, chegando a 5,5%), e baixo poder calorífico (entre 3.000 e 4.500 cal/g). As impurezas dificultam tanto o seu aproveitamento como fonte de energia, como para fins siderúrgicos.

A queima de carvão e petróleo é responsável por 85% do enxofre lançado na atmosfera e por 75% das emissões do gás carbônico causadoras do efeito estufa. Os combustíveis fósseis para geração de energia são os grandes responsáveis pelo aquecimento global, segundo relatório do IPCC.

Uma tabela periódica inteira de riscos à saúde

Os carvões contêm altos teores de Sílica, Ferro, Enxofre, Alumínio e, em baixas concentrações, praticamente todos os elementos da tabela periódica. Sua mineração, beneficiamento e combustão produzem resíduos e compostos orgânicos tóxicos. A queima do carvão provoca a chuva ácida, nociva para o sistema respiratório e o meio ambiente. A Pneumoconiose dos Trabalhadores de Carvão (PTC) é uma doença causada pela aspiração do pó de sílica e carvão que causa alta frequência de tosse prolongada e crônica, doenças de pele, lacrimejamento, prurido nasal e ocular.

“As atuais tecnologias das usinas são chamadas de queima limpa, mas são tecnologias que emitem menos poluentes, o que é totalmente diferente de uma tecnologia de emissão zero”, diz Lúcia.
Produção de energia pode
chegar a 10% do total no país

O carvão mineral é a maior reserva de combustível fóssil que o Brasil tem. São 32 bilhões de toneladas, quatro vezes maior que as reservas de petróleo.

As minas em operação extraem 10 milhões de toneladas de carvão por ano. Seis usinas operam no país e produzem 1.414 megawatts/ano, que corresponde a pouco mais de 1% do que é gerado em solo nacional. Estima-se que o carvão pode produzir 10% da energia no Brasil.

Há seis projetos de usinas a carvão: quatro no Rio Grande do Sul, uma no Paraná e uma em Santa Catarina. A previsão feita pelo secretário de Energia Elétrica do MME, Josias Araújo, é que até 2030, a produção de energia a carvão no país chegue a 6.500 megawatts (MW).

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Foto: René Cabrales

Foto: René Cabrales

No Rio Grande do Sul, operam as termelétricas de Charqueadas, a Termochar, com 72MW; de Presidente Médici (Candiota I e II), com 446MW, e de São Jerônimo, com 20MW, ambas da CGTEE, empresa federal controlada pela Eletrobrás (Centrais Elétricas Brasileiras).

O parque catarinense é composto pelo Complexo Jorge Lacerda (I e II), no município de Capivari de Baixo, pertencente à Tractebel Energia, com 856 MW de capacidade de geração de energia, mais da metade do que é produzida no país. É o maior complexo de geração termelétrica da América Latina. E no Paraná, opera a Figueira, da Copel, com 20MW.

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Usinas em planejamento
UT do Pampa —————– Pedido de licenciamento
UT Seival II ——————- Projetada

* Fonte: Carvão, o combustível de ontem
Reservas para 200 anos de consumo

Dados do Instituto Mundial do Carvão indicam que as reservas mundiais de carvão mineral somam 726 bilhões de toneladas, suficientes para cerca de 200 anos de consumo. Os maiores produtores são China e EUA. O consumo mundial fica em média de 4,5 bilhões de toneladas.

No Brasil, 32 bilhões de toneladas das jazidas representam 50% das reservas nacionais de combustível. Estão localizadas nos estados da Região Sul e alguns vestígios em São Paulo.

No RS estão 89% das reservas nacionais, cerca de 28 bilhões de toneladas do mineral. A principal veia de carvão se estende do extremo Sul do estado até o Litoral Norte. A região da Grande Candiota tem a maior jazida, cerca de 12 bilhões de toneladas.

Santa Catarina tem 10% das reservas, cerca de 3,3 bilhões de toneladas. Está no Extremo-Sul do estado, nos municípios de Criciúma, Nova Veneza, Forquilhinha, Cocal do Sul, Treviso, Siderópolis, Urussanga, Orleans, Lauro Müller, Içara e Morro da Fumaça. No Paraná, as jazidas estão no Norte do estado, nos distritos carboníferos de Cambuí e Klabin.

Entre os principais clientes das mineradoras, o setor elétrico é disparado o mais importante, seguido das indústrias de papel celulose e petroquímico.

 

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