OPINIÃO

Professor de papel

Por José Carlos Sturza de Moraes* / Publicado em 14 de novembro de 2013

Dos professores se espera que desempenhem múltiplas atividades, reduzidas à expressão ‘papel’ (missão, função). O papel, singular não expressa bem as plurais tarefas, funções, capacidades que se espera desses profissionais. Serei um professor papel artesanal, ‘feito à mão’, a partir – quem sabe – de poucos aditivos químicos poluentes? Ou um professor papel autocopiativo, “de alto valor agregado, que consiste basicamente de um papel convencional que recebe um tratamento superficial de agentes químicos especiais que quando entram em contato físico direto desenvolvem reação formadora de imagem”?

Um professor assim, artesanal e autocopiativo, também é aquele que se constrói sozinho? Mas é possível nos construirmos sozinhos, com base apenas nas reflexões de nossas leituras ou práticas educativas? Quando lemos já não estamos deixando de ser apenas nós mesmos? Esse ‘eu’ absoluto tem alto valor agregado? Agrega o quê? Quem sabe um professor papel bíblia, ‘papel finíssimo, quase transparente’? Ou um professor papel seda?

Um professor assim, finíssimo e transparente, é aquele que tem bons modos? Educado? Cortês? É aquele que desliza e se esconde por detrás das muitas invisibilidades que escolas e outras instituições sociais impedem que nos impliquemos com os processos sociais e suas produções? Ou é aquele que é claro em suas posições e formas de trabalhar e solidário no seu avaliar e questionar?

Quem sabe um professor papel jornal ou termossensível, de baixo custo, “feito de restos de móveis, reciclado, ou ainda para máquinas impressoras baratas, como calculadoras”?

Um professor assim – sonho de consumo de muitos gestores públicos – é aquele que não se envolve em greves? Que detesta os poemas de Brecht, especialmente aquele infame, intitulado Analfabeto Político? Que se atualiza didático-pedagogicamente com as matérias de jornal? Ou é aquele que expressa em seu cotidiano certa desconfiança sensível, térmica porque à flor da pele?

Que professor sou ou serei importa muito para mim e para muitos professores. Importa, especialmente, não ser um professor papel em branco, pois, assim como os estudantes com os quais trocamos experiências e saberes vida a fora, também temos leitura social extraclasse. Também temos nossas trajetórias de vida. Também somos humanos e rimos, choramos, amamos… Também rasgamos quando não cuidados e não valorizados.

* Professor da Faccat, bacharel em Ciências Sociais, especialista em Ética e Educação em Direitos Humanos e mestrando em Educação (Ufrgs).

Comentários