MOVIMENTO

Polícia impede marcha do 23º Grito dos Excluídos

Centenas de pessoas se concentraram a partir das 9h30 na Rótula das Cuias, no centro de Porto Alegre, RS, mas precisaram ficar restritas ao local. Segundo a BM, a ordem foi da Secretaria da Segurança
Flávio Ilha / Publicado em 7 de setembro de 2017

Mesmo com todo o aparato repressivo, a manifestação se realizou em um clima de fraternidade

Igor Sperotto

Com aparato ostensivo de repressão, incluindo soldados do Batalhão de Choque armados com bombas de efeito moral, a Brigada Militar (BM) impediu nesta quinta-feira, 7, que os participantes do 23º Grito dos Excluídos realizassem sua tradicional marcha pelas ruas próximas ao Desfile Militar em alusão ao Dia da Independência do Brasil, em Porto Alegre. Centenas de pessoas se concentraram a partir das 9h30 na Rótula das Cuias, no centro da capital, mas precisaram ficar restritas ao local. Segundo o comando da BM, a ordem foi da Secretaria Estadual da Segurança Pública.

Foi a primeira vez desde 1995 – quando ocorreu a primeira edição do Grito dos Excluídos – que a manifestação ligada a movimentos sociais, religiosos e sindicais foi impedida de fazer a marcha. As tentativas de negociação por parte dos organizadores esbarraram na intransigência do comando, que negou qualquer possibilidade de avanço dos manifestantes. “É um absurdo, pois estamos confinados a este espaço, sem ordem judicial ou qualquer instrumento legal que o valha. É mais um passo na estratégia acelerada de criminalização dos movimentos sociais”, protestou o presidente estadual da CUT, Claudir Nespolo.

Humberto Maizteg, do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil, também criticou a decisão. “A democracia tem sido abalroada todos os dias. Parece que todos os dias acontece um novo golpe. Vamos continuar ocupando os espaços que forem permitidos, pois não viemos aqui em busca de confronto. Nossa manifestação sempre foi pacifica”, disse.

Mesmo com todo o aparato repressivo, a manifestação se realizou em um clima de fraternidade e alegria. Bandeiras de movimentos sociais, como Movimento dos Sem Terra (MST) e Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) conviveram tranquilamente com bandeiras do Brasil, agitadas por manifestantes inconformados com a situação atual do país. “Não é possível que as pessoas não se deem conta do que está ocorrendo. Nossos direitos estão sendo dilapidados rapidamente”, justificou o comerciário Justino Flôres, que empunhava uma bandeira brasileira no ato.

Junto com palavras de ordem por direitos e democracia, o tema oficial da edição deste ano, os manifestantes exibiram faixas pedindo a volta da ex-presidente Dilma Rousseff e pela garantia de eleições livres em 2018 – o que inclui a possibilidade de candidatura do ex-presidente Lula. Uma banquinha colheu assinatura pela ação popular pela anulação do impeachment.

A CUT, uma das entidades organizadoras do Grito dos Excluídos, lançou também uma campanha de coleta de assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular pedindo a revogação da reforma trabalhista, aprovada pelo Congresso em julho. “Queremos recolher 1,5 milhão de apoios em nível nacional para apresentarmos o projeto ainda este ano”, informou o presidente da CUT no Rio Grande do Sul.

No ato também foi lida uma carta do Papa Francisco sobre a questão da desigualdade, elaborada durante o II Encontro Mundial dos Movimentos Populares ocorrido na Bolívia em 2015. “Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos. E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”, escreveu o Papa.

O senador Paulo Paim (PT), que também participou do ato, disse que as reações à perda de direitos por parte de trabalhadores começam a ocorrer em todos os lugares à medida que as pessoas se dão conta da gravidade da situação. Mas ele acredita que a reação maior se dará em 2018, quando algumas mudanças começarão a surtir efeitos negativos.
“Hoje, nem os empresários sabem muito bem como aplicar tanta maldade”, disse o senador, referindo-se à reforma trabalhista que entrará em vigor no mês de novembro. Paim apresentou também um projeto de lei solicitando a revogação da reforma trabalhista, mas reconhece que se trata mais de uma estratégia política do que uma medida que possa surtir efeito prático.

Paralelamente, o senador iniciou um movimento suprapartidário para elaborar o que chamou de Estatuto do Trabalho – um projeto capaz de retomar medidas de cunho social, como a proibição da terceirização em atividades-fim e a prevalência da lei sobre o negociado nas questões trabalhistas, que se sobreponha à reforma aprovada pelo governo Temer. O objetivo é apresentar um projeto em 2019.

“Até lá, vamos realizar audiências públicas e ouvir trabalhadores, empresários, juristas e a sociedade em geral, coisa que o governo não fez, para elaborar um projeto de lei”, informou o senador. Paim lembrou que 2018 é ano de eleição. “É nossa esperança. Com esse Congresso atual, nenhuma reforma de cunho social ou popular tem chance de prosperar”, disse.

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