AMBIENTE

Milho transgênico bancado pelo Estado

Governo gaúcho volta a subsidiar milho geneticamente modificado pela Monsanto e Dow Agroscience no Programa Troca-Troca, que revende sementes com desconto
Por Ariel Fagundes / Publicado em 21 de julho de 2013
Foto: Ariel Fagundes

Ariel Fagundes

BIO :contaminação transgênica ameaça diversidade do milho crioulo

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O alerta dos ecologistas não impediu o Fundo Estadual de Apoio aos Pequenos Empreendimentos Rurais (Feaper) de recolocar transgênicos no Programa Troca-Troca de Sementes de Milho. Gerido pela Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR), o projeto revende sementes aos produtores com um desconto que, em 2013, é de 28% de cada saca. José Batista, diretor do Departamento de Agricultura Familiar da SDR, conta que são gastos cerca de R$ 10 milhões anuais para bancar esse subsídio.

Uma das instituições que mais defendeu a volta dos organismos geneticamente modificados (OGM) foi a Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), que distribui 45% das sacas do programa. Seu presidente, Elton Weber, diz que lutou pelos transgênicos porque metade dos filiados à Fetag-RS pressionaram-na para isso: “Somos uma entidade sindical, nos guiamos pela demanda. Podemos ter diversas opiniões, mas se nossa base pede, não depende da opinião do presidente. Veio a demanda, vamos levá-la”.

Tal postura aflige Leonardo Melgarejo, representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) na Comissão Técnica Nacional de Biotecnologia (CTNBio), órgão que decide quais OGMs são liberados no Brasil: “As instituições que votaram a favor de transgênicos no Feaper tomaram a decisão com base em informações insuficientes. Embora existam grupos bem informados, existem muitas pessoas interessadas que não têm consciência do espectro abrangido pelas suas decisões e acreditam que o benefício individual deve ser buscado porque os efeitos colaterais não são relevantes”.

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Leonardo Melgarejo

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Batista discorda. Para ele, não há risco se o produtor respeitar a lei que exige uma área com plantas convencionais costeando a lavoura de OGM. Porém, ele admite que a SDR ignora quantos cumprem a norma: “Não temos esse dado porque não é competência desta Secretaria fazer o controle. Claro que, de certa forma, é. Mas não diretamente”. Para Melgarejo, essa lei, mesmo se exercida, não impede os danos da transgenia à saúde e ao meio ambiente. Além de citar estudos ligando OGM ao câncer, o membro da CTNBio destaca o perigo produtivo: “Essa tecnologia gerou revezamento de pragas. A lagarta do milho agora está roendo a vagem da soja. A lagarta do algodão migrou para outras culturas e agora há lagarta do milho no algodão. Isso é efeito colateral da tecnologia que estamos financiando pelo Feaper”, declara.

Apesar de Batista alegar que o transgênico se adéqua aos pequenos produtores e que hoje há mais deles plantando OGM no RS do que os de grande porte, há controvérsias. Segundo Weber, “em propriedades maiores, ele é mais difundido por questões econômicas e modelos de produção”. “As lavouras transgênicas estão coladas na pulverização aérea de agrotóxicos e ela não é viável para áreas pequenas. Essa tecnologia exige alta escala de produção. Por isso, distribuir transgênicos no Troca-Troca é corroer a estabilidade de estabelecimentos que plantam menos que 10 hectares”, diz Melgarejo.

Conforme Batista, “o Troca-Troca é responsável por um terço do milho plantado no estado”, o que faz do governo o maior comprador de sementes do RS. Das sete empresas que o fornecem, só duas produzem milho geneticamente modificado, a Dow Agroscience e a Monsanto. “A principal é a Monsanto, que participa com maior quantidade”, revela Batista. Em função disso, ambientalistas encerraram a versão porto-alegrense da Marcha Mundial Contra a Monsanto entregando ao secretário executivo do Gabinete do Governador, Itiberê Borba, um documento em repúdio ao subsídio de transgênicos. Apesar da promessa de que o texto seria avaliado, não há indícios de que a decisão possa vir a ser revertida. Pelo contrário, as sementes do Troca-Troca começam a ser distribuídas a partir de julho.

CARTAS MARCADAS – Paulo Brack, membro do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais, conta que o secretário da SDR, Ivan Pavan, Impediu ecologistas de ficarem na reunião do Feaper que recolocou os OGMs no Troca-Troca alegando que a sala era pequena demais. “Tal procedimento foi criticado pelos ambientalistas, pois (…) se contradiz à transparência e ao acesso à informação em atos públicos, já que se tratam de recursos públicos (…) e a decisão implica um conjunto de riscos à saúde, ao meio ambiente, à soberania alimentar e à autonomia dos agricultores familiares”, expõe Brack em texto publicado no blog da Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do RS. Procurado insistentemente, Pavan não comentou o caso.

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