GERAL

Ponte entre arte e aula

Valéria Ochôa / Publicado em 29 de dezembro de 1998

A primeira escultura surgiu em 1986. Uma peça em madeira, de 35 centímetros. Um ano depois, veio a primeira exposição. Hoje, tem obras suas no Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Margs), na Casa de Cultura Mário Quintana e em algumas galerias do Estado. Também, em São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro e outras cidades do país. “Estão com pessoas que passam por aqui, gostam do trabalho e acabam levando junto”, conta o personagem desta trajetória, o professor Udo Ingo Kunert, 51, natural de Porto Alegre.

Formado e pós-graduado em História, Udo é coordenador da disciplina de História do Pensamento Humano e professor da Unisinos e do Colégio Sinodal, ambos em São Leopoldo. Casado com Flávia, pai de Henrique, 19, e Ana, 15, mora em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, região onde está há 25 anos.

A escultura foi entrando na vida deste descendente de alemães quase que imperceptível. Na infância, a atenção pela arte foi chamada pelo pai, assim como o interesse pelo debate e pelas questões políticas do país, que o levou a optar pelo curso de História na faculdade. “Meu pai era pastor da Igreja Evangélica e muito atuante politicamente”, observa. “Lembro que ele me alertava sobre a importância da arte dentro do contexto social”. Udo credita ainda sua aproximação da arte a um professor do Colégio Sinodal, onde também foi aluno. “Ele me deu o ponto de partida, a modelagem”.

Mas foi mesmo nas visitas freqüentes a uma galeria de arte em São Leopoldo que o Udo deu o ponta pé inicial. Das artes plásticas, a escultura sempre exerceu uma espécie de fascinação sobre o professor. “Tomei coragem e levei meu primeiro trabalho para o proprietário da galeria dar uma olhadinha. Era o ano de 1986. Ele sempre conversava muito comigo e me disse: Bah, Udo, tu tá começando, tente mais vezes…”, recorda. “Até hoje quando olho para aquela peça me assusto. Tentei fazer uma figura humana original e acabou saindo uma coisa quadrada, chapada”, diz rindo.

A coragem persistiu. Aprendeu sozinho a esculpir na madeira. Escolheu as duras, como o ipê, grapia e angico. “Fui fazendo, arriscando, experimentando. Optei em ser autodidata a entrar nesta parte acadêmica da escultura”, expõe. Udo diz que tem uma influência bastante grande da arte primitiva africana. Mas faz questão de sublinhar que seu trabalho não é imitação. “Eu procuro chamar a atenção da importância do primitivo no ser humano, em resgatar aquilo que existe de sonho neste contexto social conturbado que vivemos, o qual parece nos levar cada vez mais para uma sociedade virtual”, acentua.

Um ano depois de ter feito o seu primeiro trabalho, veio o reconhecimento. Udo realizou a sua primeira exposição. “Um pessoal de Porto Alegre, gostou e pediu para eu levar algumas peças para expor na capital. E aí eu não parei mais. Meu trabalho alcançou uma expressão que passou a ser reconhecida pelas galerias”, conta. O artista não sabe bem quantas peças já vendeu, mas acredita que em torno de 200. Da madeira passou a dar forma à pedra sabão. “Me machucava muito”, explica. “Volta e meia aparecia em sala de aula com a mão enfaixada porque tinha fincado uma felpa enorme”.

Udo ainda se diz mais professor do que artista plástico. “Na verdade, fui sempre preferindo a sala de aula em lugar das artes plásticas, até porque foi como professor que consegui tudo o que tenho hoje”, observa. “A arte entrou na minha vida como uma atividade colateral, mais lúdica e até aproveitável em sala de aula. A partir da discussão de esculturas minhas, consegui que muitos alunos meus fossem visitar um museu, uma galeria de arte. Foram duas coisas paralelas que, de repente, se fecharam”.

Atualmente ele dedica três tardes e o final de semana exclusivamente para trabalhar no atelier, mas pretende aumentar este tempo quando se aposentar do magistério. “Já no ano que vem, ocuparei todas as tardes porque estou largando algumas turmas”, adianta entusiasmado.

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