EDUCAÇÃO

Agência reguladora pode sair do papel

Lobby antigo do setor privado de educação para retirar a fiscalização da alçada do MEC por meio da criação de um órgão independente volta a ganhar força no governo federal
Por Marcia Camarano / Publicado em 7 de agosto de 2012
Mercadante tem acenado positivamente à pressão das IES privadas

Foto: Elza Fiúza/ABr

Mercadante tem acenado positivamente à pressão das IES privadas

Foto: Elza Fiúza/ABr

A criação de uma agência de regulação do Ensino Superior desvinculada do Ministério da Educação (MEC) para avaliar a qualidade dos cursos superiores é um lobby antigo das Instituições de Ensino Superior (IES) privadas no Brasil. Proposta surgida há mais de dez anos, volta a ganhar força e, muitos acreditam, agora com o apoio do ministro Aloísio Mercadante. Após várias tentativas do Extra Classe para que um representante do Ministério se posicionasse sobre o assunto, apenas um lacônico “no momento, não temos informações sobre o assunto”, foi dado como resposta.

Mas esse mesmo MEC, em passado recente, já teve posição consolidada e clara e totalmente contrária à proposição. Em 2006, o Ministério discordava frontalmente das entidades privadas. E o Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão do MEC, por intermédio de seu representante, Antônio Carlos Ronca, argumentava não haver motivos para tirar o trabalho da tutela do governo federal por meio da Secretaria de Regulação e Supervisão de Educação Superior (Seres). “Não vejo o porquê. A constituição diz que é papel do Estado regulamentar e avaliar a qualidade dos cursos”, disse.

E, para contrapor a posição das instituições privadas de que a análise de ensino feita pelo MEC é incompleta e imparcial, argumentou que “se há problemas, temos que trabalhar para corrigi-los”. (Portal OGlobo, 20.10.2006). Por sua vez, as escolas privadas eram bem diretas quanto ao que buscavam: “Queremos um mercado de Educação Superior, com menos intervenção estatal, porque o governo é sempre político e ideológico”. (Portal O Globo, 19.10.2010).

Se as posições eram tão claras há seis anos, hoje o governo federal dá apenas sinais de que o assunto está sendo tratado em diversos setores ligados à educação no país. Mais do que isto, que pretende mesmo tirar a fiscalização e a avaliação das Instituições de Ensino Superior da alçada do MEC, criando um a agência de regulação autônoma. Ciente disto, a direção do Sinpro/RS, por meio do jornal Extra Classe, se propõe a abrir o debate.

“O MEC tem pensado nisto e o assunto circulou tanto na Câmara de Educação quanto no Conaes. Mas a posição ainda é de expectativa”. E revela que estão sendo feitos estudos. Porém, o processo “parou um pouco” em função de que o Ministério está com suas atenções voltadas para a greve dos professores universitários públicos e o sistema de avaliação da Educação Básica.

Ele acredita que a ideia da agência reguladora vem para reforçar a fiscalização das instituições de Ensino Superior, “saindo de um espaço de pressão política que é o MEC”. Considera uma proposta “muito embrionária”, acrescentando que “não há risco de ser transformado em realidade sem antes passar por um processo de discussão”. De qualquer forma, o modelo está sendo discutido, mas não está sendo publicado.

SERES − Atualmente, é a unidade do Ministério da Educação responsável pela regulação e supervisão de instituições públicas e privadas de Ensino Superior e cursos superiores de graduação do tipo bacharelado, licenciatura e tecnológico, na modalidade presencial ou a distância. Zela para que a legislação educacional seja cumprida e suas ações buscam induzir a elevação da qualidade do ensino por meio do estabelecimento de diretrizes para a expansão dos cursos e instituições, de conformidade às diretrizes curriculares e de parâmetros de cursos e instituições. (Extraído do site do MEC).

O debate está posto entre os que acreditam não ser possível regular a educação, que é um bem público, e os que querem fazer com que este campo seja regulado pelo setor privado, cujo objetivo final é o lucro. Atualmente, o ensino universitário é de responsabilidade, majoritariamente, do setor privado.

AGÊNCIAS −Ganharam força no país na década de 90, especialmente nos governos do presidente Fernando Henrique Cardoso. Naquele período, estava em vigência o projeto de um Estado com menor intervenção na prestação de serviços, com a promoção de atividades privadas. Em sua maior parte, as agências de regulação seguem o que prega a iniciativa privada, com estabelecimento de metas de crescimento e níveis de qualidade para produtos e serviços, por exemplo.

QUALIFICAÇÃO − A professora Maria Beatriz Luce, do Núcleo de Estudos de Política e Gestão da Educação, da Faculdade de Educação da Ufrgs, defende que o debate deve ser aprofundado. Mas adianta que “é preciso termos clareza de que a regulação é uma competência do Estado, para que possa garantir os direitos sociais, coletivos e individuais relativos à Educação Superior; bem como conduzir este setor aos objetivos e metas do planejamento estratégico nacional”. Para ela, é possível que a ideia tenha surgido em função das dificuldades que o MEC vem enfrentando junto aos órgãos especializados que compartilham responsabilidades técnicas e administrativas. “Nós, educadores e pesquisadores que conhecemos esta problemática, estamos prontos para aprofundar estudos e debates sobre como evoluir e superar as dificuldades históricas e atuais”, defende. Conforme Maria Beatriz, “o Estado brasileiro precisa planejar, orientar, avaliar e controlar a Educação Superior que é oferecida aos brasileiros e no seu território”. Avalia que, “por sua natureza (alto interesse político e complexidade técnica), as atividades regulatórias requerem um quadro de pessoal muito bem qualificado e valorizado (carreira e remuneração)”. E questiona: “Por que não aparelhar a Administração Federal direta, o MEC com quadros próprios dotados de carreira e remuneração condizentes às suas funções?

CONTEE – Já a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) é contrária à agência e defende que, sendo a educação um bem público e não uma mercadoria, cabe aoMEC ocupar-se da regulamentação e fiscalização da Educação Superior brasileira.

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