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O país vive um estado de exceção

Publicado em 5 de setembro de 2016

A operação desencadeada para derrubar a presidenta Dilma Rousseff, eleita com mais de 54 milhões de votos em 2014, lançou o país em um estado de exceção, com a suspensão de garantias individuais e violação explícita de direitos constitucionais, provocando um grave retrocesso que deverá custar muito caro ao país. Essa avaliação foi repetida, nas últimas semanas, com diferentes entonações, por quatro juristas e um dos principais cientistas políticos do Brasil que advertem para as consequências do que está acontecendo agora sob o disfarce de uma “luta contra a corrupção”

Para Marcelo Lavenère, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Operação Lava Jato, conduzida pelo juiz Sérgio Moro, vem cometendo abusos que são incompatíveis com o estado democrático de direito e só são compatíveis com a tirania e com o governo de um estado de exceção. Lavenère cita como exemplos a prática de abusos como julgamentos sumários, grampos e escutas colocadas em celas da Polícia Federal, em escritórios de advogados, o uso da prisão preventiva como uma forma de coerção, conduções coercitivas feitas de forma absolutamente irregular. Na opinião do ex-presidente da OAB, a conduta de Sérgio Moro está na contramão do moderno direito penal, que é um direito garantista. Lavenère lembra que, recentemente, Moro declarou que a prova ilícita, porém colhida de boa-fé, poderia ser usada nos processos penais. “Essa declaração não é do século 21, nem do século 20 ou do século 19, mas sim do período medieval”, critica o advogado.

Pedro Serrano, Marcelo Lavenère e Lenio Streck

Foto: Igor Sperotto

Pedro Serrano, Marcelo Lavenère e Lenio Streck

Foto: Igor Sperotto

“Fascismo judicial”
Professor de Direito da PUC-SP e autor do livro Golpismo e Autoritarismo na América Latina – Breve ensaio do Judiciário como instrumento de exceção, Pedro Estevam Serrano denuncia a instalação de um “fascismo judicial” no país, apoiado pelo que chama de uma “ralé social”, que pede a volta de uma ditadura militar e repete discursos anticomunistas da década de 1960. Esse povo, diz Serrano, aclamou o juiz Sérgio Moro, não como alguém que vai promover a justiça no Brasil, mas sim como alguém que vai trazer a ordem. “Essa ralé é a base social que gera o fascismo judicial que temos hoje no Brasil. Ela é caracterizada por um déficit cognitivo e de informação, que é alimentado diariamente pelos órgãos de mídia. A lógica da mídia substituiu a lógica do Direito dentro do tribunal. A função dessa mídia é justamente constituir a ralé que vai servir de base para o fascismo judicial”, denunciou Serrano em um debate realizado no dia 18 de agosto, em Porto Alegre.

O sentido do governo Temer
Na avaliação do cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, Michel Temer deu os primeiros passos para promover um “grande salto para trás”, que atingirá diretamente a massa assalariada brasileira, beneficiada nos últimos anos com uma série de programas educativos e sociais. O que vai acontecer agora no Brasil, acrescenta, repetindo o que tem ocorrido em vários outros países, é uma redefinição programática dos contratos de solidariedade social, os quais serão mais uma vez submetidos à hegemonia da lógica do capital financeiro internacional. Neste sentido, adverte, o movimento contra Dilma é pior que o de 1964, pois tem um compromisso antinacional e reacionário muito mais violento que o dos militares daquela época. Cerca de 90% desse bloco que apoia Temer é profundamente antinacional, assinala.

Na mesma linha, Gilberto Bercovici, professor titular de Direito da Universidade de São Paulo (USP), diz que o Brasil está vivendo um período obscurantista, e o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff representa um retrocesso gigantesco na nossa história, que levará muito tempo para ser corrigido. O país ingressou em um regime de exceção com a violação de garantias individuais consagradas na Constituição, abuso de autoridade e ilegalidades cometidas por setores do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, aponta Bercovici, que ainda alerta: “Esse movimento político, jurídico e midiático que teve como objetivo derrubar uma presidenta eleita com mais de 54 milhões de votos terá graves consequências para a democracia brasileira e à economia do país”.

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