POLÍTICA

Lula em Porto Alegre: “Ideb é vergonha nacional”

Em campanha na capital gaúcha, o ex-presidente e atual candidato do PT ao Planalto defendeu piso salarial do magistério e enfermagem e fez duras críticas aos cortes de investimentos em educação e saúde
Por Gilson Camargo, com reportagem de Stela Pastore e Rafael Figueiredo Rosa (fotos) / Publicado em 16 de setembro de 2022

Foto: Rafael Figueiredo Rosa

Ato de campanha de Lula no Largo Glênio Peres, no centro da capital reuniu cerca de 50 mil pessoas

Foto: Rafael Figueiredo Rosa

O ex-presidente e candidato à presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT) participou de atos de campanha na tarde e início da noite desta sexta-feira, 16, em Porto Alegre.

Acompanhado dos candidatos do PT ao Senado, Olívio Dutra; ao governo do estado, Edegar Pretto; da ex-presidente Dilma Rousseff, candidatos a deputado do PT e demais partidos de esquerda; Lula concedeu entrevista a jornalistas no hotel Plaza São Rafael após às 19h.

Já era noite quando o candidato, ao lado de apoiadores e da mulher, Janja, chegou ao Largo Glênio Peres, no Centro Histórico de Porto Alegre, que já estava lotado. A coordenação da campanha estima que cerca de 50 mil pessoas foram ao centro da capital para acompanhar o ato.

A educação dominou a agenda. Lula classificou de “vergonha nacional” os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira (Ideb) sobre alfabetização de crianças que haviam sido divulgados à tarde pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Declínio dos indicadores da educação

Instituído em 2007, durante o seu governo, o Ideb afere a qualidade do ensino público e privado no país. Com base em dados de 2021, o levantamento mostrou declínio acentuado na qualidade da educação, perdas na aprendizagem e aprofundamento das desigualdades regionais.

Dados preliminares do Censo Escolar da Educação Básica, também divulgados nesta sexta-feira pelo Ideb, mostraram uma queda de 5,3% das matriculados no ensino médio em 2022. Além disso, o Inep admitiu que o desempenho dos alunos, segundo o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), caiu em relação a 2021: o percentual de crianças do 2º ano do ensino fundamental que não sabem ler nem escrever no país é superior a 50%.

Teto de gastos

“O Brasil era o maior comprador de livros didáticos do mundo e melhorou os investimentos no ensino fundamental e médio, em educação, ciência e tecnologia e competitividade. Mudamos a Prova Brasil que tinha uma amostragem de 400 alunos e passamos a levar em conta todos os estudantes”, comparou Lula ainda na conversa com a imprensa.

No comício, Lula subiu o tom. Ele relacionou a crise na educação aos baixos salários dos professores, à falta de investimentos imposta pelo teto de gastos e à qualidade da merenda escolar. E ironizou o atual presidente. “Convido Bolsonaro a ir a uma escola pública para ver o que as crianças estão comendo”, provocou.

Lula defendeu o fim do teto de gastos e disse que “salários de enfermeiros e professores não são gastos, são investimentos, porque são servidores que prestam serviços à sociedade brasileira”.

Ministério dos Povos Indígenas

Foto: Rafael Figueiredo Rosa

“Vamos construir uma nação geradora de oportunidades, de conhecimento e de felicidade”, conclamou Lula

Foto: Rafael Figueiredo Rosa

Se eleito, disse, criará o Ministério da Segurança, um indígena será ministro de uma nova pasta, o Ministério dos Povos Indígenas; e também trará de volta o Ministério da Segurança.

“É inadmissível que 76 mulheres tenham sido assassinadas por feminicídio. As leis serão mais duras, porque mulher não é objeto de cama e mesa, mas sujeito da história para fazer o que quiser”, disse, em meio a aplausos de mulheres presentes ao ato.

Após cada interrupção, Lula retornava com uma afirmação que voltava a arrancar aplausos e gritos do público. “Vamos construir uma nação geradora de oportunidades, de conhecimento e de felicidade”, conclamou, afirmando que trabalha para “ganhar a eleição no primeiro turno”.

Ofensiva

No início de setembro, os partidos e movimentos que compõem a coalizão da campanha de Lula formularam uma ofensiva para tentar a vitória em primeiro turno, com a unificação das campanhas majoritárias proporcionais no estados, prioridade aos três maiores colégios eleitorais do país uma ofensiva contra Bolsonaro, que a 15 dias da eleição aumentou os ataques a Lula.

“Dá para ganhar no primeiro turno. A diferença está muito pequena”, disse o coordenador do programa de governo, Aloizio Mercadante. “Temos um tempo ainda até a eleição e estamos num quadro estabilizado há um ano. É possível vencer em primeiro turno. A população já entendeu que só Lula tira Bolsonaro”, afirmou. O deputado federal José Nobre Guimarães (Ceará), um dos coordenadores da campanha, alertou para o risco de a direita se unificar em caso de segundo turno.

A coligação ingressou com uma representação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelo bloqueio de um site registrado em nome da campanha do presidente e impulsionado com anúncios pagos, que dissemina fake news contra o candidato do PT.

Retrocessos

À tarde, no encontro com jornalistas, o candidato à presidência afirmou que o país despencou da 6ª posição na economia mundial, o que o motiva ainda mais na campanha.

“Não me conformo diante da destruição do país. Agora andamos que nem caranguejo”, lamentou, exemplificando com os 4 milhões de pessoas que esperam o benefício da Previdência e elencando ações que pretende adota caso seja eleito, como reajuste anual do salário mínimo, garantia de piso salarial para professores e enfermeiros, investimentos no agronegócio e na agricultura familiar, recuperação da Conab com estoques reguladores.

“A fome não é falta de comida, mas falta de vergonha de quem governa o país. O Lulinha paz e amor vai quebrar todo esse sigilo. Tudo vai ser apurado como era e como será”, atacou.

O desemprego e a fome também foram temas recorrentes nos pronunciamentos. “O Brasil precisa voltar a ser um país civilizado e com credibilidade internacional. Não basta voltar a comer três vezes ao dia, temos que ter o direito a ter passeio e um bom churrasco”, arrematou.

Questionado por jornalistas sobre a maratona de compromissos da campanha, devolveu: “Estou num momento bom aos 76 anos. Quando se tem uma causa não se envelhece”.

Participação popular

Foto: Ricardo Stuckert

Foto: Ricardo Stuckert

Lula reagiu aos ataques e repetiu o que vem afirmando sobre os processos da Lava Jato contra ele arquivados pelo judiciário. “Sou o único culpado de ser inocente” e reiterou: “não sou eu quem decretou sigilo nem pagou 51 imóveis em dinheiro vivo”.

Afirmou que corrupção se combate com transparência e que em seu eventual governo não haverá sigilo, voltará o portal da transparência e uma relação sadia com a imprensa, com as instituições e os entes federativos. “A participação popular volta e com conferências nacionais a partir do primeiro mês”.

Funeral da rainha

O candidato do PT também ironizou a ida de Bolsonaro ao funeral da rainha da Inglaterra, Elizabeth II: “foi ao enterro da rainha, mas não foi a nenhum velório ou sepultamento dos mais de 600 mil brasileiros que morreram de covid-19”.

Desfavorecidos

De acordo com os organizadores do evento, o público oscilou entre 50 mil e 80 mil pessoas até o final do comício, por volta das 21h. No início do ato, quem passava pelo local parou para acompanhar as falas do alto do carro de som.

Reni Siqueira, 34 anos, contou que ficou sem trabalho, sem creche para as duas crianças de 2 e 4 anos, e vive com auxílio emergencial. Na capital gaúcha, há 5 mil crianças da periferia como os filhos dela sem acesso à creche.

“Sou filho de agricultor e já montamos uma cooperativa habitacional para 250 famílias em Sapucaia do Sul graças ao apoio do Olívio Dutra quando ele era ministro das cidades e do Lula na presidência. Ele é um cara que conhece o sofrimento do povo e luta pelos menos favorecidos”, acrescentou o vendedor ambulante Vilmo Queiroz, 48.

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