GERAL

Deputados albergueiros podem perder mandatos

Por César Fraga / Publicado em 22 de novembro de 2006

Poucas semanas antes do pleito do primeiro turno, a Justiça Eleitoral realizou uma blitz nos albergues mantidos por deputados gaúchos, onde encontrou farto material de campanha. Pouco antes da ação, a Justiça pediu para nossa editorachefe, Valéria Ochôa, exemplares do jornal Extra Classe, cuja reportagem de capa era intitulada ‘Trocam-se votos por favores’, de maio de 2005. A Justiça informou acerca da ação que ainda ocorreria e pediu sigilo, ao que acatamos para não prejudicar as investigações. Na matéria, as repórteres Liège Copstein e Tânia Meinerz (fotógrafa) mergulharam no universo dos albergues e da política pautada pelo assistencialismo e testemunharam práticas feudais em pleno século XXI. Esse fenômeno resulta do vácuo deixado pelo Estado na área da saúde e preenchido pelos políticos que vêem, na miséria alheia, a possibilidade de angariar votos e obter vantagens eleitorais.

Mas dito isso, é preciso registrar que o Ministério Público Eleitoral do Rio Grande do Sul (MPE) ajuizou sete representações por captação ilícita de votos contra nove candidatos ao pleito deste ano, pedindo aplicação de multa e cassação do diploma. São eles os deputados federais Pompeo de Mattos (PDT) e Osvaldo Biolchi (PMDB) e os deputados estaduais Vilson Covatti (PP), Iradir Pietroski e Aloísio Classmann (PTB), Márcio Biolchi (PMDB), Adroaldo Loureiro, Gerson Burmann e Giovani Cherini (PDT), todos muito bem votados e vários deles citados e ouvidos em nossa reportagem.

Todos mantêm pousadas para hospedar pessoas (eleitores) que viajam a cidades como Porto Alegre, Passo Fundo, Ijuí, Santa Maria e Santa Rosa, geralmente em busca de tratamento de saúde. De acordo com as informações da Procuradoria do MPE, a vinculação entre os candidatos e esse tipo de assistência é notória e, em muitos casos, foi reforçada durante a campanha eleitoral. Em várias dessas pousadas, operações de busca e apreensão autorizadas pela Justiça Eleitoral encontraram farto material de campanha. O exame desse material permitiu ao MPE constatar que as pousadas são “verdadeiras indústrias de votos”.

Segundo trechos do texto que compõe as representações, o caráter assistencial dos estabelecimentos encobria seu uso eleitoral, fora o fato de ser prestado em plena campanha, o benefício era utilizado como instrumental desta. Entrevistas com funcionários e hóspedes das pousadas, gravadas em vídeo pelo MPE, não deixam dúvidas quanto à motivação da assistência e a seu efeito sobre a imagem dos deputados aos olhos dos beneficiados. “Se você vai me fazer o bem, o que vou fazer por você?”, pergunta um dos hóspedes.

ABUSO – Todas as ações ajuizadas até o dia 18 de outubro no Tribunal Regional Eleitoral/RS baseiam-se no artigo 41-A, introduzido na Lei 9504/97 em 1999, que trata da captação ilegal de votos. Segundo o procurador regional eleitoral João Heliofar de Jesus Villar, o que se protege com esse dispositivo é a vontade livre e consciente do eleitor. Conforme o procurador,
as condutas também podem propiciar o ajuizamento de ações por abuso do poder econômico, que fere a normalidade e a legitimidade das eleições. “Se o parlamentar presta assistência que beneficia milhares de eleitores e vincula esse trabalho ao seu nome, naturalmente está usando seu poder econômico de modo indevido e afetando a lisura do processo eleitoral”, explica.

Procuradores pedem cassação
A Justiça começou a ouvir, no dia 19 de outubro, os deputados denunciados pelo Ministério Público Eleitoral (MPE). Os procuradores pedem a cassação do registro das candidaturas dos envolvidos. O primeiro a prestar depoimento foi o deputado estadual reeleito Giovani Cherini. Deputado mais votado do PDT, com 64.523 votos, Cherini mantém três albergues localizados em Porto Alegre, Santa Maria e Passo Fundo. Na casa da capital e nas do interior, a Justiça encontrou, no dia 19 de setembro, material de campanha do deputado. Ele justificoou que há 12 anos presta um “trabalho de solidariedade” e acha que não cometeu crime algum.

O procurador regional eleitoral substituto Vitor Hugo Gomes da Cunha, responsável pelas denúncias, acredita que os albergues seriam irregulares. Conforme declaração dele ao jornal Zero Hora no dia 20 de outubro, há problemas, inclusive, fora da época de campanha, o que confirma tese levantada pelo Extra Classe em 2005, mais de um ano antes do episódio. Segundo o procurador, caso a Justiça acate o pedido do MP, os votos dos deputados eleitos não deverão ser anulados. Contudo, a composição da Assembléia e da Câmara dos Deputados poderia mudar. Se condenados, os deputados podem recorrer da decisão.

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