JUSTIÇA

Terroristas ou não, eis a questão

O que pensam e argumentam juristas sobre a classificação dos atos antidemocráticos ocorridos na Praça dos Três Poderes, em Brasília, como sendo terrorismo
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 11 de janeiro de 2023
Terroristas ou não, eis a questão

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Palácio do Supremo Tribunal Federal ficou destruído após atos terroristas no dia 8 de janeiro

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Mais do que um debate semântico, chamar os responsáveis pela vandalização das sedes dos Três Poderes de terroristas ou não tem consequências. Apesar das divergências, um ponto unifica juristas: punições exemplares são necessárias.

Um assunto une polos extremos no campo da política e começa a despontar ainda que timidamente pós atos de vandalismo protagonizados por bolsonaristas no último domingo, 8, em Brasília. Os participantes do caos que tomou conta da praça dos Três Poderes podem ser chamados de terroristas ou não? Juristas, mesmo dentro do campo progressista, divergem e pontuam questões a serem levadas em conta.

Gisele Guimarães Cittadino, professora e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), fundadora da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e integrante do Grupo Prerrogativas, entende que não.

Terroristas ou não, eis a questão

Foto: Divulgação/Prerrogativass

Gisele Guimarães Cittadino, professora e coordenadora do Programa de Pós-Graduação da PUC-Rio

Foto: Divulgação/Prerrogativass

Para Gisele, os atos ocorridos em Brasília não se enquadrariam como terroristas se “considerarmos a lei brasileira sobre o tema, de 2016”.

Segundo ela “se ocorreu um tipo de ‘terror social’, com grave dano ao patrimônio público, nada disso foi motivado por ‘xenofobia, discriminação ou preconceito’, conforme expresso”.

No entendimento da professora, as punições necessárias devem ocorrer por tentativa de desestabilizar o estado de direito.

“Não são terroristas. E isso é muito importante, pois em um país com forte tradição autoritária, não podemos correr o risco de associar movimentos sociais em geral, que podem ser disruptivos em determinadas circunstâncias, a movimentos terroristas”, pondera.

Terroristas políticos 

Já para o seu colega no Prerrogativas, o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, a resposta é sim.

“São terroristas. Eu não tenho nenhuma dúvida”, afirma ao ressaltar que o Brasil está diante de um fato “gravíssimo onde houve uma claríssima tentativa de derrubar o governo”.

Notório advogado de Brasília, Kakay diz que ao tratar a depredação na Praça dos Três Poderes como uma tentativa de golpe de Estado, fica evidente que o ocorrido foi um ato de terror político.

“É claro que se pode argumentar que, na realidade, esses que estão lá (presos) são apenas pessoas que estavam na esplanada sem ter a dimensão do que faziam. Aí é uma discussão de caso a caso quando e se tiver um processo”, diz.

Para ele, conhecido por advogar para políticos, grandes empresários e celebridades, as sedes dos Três Poderes foram ocupadas de uma forma violenta por vândalos que não só depredaram tudo como roubaram uma infinidade de coisas. “Armas, inclusive”, acentua.

Com sua ironia característica, discorre o advogado, “a ocupação das sedes foi mais com vandalismo do que com animus de dominação; talvez pela baixíssima densidade intelectual de cada um que foi lá rasgar um Di Cavalcanti, defecar no Supremo Tribunal e agredir os símbolos da República”.

Isso, continua, não impede que se faça uma análise técnica e de taxar os participantes da vandalização como promotores de terrorismo.

Golpe de Estado em curso

Terroristas ou não, eis a questão

Foto: Acervo Pessoal

Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay

Foto: Acervo Pessoal

De acordo com Kakay, no direito penal a determinação das responsabilidades se verá caso a caso. “Cada pena é dada de acordo com a responsabilidade individual apurada. Você vai ter aqueles que foram os mentores, os financiadores, aqueles que foram recrutados, que receberam para promover o tumulto.

“A denúncia, quando vier e espero que venha, tem que individualizar as condutas. É um trabalho árduo aí”, explica.

Acostumado a dar assistência para seus clientes com entusiasmo, o criminalista registra que “a discussão dos casos concretos para que seja feito a ampla defesa vai se dar no inquérito”.

Com uma postura crítica e indignada Kakay lembra que ainda “não se chegou aos financiadores mais expressivos, nem à membros das Forças Armadas” que, entende, acabaram se comprometendo com a barbárie que ocorreu em Brasília.

Por isso, para ele, a tentativa de golpe do dia 8 foi frustrada, mas não totalmente debelada.

“Nós temos que tratar isso como um golpe de Estado em curso para prender imediatamente os financiadores e os militares, ainda que de alta patente, que estão por trás. Essa é a verdadeira responsabilização que deve ser feita e é isso que a sociedade espera”, conclui.

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