EDUCAÇÃO

Mensalidade escolar: 100% acima da inflação no RS

Sindicato patronal justifica o reajuste com a disputa de mercado e a lei da oferta e da procura, além do desempenho da planilha de custos de cada uma instituição
Publicado em 10 de março de 2017

Mensalidade escolar: 100% acima da inflação no RS

Foto: Igor Sperotto

Foto: Igor Sperotto

O reajuste das mensalidades escolares no Rio Grande do Sul em 2017 superou todas as projeções de inflação para 2016, que fechou com a mais baixa taxa desde 2013, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge): 6,29%. Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela que o aumento das mensalidades ficou, em média, em 11,3%, quase 100% acima da inflação.

O presidente do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe/RS), Bruno Eizerik, diz que o Sindicato patronal não tem ingerência sobre o calendário ou as taxas das instituições de ensino, uma vez que cabe a cada uma delas calcular seus aumentos respeitando sua realidade. Nesse sentido, ele reconhece a legitimidade das ações das escolas na disputa de mercado e na lei da oferta e da procura. “O que acontece com o preço de algum produto ou serviço onde tem mais demanda do que oferta? Esse preço tende a subir, ao passo que se tem um serviço ou um produto que tem pouca demanda e maior oferta, esse preço não tende a subir, pode até baixar”.

Um dos argumentos apresentados pelas instituições de ensino para justificar o aumento dos valores das mensalidades é a planilha de custos das instituições. Questionado sobre quais seriam os itens dessas planilhas responsáveis por puxar os valores para cima, o presidente do Sinepe destacou os investimentos na ampliação ou instalação de laboratórios, como os de informática.  Ele também citou os gastos com os serviços públicos de água e luz que, segundo ele, “aumentaram acima da inflação”.

O valor total da anuidade escolar é regulamentado pela Lei Federal 9.870/99. A legislação permite que seja acrescido ao valor total da anuidade ou semestralidade a correção, que deverá ser proporcional ao aumento de despesas que a instituição de ensino teve com seu pessoal, encargos sociais, despesas administrativas, conservação e manutenção e investimentos em atividades pedagógicas. Conforme a mesma lei, deverá ser disponibilizada às famílias a comprovação dos itens que provocaram o aumento escolar mediante apresentação da planilha de custos.

Todas as projeções de inflação superadas
Segundo a economista do Dieese/RS Anelise Manganelli, ao analisar as projeções realizadas por analistas de mercado e pelo Banco Central em período que coincide com o qual as escolas estão construindo suas planilhas de custo, a estimativa da inflação de dezembro de 2016 divulgada pelo Banco Central em setembro de 2016 era de 8,08%, “bem abaixo do reajuste aplicado nas mensalidades”, e essa projeção foi baixando sistematicamente até o final do ano. “Em nenhum momento essas projeções foram tão altas”, comenta.

Conforme a especialista, nas projeções em novembro do ano passado, mês em que as escolas começam a calcular o reajuste de suas taxas para o próximo ano, o IBGE divulgou que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerando a inflação oficial do país, desacelerou de outubro para novembro ao passar de 0,26% para 0,18%. Para o Instituto foi o menor índice para os meses de novembro desde 1998, quando registrou queda de 0,12%. Também em novembro do mesmo ano, a estimativa dos economistas do mercado financeiro indicava que o IPCA fecharia 2016 em 6,69%, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central. Tais dados só corroboram a argumentação de Anelise quando verifica o distanciamento entre os valores praticados nas mensalidades no ensino privado no estado para 2017, considerando já as projeções de inflação.

Expectativa de investimentos no quadro docente
Para a diretora do Sinpro/RS, Cecília Farias, houve uma grande diferença entre o reajuste das mensalidades escolares e a inflação projetada para o período. “Ficamos surpresos e, ao mesmo tempo, na expectativa de que essa situação favorável às instituições de ensino reverta em investimento no quadro docente”. Como exemplo, cita o baixo valor do piso salarial da categoria e a diferença injusta dos valores entre os salários dos professores da educação infantil e anos iniciais com o salário dos docentes dos anos finais do ensino fundamental.

Luiz Eduardo Achutti é professor no Instituto de Artes da Universidade Federal (Ufrgs) e pai de um aluno do primeiro ano do ensino médio de um colégio tradicional de Porto Alegre. Assim como Cecília, ele também espera que os professores da escola de seu filho sejam bem remunerados para justificar parte dos altos valores que ele investe na escola. Além da mensalidade de R$ 1.609,00, ele ainda teve que pagar mais R$ 1.200,00 por uma “caixa lacrada” contendo “módulos e fichários”. “Fora os livros de literatura”, acrescenta. Como a matrícula agora é on-line, ele comenta que não teve acesso a qualquer justificativa pelo reajuste do valor da mensalidade.

Estudos do Dieese sobre o ensino privado gaúcho revelam que, de 2012 a 2016, as escolas tiveram reajuste percentualmente superior àqueles firmados nas normas coletivas de trabalho concedidos aos trabalhadores em Educação. Esse comportamento é observado tanto na educação básica como no ensino superior. Nesse período, na educação básica, os reajustes foram 11,6% acima do reajuste concedido aos trabalhadores e, no ensino superior, 4,2%.

Para o ano de 2017, a prévia da pesquisa que investiga o reajuste médio aponta para percentuais significativamente maiores do que a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de janeiro de 2017 – que, acumulada em 12 meses, foi de 5,4%. Segundo o estudo, no ensino básico, a média do reajuste das mensalidades é de 11,5% e, no ensino superior, 10,5%.

INADIMPLÊNCIA – Embora o aumento da inadimplência na rede privada de ensino tenha passado de 5% em 2011 para 8,5% em 2016, conforme dados do Sinepe/RS, Bruno Eizerik não demonstra preocupação. Segundo ele, do ponto de vista das escolas, não há estabelecimento de ensino que estime inadimplência zero ao fazer seu planejamento financeiro. Ele acredita que as coisas vão melhorar, pois a economia está dando mostras de alguma recuperação.

CAMPANHA SALARIAL – Começa a negociação com o Sinepe/RS
Iniciou na primeira quinzena de março a negociação salarial 2017 dos professores da educação básica e superior do ensino privado gaúcho. Até o fechamento desta edição, os professores estavam definindo a pauta de reivindicações em Assembleia geral regionalizada realizada em 26 cidades do estado. Este ano o Sindicato dos Professores (Sinpro/RS) deu continuidade à dinâmica inaugurada em 2015, aproximando a realização da Assembleia ao início do ano letivo e do processo negocial.

“Na conjuntura que vivenciamos no país, em que conquistas históricas dos trabalhadores e da sociedade estão em cheque, é o momento de valorizar a representação sindical, o rito e a cultura de negociação que sempre pautou a relação entre a entidade dos professores e o segmento patronal do setor”, destaca Marcos Fuhr, diretor do Sinpro/RS. Ele ressalta ainda que negociação coletiva e a campanha salarial são a principal circunstância de integração da categoria com a sua representação sindical.

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