A inclusão, o direito à aprendizagem e a omissão das instituições
Foto: Igor Sperotto
Foto: Igor Sperotto
Um dos maiores desafios dos docentes na atualidade é a prática da inclusão com toda a sua complexidade, tanto na educação básica quanto no ensino superior, atendendo os preceitos da legislação vigente e diante de um quadro de omissão de boa parte das instituições de ensino.
Como professores, sabemos quais são nossos deveres, porém, também sabemos o quanto essas obrigações demandam em horas de trabalho.
Além de prepararmos as atividades avaliativas gerais, ou seja, atividades que abarquem a maioria dos estudantes das turmas, precisamos construir instrumentos avaliativos adaptados.
Para cada prova, uma nova adaptação. A cada teste, outro teste; e podem ser dois ou mais, pois isso dependerá de quantos alunos com deficiência estarão na mesma série.
Somam-se a isso ainda trabalhos, atividades diversas, pareceres, plano de desenvolvimento individual, enfim, uma carga significativa de tarefas que demandam tempo em sua elaboração. Um trabalho extraclasse na maioria das vezes não remunerado.
Da educação infantil ao ensino médio, os professores das redes pública e privada de ensino são exigidos nas demandas estabelecidas pelas legislações e pelas direções/coordenações escolares.
Legislação
É importante lembrar que a legislação sobre o tema vem de longa data. Só a título de exemplo, em 1961, sob o governo de João Goulart, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 4.024) já tratava sobre educação para as crianças com deficiência, na época chamadas de “excepcionais” (termo em desuso).
Houve nova LDB no ano de 1971, assim como foi incluído na nova Constituição Federal em 1988 o tema da educação para pessoas com deficiência, em seu artigo 208, bem como a ratificação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência pelo Decreto Legislativo nº 186, em 9 de julho de 2008.
Atualmente, a mais importante legislação sobre inclusão é a Lei 13.146, de 6 de julho de 2015, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
No Rio Grande do Sul, o Conselho Estadual de Educação (CEEd/RS) divulgou parecer no ano de 2022, orientando a rede pública e privada sobre a instituição de normas complementares para a oferta da educação especial no Sistema Estadual de Ensino.
A legislação sobre o tema, portanto, está consolidada. As diretrizes estão postas. As orientações estão claras. Hoje, discute-se sobretudo o método, ou seja, como a prática inclusiva de fato está sendo inclusiva.
O fazer em sala de aula é o desafio para os principais profissionais da educação: os professores, conforme lembra o professor HTS Lima, em O papel do professor no contexto inclusivo: uma reflexão a partir da teoria de subjetividade.
Direito à aprendizagem
Sendo assim, ao aluno com deficiência é garantido o direito de fazer parte do processo educacional, proporcionando a ele as mais adequadas condições de ensino e aprendizagem.
A ação para que isso se torne possível é encargo dos professores, os quais têm o dever de implementar práticas pedagógicas que garantam a todos os alunos o desenvolvimento escolar.
Cabe aos professores a elaboração das atividades adaptadas, de práticas e de dinâmicas em sala de aula que sejam coerentes com as capacidades e os limites cognitivos dos estudantes deficientes.
Faz parte ainda da nossa labuta pedagógica o planejamento das atividades, a avaliação com olhar sensível aos limites de cada aluno e a produção de pareceres e relatórios destinados aos diferentes setores escolares quando são solicitados, demonstrando o avanço ou não da aprendizagem dos alunos.
Dessa forma, os professores têm a mais importante das tarefas inclusivas, qual seja, o pleno desenvolvimento educacional do discente, respeitados os seus limites, usando de práticas e de estratégias para que a aprendizagem seja consolidada.
Valorização, apoio e orientação
Sendo assim, do que precisam os educadores?
Do apoio das direções, sobretudo de auxílio na formação docente, pois a criação de métodos educacionais voltados para a inclusão nem sempre é desenvolvida nas licenciaturas.
Muitos professores chegam em sala de aula ávidos por fazer o seu trabalho, porém, ao se depararem com a situação de alunos de inclusão por vezes carecem de exemplos ou técnicas que possam de fato auxiliar para a melhor adequação das atividades ao aluno com deficiência.
Os educadores precisam de apoio das direções para manter uma estrutura de ajuda material e humana para uma efetiva prática educacional inclusiva e, muito importante, precisam que o trabalho extra seja remunerado. Este último item, sem dúvida, é um dos mais reivindicados pelos professores.
É dever das instituições escolares o estabelecimento de cronogramas de reuniões e conversas para capacitação de seus profissionais para o desempenho satisfatório e a boa qualidade no manejo dos estudantes com deficiência.
Não basta apenas enviar e-mails com manuais ou com a descrição das características dos alunos; é necessário que as coordenações reúnam os professores e orientem a conduta, o saber fazer, enfim as atividades complexas e necessárias para que os estudantes sejam atendidos com qualidade.
As demandas de sala de aula exigem do professor o mais adequado manejo em situações em que os alunos com deficiência carecem da inserção adequada nas relações com seus colegas.
Essas situações abarcam desde uma simples questão em uma aula expositiva, até a complexidade de fazer trabalhos em grupo.
A inserção e as tarefas destinadas ao aluno com deficiência dentro de grupos de trabalhos demandam do professor sensibilidade e cuidado, pois inserir o aluno com deficiência de forma precipitada pode gerar mais exclusão do que inclusão. Para tanto, o apoio de outros profissionais também se faz necessário nesses momentos. Daí a importância de equipes multidisciplinares (monitores, psicopedagogos e psicólogos escolares, entre outros) que deem suporte no desenvolvimento das aulas.
As exigências legais se estabeleceram ao longo das décadas no intuito de exigir que a inclusão seja uma realidade, não discurso ou um fazer displicente.
Aos professores cabem as tarefas de planejar, atuar, educar e avaliar todos os alunos. Reiteramos: todos os alunos.
Nossa labuta tornou-se maior e precisamos reconhecer o esforço desses profissionais, principalmente remunerando de forma justa o seu trabalho. Se a cidadania é para todos, isso deve incluir os professores.
Marcos Paulo Tonial é professor, Mestre em História e diretor Sinpro/RS