POLÍTICA

Por menos caiu Nixon

Fala de Bolsonaro no Japão expõe promiscuidade entre o Ministério da Justiça de Moro e a investigação da Polícia Federal no caso do laranjal do PSL
Por César Fraga / Publicado em 5 de julho de 2019

Foto: Reprodução WEB

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Enquanto a nova fase da #VazaJato monopoliza as atenções dos leitores ávidos por novidades sobre as conversas entre o ex-juiz Sergio Moro e o procurador da República Deltan Dallagnol publicadas pela Veja/The Intercept Brasil, algo tão grave ou até pior pode estar passando despercebido.  Texto do experiente jornalista Rubens Valente publicado na madrugada desta sexta, 5 de junho, no site da Folha de São Paulo, mostra que Moro, agora ministro da Justiça, privilegia o PSL e os Bolsonaros no caso dos Laranjas, vazando relatórios da investigação sob sigilo ao próprio presidente da República.

Rubens Valente, para quem não sabe é autor do livro Operação Banqueiro, que escancara a relação íntima e lucrativa de Daniel Dantas e Gilmar Mendes (do STF) e Os fuzis e as flechas – História de sangue e resistência indígena na ditadura, sobre as centenas de mortes de indígenas durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985).

Em sua coluna, intitulada Moro vazou para Bolsonaro, o jornalista chama a atenção que o presidente Jair Bolsonaro em entrevista coletiva no Japão, no dia 28, disse que o ministro Sergio Moro lhe deu acesso privilegiado a dados do inquérito sobre os Laranjas do PSL: “Ele (Moro) mandou a cópia do que foi investigado pela Polícia Federal pra mim. Mandei um assessor meu ler porque eu não tive tempo de ler”.  Para o colunista, o presidente da República ter revelado isso e não ter provocado  nenhuma reação  “é um sinal preocupante de debilidade das instituições”.

A investigação tramita sob segredo na 26ª Zona Eleitoral de Minas Gerais. Surgem aqui dúvidas éticas e legais. Bolsonaro foi além. Revelou que “determinou” a Moro, que por sua vez iria “determinar” à PF, que “investigue todos os partidos” com problemas semelhantes. “Tem que valer para todo mundo, não ficar fazendo pressão em cima do PSL para tentar me atingir.”

Valente revela que as declarações do presidente “devem” estar assustando policiais das diversas carreiras da PF.  Alguns deles ocupam cargos de direção de uma polícia que nos últimos 30 anos vinha trabalhando para que o órgão evoluísse para uma instituição “de Estado, não de governo”,  como a própria PF não se cansa de repetir. “Uma PF que não esteja à mercê dos rancores do presidente e do ministro de plantão. Um órgão que investigue fatos e não pessoas”, destaca.

A coluna expõe o paradoxo de Bolsonaro, que se elegeu agitando a bandeira “da lei e da ordem”, o que deveria pressupor mais respeito aos órgãos investigativos e que agora faz o inverso. “Acessa e fala sobre um caso sob segredo e humilha investigadores em praça pública ao ditar como devem se comportar, como se eles não soubessem seu papel. Ele também tem seguidamente atacado a PF por discordar, sem provas, das conclusões do caso Adélio”.

O jornalista arremata: “os órgãos de controle da União ou não ouviram o que Bolsonaro disse no Japão ou ouviram e silenciaram. Nos dois modos temos instituições cegas para o Alex Jones (apresentador de TV e rádio de extrema direita associado ao neonazismo nos EUA) que ora ocupa a Presidência. Ele exerce abertamente a ousadia dos impunes a fim de obter dados sigilosos e determinar o que deve ser investigado no país. Isso é que é Estado policial”.

Por menos que isso o presidente americano Richard Nixon caiu em 1972 depois dos vazamentos de dentro do próprio FBI americano (equivalente à nossa PF) para o jornal Washington Post que a Casa Branca estava envolvida com escutas ilegais no gabinete dos democratas, no edifício Watergate, em Washington.

 

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