OPINIÃO

Psiulêncio

Publicado em 13 de setembro de 2009

Ouça o Silêncio: ele sussurra seu sumiço na sociedade. Já não soa como dantes, nem dentro nem fora do quartel de Abrantes.

Sinta esse impronunciável assunto. Calar sobre ele é dar consistência a ele; discorrer sobre ele é dissolvê-lo no ar. E lá vou eu, luvas de veludo num teclado de pelúcia, tateando a perícia.

Imagino o mais soturno Silêncio: estará em completo silêncio, repleto de ausências de ressonâncias? Deve haver, em alguma inaudível fronteira acústica, o Silêncio Absoluto – que nem o mais apurado ouvido absoluto consegue captar. Imensa mansidão que repousa na paz sem voz.

Mas o som tem marés insondáveis, onde as ondas sonoras não se aquietam nunca. Nas profundezas das escalas, se insinuam no Silêncio e o deixam cheio de si, pleno de sons infras e ultras. Um Silêncio de encher o escuro e deixar animais de orelha em pé ou rabo entre as pernas. O mesmo sopro secreto de apitos invisíveis aos tímpanos humanos.

O que faz pensar na infinita e inaudita variedade de silêncios. No silêncio por constrangimento, que é, lógico, constrangedor. No silêncio compungido, sempre doloroso. No inquieto silêncio por timidez, que difere do silêncio da intimidade gêmea, ou do silêncio sinal íntimo de sisudez, e que nada têm em comum com o silêncio intimidador ou com os insuportáveis silêncios solenes, sem fim, onde sucumbimos de sono.

E existe a dessemelhança dentro do silêncio: nele podemos calar de tudo e cada coisa calada resulta num tipo singular de silêncio. Estar quieto não é a mesma coisa que estar sossegado, que não é igual a estar introspectivo, que não se parece com estar absorto, e nada disso tem a ver com estar simplesmente silente.

Já silenciar, em seu sentido seletivo, o da escolha de não silabar nem sibilar, pode ser um ato superior, enquanto o mutismo tende a ser só submissão à impossibilidade de ruído.

Por fim, o silêncio na repentina falta das sonoridades. Esse, salta nos ares e preenche áreas desocupadas de barulho. Sinistro ou não, surpreende ouvintes por seus retumbantes tons silenciosos: quando antecede, pesado, uma tormenta; no momento imediato após estrondos catastróficos; ao fim de desesperado grito rebentado ao meio; no staccato de uma poderosa sinfonia; na trégua do eco das nossas passadas solitárias na mata; em seguida a súbitas freadas na madrugada. Silêncios assim são ensurdecedores.

Silencie ante o silêncio. Sobretudo sob o de uma arma com silenciador.

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