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Pesquisadores encontram vestígios de sangue em escavações no DOI-Codi em São Paulo

Investigação arqueológica encontra indícios da passagem das vítimas da repressão pelo local, como inscrições nas paredes, objetos pessoais e registros em papel
Por Gilson Camargo / Publicado em 14 de agosto de 2023
Escavações arqueológicas buscam vestígios da repressão no DOI-Codi

Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

Escavações no prédio onde funcionou o DOI-Codi, em São Paulo, reúne pesquisadores de três universidades públicas

Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

Escavações arqueológicas que são feitas por pesquisadores ligados a três universidades públicas desde o dia 2 de agosto, na sede do antigo Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo, para investigar crimes cometidos pelo Exército durante a ditadura militar encontraram material inicialmente identificado como vestígios de sangue humano.

Os pesquisadores encontraram vestígios que, pelos testes iniciais com Luminol, seriam de sangue em duas salas do primeiro andar. Também foi descoberta uma inscrição, com um calendário, no banheiro do segundo andar do prédio. O Luminol é uma substância que reage a todo material que contenha ferro, como a hemoglobina. No entanto, como essa reação também pode ser provocada por materiais não biológicos, os fragmentos irão passar por exames de laboratório na próxima fase da pesquisa.

Escavações arqueológicas buscam vestígios da repressão no DOI-Codi_achados

Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

Foram encontrados cerca de 400 objetos relacionados à tortura, vestígios de sangue humano e fragmentos ósseos

Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

Foram localizadas na sede do antigo órgão de repressão entre 350 a 400 objetos. No espaço onde os presos sequestrados pelos agentes eram fichados, foram encontrados um vidro de tinta para caneta e carimbo.

A investigação se encerra na tarde desta segunda-feira, 14, no antigo DOI-CODI. Na sede do órgão ligado ao Exército, ocorreram torturas e mortes de opositores da ditadura militar (1964-1985).

No local, os pesquisadores encontraram vestígios que, pelos testes iniciais com Luminol, podem ser de sangue em duas salas do primeiro andar.

O Luminol é uma substância que reage a todo material que contenha ferro, como a hemoglobina. No entanto, como essa reação também pode ser provocada por materiais não biológicos, os fragmentos irão passar por exames de laboratório na próxima fase da pesquisa.

Também foi descoberta uma inscrição, com um calendário, no banheiro do segundo andar do prédio e entre 350 a 400 objetos associados à repressão. No espaço onde os presos políticos eram fichados, as escavações revelaram um vidro de tinta para caneta e carimbo.

Pesquisadores encontram vestígios de sangue em escavações no DOICodi em São Paulo

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

Escavações são o resultado da atuação do GT Memorial DOI-Codi, que envolve organizações de defesa dos direitos humanos, o MPSP e UPPH

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

“A materialidade do edifício explica como a repressão aconteceu naquele espaço. Estudando melhor podemos descobrir tudo o que foi modificado no edifício ou então acrescentado nele para torná-lo um lugar mais repressivo”, explica a doutora em história Fernanda Lima.

Fernanda integra o Grupo de Trabalho (GT) DOI-Codi, formado por arqueólogos e historiadores da Universidade Estadual de 10 instituições, dentre elas a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Os trabalhos contam com visitas guiadas ao espaço, no bairro da Vila Mariana, zona sul de São Paulo, mesas de discussão sobre a memória do período e oficinas de formação de estudantes e professores.

Pesquisadores encontram vestígios de sangue em escavações no DOICodi em São Paulo_5

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

Acervo coletado na escavação será mostrado em exposições

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

As escavações são o resultado da atuação do GT Memorial DOI-Codi, que envolve organizações de defesa dos direitos humanos, o Ministério Público do Estado de São Paulo e a Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico (UPPH) do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat).

O objetivo do trabalho é aplicar as pesquisas arqueológica e histórica na identificação de vestígios materiais e na compreensão da memória relacionada ao espaço e ao período.

“Esse trabalho lança as bases para pensarmos, futuramente, como poderia ser um memorial desse período e como essa história pode ser contada”, explica Deborah Neves, historiadora da UPPH do Condephaat e coordenadora do projeto.

Os pesquisadores buscam identificar indícios da passagem das vítimas da repressão pelo local, como inscrições nas paredes, objetos pessoais e registros em papel.

“As pessoas resistiram bravamente à repressão. Essa resistência tem materialidade, não só nos corpos, mas nos escritos e objetos que estamos buscando”, destaca Aline Carvalho, professora da Unicamp e pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) que atua no projeto.

Conhecer para não repetir

Pesquisadores encontram vestígios de sangue em escavações no DOICodi em São Paulo

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

A professora da Unicamp e participante do projeto Aline Carvalho: “manter viva a memória do trauma da ditadura militar para que isso nunca se repita”

Foto: Felipe Bezerra/ Unicamp

Criado em 1969 por uma parceria entre o Exército e a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, o DOI-Codi foi um espaço marcado pela violação dos direitos humanos.

Estima-se que mais de 7 mil pessoas tenham sido torturadas no local.

O complexo de cinco prédios foi tombado pelo Condephaat em 2014, a fim de conservar as instalações e possibilitar que pesquisas históricas gerem conhecimentos sobre a repressão política da época.

“O DOI-Codi foi o principal órgão de repressão no Brasil, inclusive inspirou outros órgãos do tipo na América do Sul. Precisamos conhecê-lo de fato para compreender sua importância para além do que já sabemos”, argumenta Deborah.

Além das escavações, entrevistas e coletas de depoimentos foram realizadas para recuperar a história de quem passou pelo local e direcionar as investigações forenses.

“A arqueologia é fundamental, mas não é feita com base apenas na intuição. Nossa ideia é manter viva a memória do trauma da ditadura militar para que isso nunca se repita. As ciências contribuem com um arcabouço de métodos de análise e nos ajudam a produzir informações para compreendermos esse passado e construirmos percepções para uma sociedade democrática”, pontua Aline.

Após as escavações, serão realizadas exposições com o acervo coletado em diversos espaços, incluindo a Unicamp.

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