ECONOMIA

Mais de 45% dos empregos no Brasil são de baixa qualidade

Baixos investimentos em educação e economia voltada para o mercado de exportação de commodities geram postos de trabalho mal remunerados, com instabilidade e jornada excessiva
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 15 de outubro de 2020
A característica principal da má qualidade do emprego no Brasil está no salário. Ao todo, 77,7% das posições não remuneram suficientemente para adquirir seis cestas básicas, critério de corte adotado pela consultoria

Foto: Elza Fiúza/ Agência Brasil

A característica principal da má qualidade do emprego no Brasil está no salário. Ao todo, 77,7% das posições não remuneram suficientemente para adquirir seis cestas básicas, critério de corte adotado pela consultoria

Foto: Elza Fiúza/ Agência Brasil

No Brasil, 40,8 milhões de empregos são de baixa qualidade, com instabilidade ou jornada excessiva e salários baixos. Essa é a conclusão de um estudo da consultoria IDados. Especializada em análise de dados e soluções para aumentar o impacto e produtividade de empresas, organizações públicas e do terceiro setor, a empresa aponta o pouco investimento em educação no país como fator dessa realidade. Outra questão é indicada pelo embaixador Sérgio Amaral: a ideia do Brasil em se focar como uma economia produtora de matérias-primas.

Para não contaminar dados com os efeitos da pandemia, consultoria usou indicadores do IBGE de 2017. Estudo semelhante realizado na América Central mostra que Brasil está com nível semelhante ao de países como Honduras (41,6%) e Nicarágua (43,3%).

Em uma realidade em que a taxa de desemprego da nação está em 13,3%, o número torna a situação ainda mais alarmante. O índice apontado pela IDados corresponde a 45,5% dos postos de trabalho ocupados.

Para Bruno Ottoni, economista e pesquisador da IDados, o baixo investimento na educação reflete diretamente no que diz ser baixa produtividade dos trabalhadores. É  “um problema estrutural que limita a oferta de boas vagas no Brasil”, afirma.

Segundo o pesquisador, essa baixa produtividade dificulta o crescimento de setores mais dinâmicos que poderiam gerar mais empregos.

O outro lado das commodities

Na década passada, o ex-embaixador Sérgio Amaral já alertava sobre a relevância de setores industriais para o emprego e o desenvolvimento

Foto: Arquivo Agência Brasil

Na década passada, o ex-embaixador Sérgio Amaral já alertava sobre a relevância de setores industriais para o emprego e o desenvolvimento

Foto: Arquivo Agência Brasil

Por outro lado, tem um grande peso nessa realidade a dependência do Brasil das exportações do agronegócio. Se a venda de nossas commodities para o exterior sempre serviram de impulso à economia brasileira, especialistas analisam que o superávit comercial desses produtos acaba gerando distorções na economia.

Preocupado com as dificuldades da indústria manufatureira, já em 2011 o experiente embaixador Sergio Amaral, hoje aposentado, perguntava no 23º Fórum Nacional se o Brasil deveria se curvar para “o declínio ou mesmo a extinção de setores industriais relevantes para o emprego e o desenvolvimento”.

Amaral foi embaixador do Brasil em Washington em três ocasiões e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Na sua última passagem como representante do Brasil nos Estados Unidos, de 2016 a 2019, foi deslocado pelo atual chanceler Ernesto Araújo para um posto burocrático em São Paulo.

O certo é que se as exportações do agronegócio expandem a arrecadação de impostos dos governos federais, estaduais e municipais e acabam sendo a principal ligação do Brasil com os mercados globais, sua prioridade na economia faz com que o país importe produtos de alta tecnologia e gere empregos “de qualidade” em outras nações.

Fatores de impacto

Baixo investimento em educação reduz produtividade dos trabalhadores: “problema estrutural que limita a oferta de boas vagas”, diz Ottoni

Foto: Bianca Gens/FGV/ Divulgação

Baixo investimento em educação reduz produtividade dos trabalhadores: “problema estrutural que limita a oferta de boas vagas”, diz Ottoni

Foto: Bianca Gens/FGV/ Divulgação

O estudo da IDados mede a qualidade do emprego para além dos salários, com base em literatura internacional surgida nos últimos anos. Na metodologia, diversos aspectos são reunidos em pontos e levam a um número final. Bruno Ottoni ressalta que a qualidade dos empregos contribui de forma significativa para o bem-estar geral de uma nação.

De acordo com o trabalho, a característica principal da má qualidade do emprego no Brasil está no salário. Ao todo, 77,7% das posições não remuneram suficientemente para adquirir seis cestas básicas, critério de corte adotado pela consultoria.

Logo abaixo dos salários está a falta de estabilidade. A IDados identificou uma excessiva rotatividade da força de trabalho, com cerca de 40% dos trabalhadores há menos de 36 meses em suas ocupações.

Na sequência, a questão da seguridade. Entre os ocupados, 35,7% não realizam a contribuição previdenciária. Isso os deixa sem direitos trabalhistas como os auxílios doença, acidente e aposentadoria.

Finalizando o ranking da consultoria, jornadas de trabalho superiores a 48 horas semanais, empregos sem carteira assinada ou trabalhadores por conta própria sem ensino superior.

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