GERAL

O Pirata Professor

LUIZ CARLOS BARBOSA / Publicado em 28 de março de 1999

"Brincar é coisa séria. FHC não brinca", diz Mário Pirata.Ele se apresenta como poeta, artesão e brincadeiro, credenciais que antecipam a jogada lingüística deste porto-alegrense que atende quando for chamado de Mário Pirata. E de saída avisa: “O poeta é uma grande orelha. Mais silêncio do que palavra”. Aos 41 anos, ele mantém a jovialidade do rapaz que lá pelos idos de 79 foi um dos protagonistas das cenas menos sisudas daquele grande espetáculo de contestação social, política, comportamental e cultural que anunciava os estertores da ditadura militar.

Agora, 20 anos depois, seis livros publicados, muitos versos escritos a pirógrafo em couro e madeira e um repertório de brincadeiras, cenas, cantigas de roda, cirandas, parlendas e histórias, Mario Pirata se descobre professor. Tem trabalhado com professores e estudantes de 1ª a 8ª série. “Estimulando na criança o exercício da poesia, da linguagem, da literatura e da inventividade”, descreve ele.

Casado com a atriz e professora de Educação Física Valkíria Gres, é pai de uma filha de seis anos, Thayhu – que significa amor na língua Guarani. Pirata observa com ironia que sua infância é de um tempo “em que castigo era ficar dentro de casa na frente da televisão”. “Vivíamos na rua, convivendo com a vizinhança, brincávamos de roda, fazíamos carinhos de lomba. Hoje as práticas sociais carecem de vínculo. Vivemos sem jogo, em um mundo fracionado”, assinala o ex-estudante de Filosofia na PUC que, junto com Ricardo Silvestrin, Alexandre Britto e Ricardo Portugal, entre outros jovens dos anos 70, ousou afirmar a necessidade da poesia. Começaram vendendo poesia em xerox nas mesas de bares e depois lançaram a “Roda de Poesia” na rua.

É um pouco de todas essas percepções e compreensões que ele tem levado para os espaços formais de Educação. Via de regra, “para o ensino formal, as crianças e jovens não gostam de ler”, constata, propondo uma reavaliação do conceito de leitura e um esforço sério na formação do professor. Ele estudou psicomotricidade e costuma pesquisar a linguagem oral como a cabocla, por exemplo, e está convencido de que “é preciso exercitar a leitura de uma forma lúdica, prazerosa”, convida. Por isso mesmo hoje atua junto a professores, este ano foi contratado pela Escola projeto para trabalhar com turmas de 1ª a 4ª série e pensa trabalhar com o 2º grau.

Durante três anos(82-85), ele se transferiu para Alvorada, desenvolvendo projetos para a Secretaria Municipal de Educação da cidade. Também vez por outra participa do “Brincando com as Palavras”, programa da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre que aproxima o público infanto-juvenil dos autores. Mas jamais abandonou a poesia na rua, no Brique da Redenção, nas praias do litoral ou nas portas de fábrica.

Esta trajetória inclui oficinas de jogos e poesia nas comunidades das ilhas do Guaíba, no IPA, na Escola Santa Rosa de Lima e inúmeras escolas de cidades como Farroupilha, Erechim, Cachoeirinha, Ijuí, Nova Roma do Sul. O autor de “Calcinha rosa na cadeira de balanço”(adulto/Editora Tchê), “As minhocas também amam”(infantil/Editora Sulina) e “Bicho Poesia”(infantil/Paulinas), tem a tradição das edições independentes. Seu primeiro livro, “Um pé-de-vento de nome huá” foi feito assim. “Fui para um encontro em João Pessoa(Paraíba) pagando toda a viagem com a venda do livro no caminho”, recorda.

O “pirata” nasceu de uma designação do então crítico de teatro Antônio Hohlfeldt do antigo Correio do Povo, depois de uma apresentação poética vestido de pirata no Teatro 1, a sala montada pelo “Ói Nóiz Aqui Traveiz” no prédio de um antigo “inferninho” da Ramiro Barcelos. Duas décadas depois daquele período de combate cultural e político, o poeta-pirata garante que a poesia é revolucionária porque não serve para nada. “É como dar um beijo. Por isso não se faz poesia em Brasília”. Em todo o caso, ele passa o telefone de contato (051)217-4467. “Para todos que quiserem descobrir o gozo – improdutivo – com a poesia”. Recomenda o pirata-professor.

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