EDUCAÇÃO

Paridade dos votos dos alunos pode decidir impasse na Uergs

Resultado da eleição para reitoria, realizada em agosto de 2022, permanece indefinida em meio a uma batalha judicial e troca de acusações entre situação e oposição
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 8 de setembro de 2023

Foto: Igor Sperotto

Impasse em torno da paridade dos votos dos estudantes mantém a Uergs na indefinição há quase um ano

Foto: Igor Sperotto

A eleição para a reitoria da Universidade do Estado do Rio Grande do Sul (Uergs) foi realizada em agosto de 2022 e, na contagem dos votos, decidida por uma pequena margem de votos, a favor da Chapa 1, de oposição.

O resultado foi judicializado pela Chapa 2, da situação, que questionou o peso dos votos dos alunos no pleito.

No dia 14 de novembro, a juíza da 7ª Vara da Fazenda Pública, Marilei Lacerda Menna, atendeu ao agravo de instrumento impetrado pela Chapa 2, determinando à Comissão Eleitoral da Uergs (CeUergs) a aplicação de fator de ajuste sobre o resultado da apuração.

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A decisão reduziu o peso dos votos discentes e alterou o vencedor que havia sido anunciado pela CeUergs em 9 de setembro. O recurso foi questionado pela CeUergs, porque a Chapa 1 não era parte no processo até então.

Na decisão judicial mais recente, no dia 12 de julho, os desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), a Chapa 2 foi declarada vencedora.

A decisão judicial seria homologada no dia 1º de setembro pelo Conselho Universitário (Consun), mas a reunião foi interrompida por um mandado de segurança da oposição. A Chapa 1 reiterou que seria a vencedora e requereu uma auditoria do pleito. No centro da questão, está a paridade dos votos dos estudantes que a depender dos próximos passos nesse processo, poderá decidir a eleição.

Paridade

O Estatuto da Uergs determina a paridade de votos, ou seja, peso de 33% para os votos de cada segmento da universidade: professores, funcionários e estudantes).

Um item após o outro de um mesmo parágrafo do Edital das Eleições dá margem a interpretações que geraram a guerra judicial entre as chapas.

No terceiro item do parágrafo 9, que trata da contagem dos votos, o Edital das Eleições expressa que na apuração de “cada segmento do colégio eleitoral será aplicado um fator de ajuste definido como o quociente entre os votos válidos e o total de votantes habilitados a votar”.

No quarto item consta que os candidatos à reitoria e à vice-reitoria de uma respectiva chapa serão considerados eleitos “pela maioria absoluta de votos, não computados os votos em branco e os nulos”.

“Em 2018, a Comissão Eleitoral questionou que o fator de ajuste tinha uma contradição porque o Estatuto fala em maioria absoluta dos votos e que o voto é paritário. O fato é que uma coisa não é contraditória à outra. Continua a ser paritário. Quando se aplica um fator de ajuste, o voto não deixa de ser paritário. O fator só está qualificando o voto”, afirma Leonardo Beroldt.

Protelação x virada de mesa

Último reitor eleito da Uergs com mandato que terminou em novembro de 2022, Beroldt se candidatou à reeleição e, após uma longa disputa judicial, viu a reunião de homologação de sua vitória suspensa por um mandado de segurança liminar concedida à chapa de oposição, que pede a auditoria.

“Há uma intenção clara e inequívoca de protelar o processo de homologação na instituição da admissão. É evidente isso. Uma hora é o fator de ajuste (paridade); aí já não é mais fator de ajuste, agora é o colégio eleitoral. Se for resolver o colégio eleitoral, qual vai ser o terceiro argumento?”, critica.

Luciano Andreatta, candidato a reitor da Uergs pela Chapa 1, de oposição, entende estar no seu direito de questionar o que considera uma “virada de mesa”. A referência é à judicialização das eleições pela Chapa 2 – diante da vitória que diz ter obtido se a mesma lógica de utilização do fator de ajuste na eleição de 2018 fosse seguida.

O ex-reitor e candidato da situação se defende ao dizer que a não utilização do fator relativo à paridade, em 2018, quando ele foi eleito, se deu por conta da Comissão Eleitoral que, ao entender que sua chapa teria ganho nos três segmentos, não aplicou o mecanismo da paridade.

O fator da discórdia

“Hoje, pensando friamente, olhando para trás, deveríamos ter insistido, mesmo tendo ganho as eleições, que o Consun respeitasse o Regimento, aplicasse o fator de ajuste naquela época. Agora se utilizam dessa situação de 2018 para dizer que lá nós não contestamos. Mas, quem tem que contestar é quem perdeu”, lamenta. Ele diz estar “sob constante ataques” por isso.

Andreatta contesta duramente: “Eu acho que é imoral silenciar quando se ganha e reclamar quando se perde. Mas é aquela história, moral e ética cada um tem a sua”, alfineta.

Em meio à troca de acusações, os alunos também se encontram divididos. Um grupo de estudantes, segmento que na apuração dos votos deu a vitória da Chapa 1, chegou a participar da invasão da reunião do conselho para exigir a homologação imediata da chapa de Beroldt.

“Estudante aceitando e dando apoio a fator de ajuste é no mínimo suspeito”, declara Luciana Albuquerque, graduanda do curso de Letras da Uergs e coordenadora do Conexão, projeto de extensão da Uergs que é um curso de educação popular que prepara alunos para o Enem.

Para ela, entre os estudantes há ainda quem está tentando entender como é que uma chapa que obteve 332 votos a mais não é eleita.

“A Chapa 1 obteve 332 votos de alunos e a chapa 2, um voto a mais de professor e 23 de servidores! O equilíbrio é desproporcional, anomalia”, protesta ela, que integra a organização de uma comissão eleitoral para poder fazer eleições e reativar o Diretório Central dos Estudantes da universidade. Luciana aproveita para denunciar que o DCE “foi implodido por dentro por um estudante”, agora já formado, que foi candidato à deputado estadual pelo PSDB e hoje é Cargo de Confiança no governo Eduardo Leite (PSDB).

Nada a declarar

Do outro lado, a também estudante de Letras da Uergs, Vitória Leonora Bolla Viegas, se recusou a conceder entrevista ao Extra Classe ao ser informada que, por prerrogativa constitucional, jornalistas devem garantir sigilo pedido por suas fontes.

Leonora queria saber quem repassou à reportagem o seu contato e diante do exposto disse: “se a fonte pediu sigilo e foi acatada, peço sigilo do meu, e nego a entrevista. Passar bem”.

Acontece que a estudante se colocou em situação pública ao ler um manifesto pró-homologação da vitória da Chapa 2, durante invasão de uma reunião do Consun protagonizada por apoiadores no último dia 28.

Diante da insistência, ela disse somente que reitera sua manifestação “lida conjuntamente”.

Luciana diz que votou em Beroldt em 2018 e lamenta o que considera “uma tentativa de desqualificar o Consun”.

Conquista

Para o Sindicato dos Professores do Estado (Sinpro/RS), as eleições na Uergs são uma conquista da comunidade acadêmica. “Essa indefinição e disputas internas não fortalecem a nossa Universidade Estadual e dão ainda mais fôlego para aqueles que apostam no desmonte e desvalorização das instituições públicas”, alertou a entidade.

Amarildo Pedro Cenci, diretor do Sinpro/RS e presidente da CUT/RS, entende que o que ocorre hoje na universidade está “fora do contexto da luta histórica que a gente construiu na Uergs”.

Complementando, ele afirma: “uma instituição que tem toda essa história e que já passou por tantas dificuldades tinha que, numa mesa de negociação, superar as divergências e contendas que surgem e não judicializar tudo”.

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