OPINIÃO

Irrelevâncias

Publicado em 17 de julho de 2007

Os escândalos e pseudo-escândalos se sucedem e não se sabe mais distinguir os que merecem indignação nova dos que só vêm para abafar o anterior. A própria indignação acumulada acaba tendo efeito anestesiante – o que mais há para sentir e dizer, depois da conclusão de que todo mundo é corrupto fora o Jefferson Péres? O resultado previsível disso é a total desmoralização da política e dos políticos, e portanto da democracia, no Brasil. Mas há outro resultado possível desse desencanto, não sei se melhor ou pior. Como, pelo que ouço e leio, a economia brasileira vai melhor do que jamais foi nesses últimos 10 anos e não parece ser afetada por grampos, denúncias, revelações, CPIs, adultérios, bobagens ditas pelo Lula ou na sua presença etc., consagra-se entre nós a tese da irrelevância da política. Como os banqueiros estão contentes e o povão reelegeria o Lula, seus improvisos e seus parentes num minuto, resta à política a fofoca e o concurso de oratória e à oposição a tênue esperança de um escândalo tão escandaloso que anule a anestesia. Devemos relaxar e gozar, já que uma democracia inconseqüente é melhor do que democracia nenhuma, ou lamentar termos chegado a tal desconexão entre realidade econômica e noticiário, que a própria corrupção se tornou irrelevante? Não olhem para mim, eu não sei a resposta. Prefiro uma democracia que funcione, mas isso é quase dizer que prefiro um país em crise econômica e institucional a cada nova ação da Polícia Federal.

O nome do CD é Jobim Violão, o que na sua singeleza já dá uma idéia do que está gravado. Só Antônio Carlos Jobim no violão de Arthur Nestrovski, que selecionou 14 composições do Cancioneiro Jobim e as interpreta como Tom as deixou em partituras para piano. Nestrovski, além de grande violonista, é um dos nossos melhores críticos culturais. Num texto que acompanha o CD, ele diz que “nenhum dos arranjos do disco inclui introduções, interlúdios, variações ou codas – exceto, claro, as que já estão na partitura”. Ele explica que foi preciso adaptar alguma coisa, pois “o violão tem muito menos notas do que o piano, nem sempre é possível armar acordes do mesmo modo e as figurações às vezes têm de ser alteradas, mas sem negar o corpo e a alma do violão – nem do violonista – os arranjos se esforçam para fazer o que, afinal, é o mais raro: tocar o que Jobim escreveu”. No CD, gravado pela Gaia Discos com patrocínio do Instituto Moreira Salles, ouve-se Tom Jobim respeitosamente depurado à sua essência. Só uma coisa, Arthur. Nas 14 ficaram faltando Wave, Inútil Paisagem, Águas de Março e mais umas 10. Um segundo volume, rápido.

Comentários