SAÚDE

Letalidade da covid-19 no Brasil é maior entre não brancos e sem escolaridade

Relatório das Nações Unidas aponta que países com maior fragilidade estrutural como o Brasil terão mais dificuldades para superar a pior crise sanitária do planeta
Por Gilson Camargo / Publicado em 29 de setembro de 2021

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

No Brasil, 86% das crianças estão fora da escola e um terço não tem acesso ao ensino remoto

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Os países com maior desigualdade social foram os mais afetados pela pandemia, aponta o relatório Covid-19 e Desenvolvimento Sustentável, divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) nesta quarta-feira, 29.

A escolaridade e a cor da pele são determinantes nos índices de letalidade da doença, que impactou todo o mundo de forma desproporcional, destaca o documento elaborado por especialistas ligados aos organismos humanitários internacionais. A pandemia é considerada a pior crise sistêmica enfrentada pelo planeta desde a criação da ONU e será mais difícil de superar pelas nações menos desenvolvidas e com altos índices de pobreza como o Brasil, alerta o documento.

O Brasil é o segundo país em mortes por covid-19, o terceiro em casos confirmados e está em 62º lugar no ranking global de aplicação de doses de vacinas aplicadas. Ocupa o 82º lugar no ranking  de Desenvolvimento Humano (IDH), com índice de 0,765, o sexto menor da America Latina, atrás de Chile, Argentina, Uruguai, Peru e Colômbia.

Maior letalidade

Com base em dados sobre saúde pública compilados no país, a ONU destaca que a taxa de mortalidade entre pessoas não brancas é de 79% e, entre pessoas brancas, de 56%. A taxa de letalidade foi de 71% entre os brasileiros sem escolaridade, de 35% entre aqueles que cursaram o ensino médio e 22% para os que têm escolaridade de nível superior.

Acesso à saúde

O país tem 23,3 médicos para cada 10 mil habitantes em média, mas a desigualdade é grande nos estados. A maior proporção está no Distrito Federal, onde há 43,9 médicos por 10 mil habitantes e a última posição é ocupada pelo estado do Maranhão, que tem 8,1 médicos para cada grupo de 10mil habitantes. O relatório demonstra ainda que os brasileiros são, na sua maioria, dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS): 75,9% dependem do SUS e 24,1% têm planos de saúde complementar.

Exclusão escolar

Nos países com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) como o Brasil, 86% das crianças que deveriam estar recebendo a educação primária estão fora da escola. A exclusão escolar nos países com alto IDH é de 20%.

No mundo, 30% das crianças do mundo ficaram sem acesso ao ensino a distância na pandemia. Nas áreas urbanas no Brasil, quase um terço das famílias não têm acesso à internet. No meio rural, o percentual chega a 48%.

“Embora todos sejam potencialmente afetados de uma forma ou de outra por essa pandemia, alguns indivíduos e grupos são mais vulneráveis e sofrem mais danos. Neste caso, os caminhos para a recuperação são mais longos e incertos”, demonstra o relatório da ONU.

Fragilidades estruturais

O relatório destaca as fragilidades estruturais do país. “Notadamente, apesar dos ganhos substanciais em saúde, educação e no padrão de vida da população registrados nas últimas décadas, ainda há um conjunto de necessidades básicas diferentemente atendidas no Brasil e nos seus estados; e, paralelamente, uma nova geração de desigualdades se abre, alargando a lacuna entre aqueles que têm e aqueles que não têm”, diz o relatório.

O documento foi elaborado por um grupo de trabalho que reúne especialistas do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (Opas/OMS). O objetivo é contribuir com os esforços de recuperação do país.

Pós-pandemia

Além de possibilitar a compreensão dos diferentes aspectos do desenvolvimento que interagem com o surto da covid-19 no país como um todo e em cada um de seus 26 estados e no Distrito Federal, o relatório busca estabelecer parâmetros para o devido acompanhamento do processo de recuperação ao longo dos próximos anos.

Por meio da seleção de 94 indicadores, divididos em dois painéis – um que trata do grau de preparação do Brasil e dos estados para enfrentar os desafios da covid-19, e outro que mostra o perfil de vulnerabilidades em várias dimensões do desenvolvimento humano e sustentável –, o relatório apresenta um apanhado de dados que registra as desigualdades existentes e evidencia que um conjunto de novas desigualdades deverá emergir com força a partir da pandemia.

Dessa forma, fornece um marco que poderá orientar as ações de recuperação em todo o território brasileiro, considerando as especificidades de cada estado, para o alcance da igualdade, da resiliência e da sustentabilidade. Esta publicação poderá, ainda, ser utilizada como ferramenta para a construção de parcerias e para o alinhamento dos esforços de resposta aos efeitos da crise da covid-19 no Brasil.

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