CULTURA

Cem anos de espumante no Brasil

Por Maria Amélia Duarte Flores * / Publicado em 8 de dezembro de 2013
Traça, trabalho de Chico Machado, de 2012

Stock Photo

Traça, trabalho de Chico Machado, de 2012

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As datas festivas de final do ano são marcadas pela presença de uma bebida cuja produção no Brasil completou cem anos em 2013: o espumante. Resultado da ousadia e pioneirismo da família Peterlongo, que veio da Itália no início do século passado e se alojou em Garibaldi, na Serra gaúcha, o espumante foi uma das bebidas mais estudadas no Rio Grande do Sul. Há muitas histórias, mas se sabe que os fatores decisivos foram a aliança à cultura do norte da Itália (de consumo do vinho, uvas brancas, espumantes naturais, como asti em seu método rural) à chegada das congregações francesas, principalmente, os Irmãos Maristas, que dominavam técnicas de vinificação.

O vulto da indústria de espumantes muito deve a um pai sonhador e a um filho visionário e executor, cujo foco era elaborar um espumante legitimamente brasileiro, com a mesma ou superior qualidade de qualquer outro elaborado no mundo. Em 1913, na 1ª Festa da Uva de Garibaldi, Manoel Peterlongo foi condecorado com a Medalha de Ouro, com seu Moscato Champagne. Manoel era agrimensor, migrou da Itália para Garibaldi para demarcar terras e trouxe o hábito de beberchampagne e o conhecimento da elaboração de licores. O primeiro espumante produzido por ele surgiu por hobby, mas, logo, se desafiou a buscar uvas finas e a estudar o processo. Em 1915 registra oficialmente a Casa Peterlongo. Com a morte de Manoel em 1924, seu filho Armando, de 21 anos, se envolve completamente com o assunto e aprimora todo o legado do pai. Em 1924, o jovem Armando funda a Associação Comercial de Garibaldi. É pioneiro na contratação de mulheres, tanto para os vinhedos quanto para a vinícola, no pagamento de salário mínimo e encargos trabalhistas a todos os funcionários, além da preocupação com o desenvolvimento cultural da cidade.

CASTELO – Em 1930, encomenda do arquiteto italiano Sylvio Toigo um castelo com cave ao modelo francês, que pudesse ter similar “ou melhor” tecnologia que as caves estrangeiras. Surgiu o Estabelecimento Vinícola Armando Peterlongo, com mais de 10 mil metros quadrados de área construída em basalto, a maior construção do gênero na América Latina. Nela, um túnel garante a refrigeração da cave, construída aos moldes de Champagne, na França.

No início dos anos 1940, o Champagne Peterlongo era exportado até para os Estados Unidos e passou a figurar nas mesas dos banquetes do presidente Getulio Vargas (até a Rainha Elizabeth brindou com a bebida em uma visita ao Brasil nos anos 1960).

Em meados dos anos 1950, chegam franceses, como Georges Aubert, e com eles o método charmat. Garibaldi consolida-se como “A terra do Champanha”. Armando Peterlongo faleceu em 1966, deixando uma empresa consolidada.

Nos anos 1970, multinacionais como Chandon, Seagram, Martini, Cinzano também instalam- se no município. Em 1973, chega o enólogo argentino Adolfo Lona. É dele a criação de eventos como aFenachamp (anos 1980) e a grande contribuição cultural Confraria De Lantier, que aproximou muitas pessoas do universo do vinho.

Hoje os espumantes espalharam-se pelo Brasil. A história não pertence só a Garibaldi, pode-se encontrar maravilhas em Pinto Bandeira (onde está a Cave Geisse e Valmarino); preciosidades no Vale dos Vinhedos; novidades na Campanha Gaúcha (como a Guatambu), sem contar o adocicado dos espumantes moscatéis do Vale do Rio São Francisco.

* Coordenadora do Núcleo Cultural do Vinho da Fundação Ecarta

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