EDUCAÇÃO

Seduc frustra censura a livro de Jeferson Tenório em Santa Cruz do Sul

Após polêmica nacional a partir de vídeo de diretora de escola estadual que pede retirada do livro O avesso da pele das bibliotecas, Seduc mantém obra nas escolas e anula decisão da 6ª CRE
Por César Fraga / Publicado em 4 de março de 2024
Seduc frustra censura a livro de Jeferson Tenório em Santa Cruz do Sul

Foto: Carlos Macedo / Cia Das Letras/Divulgação

Livro de Jeferson Tenório (foto) será mantido nas bibliotecas das escolas de Santa Cruz do Sul pela Seduc

Foto: Carlos Macedo / Cia Das Letras/Divulgação

A tentativa de censura ao livro ganhador do Prêmio Jabuti em 2021 O avesso da pele, do escritor Jeferson Tenório, foi finalmente frustrada pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc).

Poucos dias depois do caso ganhar o noticiário nacional a partir do pedido da 6ª Coordenadoria Estadual de Educação (CRE) para que a obra não fosse distribuída nas bibliotecas e nem aos estudantes das escolas da região de Santa Cruz do Sul (RS) a Seduc emitiu uma nota reafirmando que o livro será sim usado e distribuído na rede pública estadual, inclusive nas escolas sob abrangência da 6ª CRE.

No entendimento da Seduc Para não há qualquer orientação para a retirada da obra das bibliotecas, já que faz parte Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), do Ministério da Educação (MEC).

Na sexta-feira, 1º de março, um ofício assinado pelo coordenador da 6ª CRE Luiz Ricardo Pinho de Moura, em repercussão a um vídeo viralizado pela diretora da Escola Estadual Ernesto Alves (de Santa Cruz do Sul), Janaina Venzon, em que criticava a obra, orientava a retirada da obra das bibliotecas. A diretora criticou o livro por conter, segundo ela, “palavras de baixo calão” e descrever cenas de sexo.

Conforme a nota da Seduc: “o uso de qualquer livro do PNLD deve ocorrer dentro de um contexto pedagógico, sob orientação e supervisão da equipe pedagógica e dos professores. A 6ª Coordenadoria Regional de Educação vai seguir a orientação da secretaria e providenciar que as escolas da região usem adequadamente os livros literários”.

“Meu livro é sobre racismo e não sobre sexo”, diz o autor. Jeferson Tenório sobre o caso, questionou o fato de as palavras de “baixo calão” e os atos sexuais do livro causarem mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras, que são o tema O escritor ainda chamou a atenção para as palavras de “baixo calão” e os atos sexuais do livro causarem mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras, que são forma o tema principal da obra. “Não vamos aceitar qualquer tipo de censura ou movimentos autoritários que prejudiquem estudantes de ler e refletir sobre a sociedade em que vivemos”, afirma o escritor.

A editora Companhia das Letras, responsável pela publicação do livro destacou que a obra, ao ser avaliada pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD 2021) para ser trabalhada no Ensino Médio, foi aprovado por uma banca de educadores, especialistas e mestres em literatura e língua portuguesa juntamente com outros 530 títulos.

Ainda segundo a Cia das Letras, antes do livro chegar à escola em questão, ainda precisou passar por aprovação da própria diretora, “que assinou o documento de ata de escolha da obra e agora contesta o conteúdo do livro”.

A editora defende que esses dados são transparentes e públicos. “A retirada de exemplares de um livro, baseada em uma interpretação distorcida e descontextualizada de trechos isolados, é um ato que viola os princípios fundamentais da educação e da democracia, empobrece o debate cultural e mina a capacidade dos estudantes de desenvolverem pensamento crítico e reflexivo”, afirma a Cia das Letras em nota.

A Associação Mães e Pais pela Democracia (AMPD) chegou a apresentar uma representação no Ministério Público Federal (MPF) sobre o caso.

Segundo Aline Kerber, presidente de honra da entidade, a gestão democrática do ensino público é princípio basilar e o caso fere os artigos 205 e 206 da Constituição Federal, “sobretudo a liberdade de aprender e ensinar, a gestão democrática, o pluralismo de ideias e os direitos humanos”.

Na representação, a Associação pede que a diretora Janaina Venzon seja responsabilizada pelo vídeo, assim como a deputada estadual Kelly Moraes (PL) por tê-lo republicado no Instagram. A entidade pede ainda ao MPF que o vídeo seja retirado das redes sociais imediatamente e que os livros sejam devolvidos à biblioteca da Escola Estadual Ernesto Alves “com uma campanha que mitigue os danos de autocensura nas escolas da cidade e do RS”.

Por fim, a Associação Mães e Pais pela Democracia (AMPD) solicitou que a 6ª Coordenadoria Regional de Educação e Governo do Estado do RS devolvam os livros da “suposta” retirada das bibliotecas de Santa Cruz e expliquem o equívoco à população.

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