OPINIÃO

Boataria

Publicado em 16 de julho de 2009

Tempos atrás, em meio a tantos boatos da época, surgiu um boato que despertou atenção: espalhava que não havia mais boatos. O povo gostou e passou-o adiante. Já tinha havido boatos demais, o país precisava de algum sossego. Pelo menos nos tímpanos.

Mas, não perdurou. Logo apareceu, vindo não se sabe de onde, um boato no sentido inverso. Monopolizou as conversas. Dizia que novos boatos viriam, e seriam incontroláveis. Porém, ao contrário da expectativa, só o boatão maior se disseminou, de tal jeito que por um período nem espaço houve para boatos inéditos.

Após semanas de incessante repetição de um único boato, estouraram dois de uma só vez. Uma corrente boateira insistia que de agora em diante os boatos só seriam difundidos se fossem de fontes fidedignas; outra divulgava que os boatos somente se alardeariam caso não fossem alarmantes. Houve confusão, claro. A população não sabia qual boato era mais confiável para desconfiar. Dias terríveis: qualquer boatozinho em torno da situação ficava monstruoso de uma hora para outra.

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Então, um boato sutil se ergueu, devagarzinho, até virar um boca a boca nacional. Não passava de um murmúrio, nada preocupante: insinuava que os boatos – todos! – estavam diminuindo. Só esse, no cenário incerto, não decrescia, se avantajava. Por isso a informação era ora ouvida com descrença, ora piamente, e repassada na base do muito antes pelo contrário. O clima era propício a mais boatos e eles choveram, embora a meteorologia até propagasse outra coisa.

Como tudo que sobe desce, os dias subsequentes ganharam calmaria, nem uma mosca sem fundamento se ouvia. Os boatos se mantinham condizentes, à beira do crível. Falsa aparência. Na surdina, aqui e ali, começaram a pipocar boatos, inclusive que ia faltar pipoca. Eram boatos que nem pareciam isso – coerentes, consistentes, convincentes. Ou pelo menos assim soavam, opinava outro boato sobre tais boatos.

Bem, isso é passado. O que se ouve agora é que a invencionice estaria moderada. Há controvérsias, claro. Já apregoam a incapacidade brasileira de boatar como antes. Cochicham sobre improvisos com fundo de verdade. Enfim, nada conclusivo, e ainda tem uma versão que conclui às avessas.

Na boataria, esse Oceano de Lavoisier, as marés de inverdades se sucedem, com reviravoltas mas sem revoltas. Dizem que a difusão infundada e profusa é falta do que dizer. Ou do que acreditar, sussurram de outro lado.

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