MOVIMENTO

Lula: só a morte pode me parar

Uma multidão estimada em 80 mil pessoas ocupou as ruas centrais de Porto Alegre em ato em defesa da democracia e do direito de Lula concorrer à presidência da República
Por Flávio Ilha / Publicado em 23 de janeiro de 2018

Foto: Igor Sperotto

Ato em Porto Alegre reuniu milhares na terça, 23

Foto: Igor Sperotto

O fim de tarde, que ameaçava chuva forte em Porto Alegre, terminou com sol e lua no Largo Glênio Peres, no centro da cidade. Uma multidão estimada em 80 mil pessoas pelos organizadores ocupou toda a Borges de Medeiros, entre as avenidas Julio de Castilhos e Salgado Filho, para um ato em defesa da democracia e do direito do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ser candidato em 2018. Na manhã desta quarta-feira, 24, o recurso de Lula contra a condenação em primeiro grau será julgado pela oitava turma do Tribunal Regional Federal (TRF-4).

Lula foi a principal atração do ato que reuniu lideranças de diversos partidos num espectro definido como da esquerda ao centro democrático: PCdoB, PT, PDT, PSOL, PSB, MDB e diversas centrais sindicais, além de entidades estudantis, engrossaram o comício – um dos maiores da história de Porto Alegre. A organização do ato não registrou qualquer incidente nas mais de três horas de manifestação.

O ex-presidente não decepcionou quem foi à rua para ouvi-lo. Disse que estava na praça não para falar de seu processo, nem da decisão da Justiça que pode torná-lo inelegível, mas para falar do Brasil, “que está sendo destruído por uma elite perversa”. Lula, mesmo assim, não deixou de provocar os juízes que estarão julgando seu recurso na manhã desta quarta-feira. “Eu duvido que nesse país tenha um magistrado mais honesto do que eu”, disse, sobre as acusações de que é dono do tríplex do Guarujá (SP), supostamente presenteado a ele pela construtora OAS em troca de favores no governo.

“Só uma coisa vai me impedir de continuar fazendo o que eu estou fazendo. É o dia que não estiver mais aqui. É o dia que eu morrer. Porque se eu tiver um ano, dez anos, um dia, podem ficar certos que eu estarei nas ruas deste país brigando para que se construa uma sociedade justa e igualitária”, afirmou.

No discurso, Lula também voltou a criticar duramente a imprensa, acusada por ele de mentir e de ser “covarde” ao não noticiar os fatos com isenção. “Uma imprensa mentirosa, que não tem respeito pelas famílias e pelas crianças. Se quiserem saber a verdade, eu poderia dizer a vocês para lerem o New York Times de hoje, que traz reportagens que a imprensa brasileira não tem coragem de divulgar. Leiam o El País, que publica matérias que a imprensa covarde do Brasil não tem coragem de produzir”. O New York Times publicou na edição on-line desta terça-feira, 23, um texto afirmando que a manutenção da sentença condenatória contra Lula jogaria o país em um abismo anti-democrático.

Também ironizou o apresentador global Luciano Huck, especulado como possível candidato à presidência pelo PSDB – apesar de já ter negado oficialmente intenção de disputar as eleições de 2018. Quando o público postado atrás do palanque pediu para vê-lo, Lula disse que não podia “ficar correndo”. “Só mesmo o candidato que a Globo inventar é que pode fazer isso, até porque estão tentando criar um candidato que vai representar o Brasil numa coisa chamada caldeirão”, ironizou.

E terminou conclamando a união da esquerda. “A esquerda eu acredito que vai se unir em algum momento, não em torno de um candidato, mas de um projeto que possa significar recuperar o país. Não temos o direito de permitir que, por razões menores, a direita, que não tem candidato, que está tentando construir um candidato, que aceita qualquer coisa, menos o Lula, possa predominar”.

Foto: Igor Sperotto

Ato reuniu partidos de esquerda ao centro democrático

Foto: Igor Sperotto

A ex-presidente Dilma Rousseff também participou do ato e afirmou que a tentativa de impedir a candidatura de Lula representa o terceiro ato do golpe que a tirou do poder em 2016. “Não interessa que ele seja inocente, como de fato é. O que está em jogo é a continuidade do golpe. Por isso precisamos de uma Justiça que não seja política, que não persiga ninguém”, afirmou.

Dilma também reforçou a estratégia petista de lançar Lula pré-candidato à presidência mesmo em caso de manutenção da condenação. “Não há plano B. Só existe um plano e esse plano é Lula candidato. Ele sabe construir consensos de forma democrática e vai permitir que o país se reencontre consigo mesmo”, completou.

Foto: Igor Sperotto

Caminhada reuniu milhares em Porto Alegre

Foto: Igor Sperotto

O ato também teve intervenções de outros dois pré-candidatos à presidência, Manuela D’Ávila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSOL). Manuela afirmou que o julgamento no TRF não é contra Lula, mas contra a democracia. “Impedir a candidatura [de Lula] é golpear a democracia na sua essência”, disse. Boulos, por sua vez, classificou Porto Alegre como a “capital da democracia” e disse que esta quarta-feira é “dia de enfrentar o golpe”. “Não é dia de diferenças. É dia de unidade”, discursou.

O senador Roberto Requião (MDB/PR) perguntou, em seu discurso, de que lado a Justiça ficará. “Ao lado do entreguismo e da covardia, se não arquivar a denúncia trôpega do juiz Sérgio Moro, ou do lado da Justiça? Em todo caso, a história irá julgá-los”, disse. Ao final do ato, que transcorreu sem incidentes, os manifestantes fizeram uma marcha até o anfiteatro Pôr do Sol para uma vigília.

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