OPINIÃO

Brasil, 200 anos

Barbosa Lessa / Publicado em 16 de junho de 2000

Depois de um tempão sem aparecer por lá, agora em abril fui a Jaguarão, a Cida Histórica, como convidado da prefeitura para participar da solenidade comemorativa do Brasil 500 Anos. Deu-me as boas-vindas o próprio prefeito, Vitor Hugo, pilchado à moda gaúcha como é de seu costume. Abracei velhos amigos, como o professor Eduardo e o professor Cléo. Fiz novos amigos, como o historiador Emygdio. Passei horas agradabilíssimas naquela cidade que se situa dentre as mais belas do Brasil, pela arquitetura histórica, e dentre as mais nobres, pela fidalguia de sua gente. Lindo, lindo!

As solenidades propriamente ditas propriamente dita ocorreu no suntuoso Teatro Esperança e desdobrou-se, depois, informalmente, na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Jaguarão. Os discursos se referiam empolgantemente à chegada das naus portuguesas a Porto Seguro, em abril de 1500, mas nenhum dos oradores teve a coragem de lembrar que, naquela época, a futura Jaguarão – e o Rio Grande do Sul como um todo – não pertenciam à comunidade lusitana. Por determinação do Tratado de Tordesilhas, inspirado pelo papa Alxandre VI, da enseada catarinense de Laguna para o Sul já éramos, todos, castelhanos.

Tal situação histórica se manteve até meados do século 17, quando o papa Inocêncio XI decidiu desmembrar do gigantesco Bispado da bahia um novo Bispado, o do Rio de Janeiro, e achou justo que a nova jurisdição episcopal se estendesse até a “fronteira natural” do rio da Prata. Isto deu base para que, em 1680, fosse erquida bem à frente da povoação espanhola de Buenos Aires, em território hoje uruguaio, não uma capela subordinada ao Bispado mas uma fortaleza subordinada ao governador do Rio de Janeiro: Colônia de Sacramento. O maior pomo-de-discórdia da América do Sul.

Jesuítas do Paraguai atravessam o rio Uruguai, fundam as sete cidades das Missões e trazem suas estâncias e ervais até a beirada da Lagoa dos Patos. É modestíssima, porém, a penetração portuguesa, limitando-se a alguns pontos isolados do litoral, tais como a fortaleza do Rio Grande e o porto de Viamão (Porto Alegre). A Terra de Ninguém. Um chamariz para gente sem eira nem beira, ladrões de gado, contrabandistas, gaudérios. Os próprios reis de Espanha e Portugal tornam-se os maiores interessados em definir até onde vão, mesmo, os territórios de cada um deles. 1750: Tratado de Madri, teoricamente entregando para o trono de Lisboa toda a extensão das Missões. Na prática, a guerra dos guaranis negando-se a entregá-la e a fundação do forte de Rio Pardo como ponto principal da defesa lusitana. O Tratado de El Pardo revoga o de Madri e faz tudo voltar ao que era antes.

Em 1763 o governador de Buenos Aires, D. Pedro de Caballos, conquista a fortaleza de Rio Grande e enxota o comandente coronel Madureira para o porto de Viamão. 1777: Tratado de Santo Ildefonso, reafirmou a soberania espanhola nas Missões. Pouco tempo depois, o vice-rei do Prata, D. Pedro Melo, manda o governador militar de Montevidéu avançar no rumo do Brasil, daí resultando a fundação das trincheiras de Cerro largo e o início do povoamento às margens do rio Jaguarão.

Este o panorama até 1801, quando na Europa estoura nova guerra envolvendo Portugal contra a coligação Espanha/França. Imediata repercussão em Porto Alegre, onde o governador Veiga Cabral decide-se a formar exércitos para uma guerra de verdade nestas bandas do Sul. Que resultou na definitiva anexação das Missões e de Jaguarão ao território brasileiro.

Brasil 200 Anos foi a comemoração imaginada, meio por brincadeira e meio às deveras, agora para o ano que vem, em Jaguarão. Vale a pena levar adiante.

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