MOVIMENTO

Presidente da Funai foi demitido para satisfazer ruralistas

Queda de Antônio Costa do cargo confirma pressões sofridas, principalmente do Ministro da Justiça, Osmar Serraglio, ligado ao agronegócio
Cristina Ávila / Publicado em 5 de maio de 2017
Os caciques Raoni Metuktire e Megaron Txucurramãe visitaram a sede da Funai em Brasília nesta segunda-feira em apoio ao presidente Antônio Costa: "Eu mesmo quis vir aqui dar força para o presidente", disse Raoni no encontro.

Foto: Mario Vilela/Funai

Os caciques Raoni Metuktire e Megaron Txucurramãe visitaram a sede da Funai em Brasília no dia 25 de abril em apoio ao presidente Antônio Costa que vinha sofrendo pressões: “eu mesmo quis vir aqui dar força para o presidente”, disse Raoni no encontro.

Foto: Mario Vilela/Funai

A demissão do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Antônio Fernandes Toninho Costa, hoje, confirma o que o Extra Classe publicou ontem: o ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB/PR) defende interesses da bancada ruralista, a qual faz parte. “Os povos indígenas precisam de um ministro que faça justiça, e não de um ministro que venha tender para um lado”, afirmou. Ele externou preocupação especialmente com os povos isolados, prevendo que possa haver “uma catástrofe”, devido a cortes orçamentários que afetam 12 Frentes de Proteção, instaladas no país para evitar ameaças à sua sobrevivência. Também revelou que a continuidade das atuais políticas do governo federal possam acirrar ainda mais as agressões que os índios têm sofrido tem todo o Brasil, por incitamento ao ódio.

Antônio Costa soube de sua demissão pelo Diário Oficial da União, que foi assinada pelo chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Ele considera que sua saída tenha sido provocada por não compactuar com “malfeitos” do governo federal. Entre as pressões que sofreu no exercício do cargo, estão pedidos de contratos de pessoas ligadas à base aliada do governo. “Há incompreensão por parte do Estado brasileiro de que o papel do presidente da Funai é exercer políticas indígenas, e creio que devo ter contrariado alguns setores, por isso a minha saída. Não permiti ingerências políticas dentro da instituição. A Funai é especializada, constituída por cargos técnicos e servidores concursados. Jamais eu deixaria entrar na Funai pessoas que não têm nenhum compromisso com as causas indígenas”.

Presidente da Funai foi demitido para satisfazer ruralistas

Foto: Marcelo Camargo ABr

Brasília – O ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Antônio Costa, durante entrevista coletiva sobre a sua exoneração

Foto: Marcelo Camargo ABr

O presidente demitido da Funai expressa as entranhas de um governo que tem pressionado os povos indígenas de forma estrategicamente planejada, com discursos que provoquem o ódio contra os índios por parte da população, com a elaboração de leis que extinguem direitos constitucionais e com alianças com pessoas inescrupulosas no Executivo, Legislativo e Judiciário. O objetivo central é que os índios percam suas terras. Para o avanço dos plantios da soja, milho, da agropecuária, sobre campos e florestas naturais ocupadas tradicionalmente por populações que vivem em harmonia com a natureza. Mas não apenas por isso. Os interesses políticos e econômicos também projetam sua ganância sobre tesouros, como minerais preciosos, por exemplo.

A demissão de Antônio Costa expõe as articulações políticas, ao confirmar que o Ministério da Justiça é local em que se realizam reuniões periódicas que resultam nas megaoperações, muitas vezes com a participação de policiais federais, pagos pelos cidadãos e que têm a atribuição de garantir a segurança inclusive dos próprios índios. Na matéria publicada ontem pelo Extra Classe, o deputado Luís Carlos, que é um dos frequentadores assíduos do MJ, deixa clara a sintonia da bancada ruralista com os mandatários que assumiram o comando da nação depois do golpe, e relata as inúmeras reuniões a gabinetes fechados.

DISCURSO DE ÓDIO – Os políticos proferem discursos sem nenhum constrangimento nem medo de punição, pois são maioria no Congresso e confiam nos amigos que têm nos três Poderes, fato que se comprova com o relatório lançado nesta semana pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a Funai e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), esse com o objetivo também de despejar pela lei os quilombolas de suas terras. A CPI reivindica o indiciamento de aproximadamente 50 pessoas, entre representantes de organizações não governamentais até o que eles consideram “falsos índios”. O ex-presidente da Funai também demonstrou que o órgão é atacado também por cortes no orçamento. “Para que funcione, são necessários R$ 9 milhões mensais. No mês passado foram repassados R$ 4 milhões”.

Os discursos têm endereço certo: criar ódio contra índios. E não apenas isso. Mas é comum que políticos que defendem essas causas se vistam de bondade como defensores das famílias agricultoras. Para isso, o agronegócio planta também o medo, fazendo que os agricultores temam a invasão de suas terras pelos índios. Quando a realidade o que acontece é o contrário. A história brasileira mostra que os grandes empreendedores usam não apenas as armas de fogo, mas também acirram disputas de índios e agricultores, para no final de tudo tomarem suas terras.

 

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