OPINIÃO

Algumas perguntas sobre a internet e a política

Por Marco Aurélio Weissheimer / Publicado em 12 de outubro de 2013

Muito tem se dito, escrito e debatido a respeito do impacto e das implicações da internet na política. A resposta mais comum à pergunta “a internet pode mudar a política?” talvez seja hoje: já mudou. Mudou mesmo? Talvez seja importante refletir um pouco sobre o significado da própria pergunta. Em um sentido mais banal, podemos dizer que, sim, em certo sentido, a internet pode mudar a política e já mudou. Em outro, porém, há elementos próprios da esfera da política que não são alterados qualitativamente pelo exclusivo uso de uma determinada ferramenta tecnológica, por mais poderosa que essa possa ser.

O que é a internet, afinal de contas? Perguntemos à própria como ela se define. Clicando a palavra “internet” em um de seus espaços mais conhecidos no mundo inteiro, o Google, temos acesso a uma interminável lista de links oferecendo definições e temas associados ao objeto da busca. É muito significativo que, no caso da palavra “internet”, as primeiras referências que são apresentadas são doislinks de natureza comercial, dois anúncios de empresas operadoras de banda larga. Isso já nos diz algo importante sobre a natureza da internet hoje: uma de suas ferramentas mais importantes apresenta- se, em primeiro lugar, como um espaço comercial, uma nova fronteira de produção e acumulação de capital e de lucro. Certamente, não é só isso, mas essa função parece ocupar um espaço cada vez mais importante na rede.

Após os anúncios comerciais, temos acesso a uma definição da Wikipedia, outra ferramenta conhecida e utilizada hoje no mundo inteiro:

“A internet é o maior conglomerado de redes de comunicações em escala mundial, ou seja, vários computadores e dispositivos conectados em uma rede mundial e dispõe de milhões de dispositivos interligados pelo protocolo de comunicação TCP/IP que permite o acesso a informações e todo tipo de transferência de dados. Ela carrega uma ampla variedade de recursos e serviços, incluindo os documentos interligados por meio de hiperligações da World Wide Web (Rede de Alcance Mundial), e a infraestrutura para suportar correio eletrônico e serviços como comunicação instantânea e compartilhamento de arquivos.”

A Wikipedia nos apresenta também alguns números que dão uma dimensão do tamanho desta rede mundial de comunicação:

“De acordo com a Internet World Stats, 1,96 bilhão de pessoas tinham acesso à Internet em junho de 2010, o que representa 28,7% da população mundial. Segundo a pesquisa, a Europa detinha quase 420 milhões de usuários, mais da metade da população. Mais de 60% da população da Oceania tem o acesso à Internet, mas esse percentual é reduzido para 6,8% na África. Na América Latina e Caribe, um pouco mais de 200 milhões de pessoas têm acesso à Internet (de acordo com dados de junho de 2010), sendo que quase 76 milhões são brasileiros.”

Além disso, somos informados também que a internet teve origem no setor militar (nos Estados Unidos) e seus primórdios remontam ao período da Guerra Fria com a União Soviética. Temos, assim, algumas informações básicas sobre a internet: ela é hoje uma rede planetária de comunicação e informação, que teve origem na área militar, e que hoje se estende a praticamente todas as dimensões da vida humana com uma crescente expansão da área comercial privada. Essas são informações que a própria internet oferece sobre si mesma.

Considerando essas caracterizações voltemos à pergunta: “a internet pode mudar a política”? E por que a política deve ser mudada? Segundo as definições acima apresentadas, essa rede mundial de comunicação, crescentemente dominada por interesses comerciais privados, pode ajudar a resolver aquele que seria um dos principais problemas da política, a saber, a corrupção. Ou, dito de outro modo, uma ferramenta crescentemente dominada pelo setor privado, cujo objetivo principal é o lucro, teria o poder de resolver o problema da corrupção na política. Mas o problema da corrupção na política não tem a ver com a busca de lucro por parte de empresas privadas?

Tudo isso parece sugerir um pouco de prudência quanto às possibilidades de uma ferramenta privada alterar qualitativamente para melhor a “atividade dos cidadãos que se ocupam dos assuntos públicos com seu voto ou com sua militância”, para usar uma definição que a própria internet nos apresenta da política. Mais do que isso, sugere uma reflexão mais cuidadosa sobre a possibilidade de qualquer ferramenta tecnológica fazer isso. Se somos animais políticos, como disse Aristóteles, o que é mesmo que nos define? Qual o espaço de reflexão que separa hoje o sentido do pensamento de Aristóteles sobre a política e o modo como ele nos é apresentado diariamente por essa fantástica ferramenta tecnológica? Uma pista: a resposta a essas perguntas não pode ser encontrada na internet.

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