OPINIÃO

10 perguntas para Sergio Moro

Por Moisés Mendes / Publicado em 14 de março de 2018

10 perguntas para Sergio Moro

Not available

Not available

O juiz Sergio Moro parece disposto a enfrentar a imprensa, depois de conceder entrevistas avulsas para amigos e simpatizantes do golpe. Moro nunca foi submetido a uma entrevista de verdade (que não é um interrogatório), com perguntas que devem ser feitas ao homem consagrado pela direita como o maior caçador de corruptos.

Dizem que a entrevista pra valer será dia 26, no programa Roda Viva, da TV Cultura. Sou cético. Duvido que entrevistadores da grande imprensa apertem o juiz, até porque ele vai argumentar sempre que não fala sobre questões envolvidas nos processos. É só desculpa.

O programa deve ser uma conversa genérica de compadres com um simplório incapaz de reflexões mais complexas. Por isso, fiz aqui uma lista de 10 perguntas que dificilmente serão feitas a Sergio Moro. E que de alguma forma já valem como resposta.

1 – O advogado Rodrigo Tacla Duran, réu da LVava-Jato, mora na Espanha como foragido. Duran diz que o também advogado Carlos Zucollotto faz parte da Panela de Curitiba, um grupo de advogados do Paraná com influência na Lava-Jato. Essa panela conduziria negociações no mercado paralelo para candidatos a delator e ganharia comissão dos delatores para o encaminhamento de acordos. O que o senhor sabe da Panela de Curitiba?

2 – Carlos Zucolotto, o denunciado por Tacla Duran, é seu amigo íntimo, foi padrinho do seu casamento e foi sócio da sua mulher, Rosângela Moro. A imprensa divulgou que o Ministério Público, ao investigar Tacla Duran, omitiu nos autos dados da Receita sobre pagamentos do próprio Tacla Duran ao escritório de advocacia do qual sua mulher era sócia. O senhor vê essa relação como algo normal?

3 – Em nota a respeito da denúncia de Tacla Duran, o senhor afirma ser “lamentável que a palavra de um acusado foragido da Justiça brasileira seja utilizada para levantar suspeitas infundadas sobre a atuação da Justiça”. Como o senhor preferencialmente se baseia na palavra de bandidos acusados, denunciados e processados, que oferecem subsídios decisivos para a formulação de suas deliberações na Lava-Jato, alguns mafiosos são mais respeitáveis do que outros, e nesse caso Tacla Duran não merece consideração como delator?

4 – Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, foi réu confesso da Lava-Jato, ao admitir que roubou e depositou na Suíça US$ 98 milhões. Uma das suas missões como juiz especial seria a de descobrir hierarquias e conexões de servidores da Petrobras com políticos, como fez com gente do PT e do PMDB. Porque a Lava-Jato nunca descobriu para quem Barusco trabalhou durante sete anos de governo de Fernando Henrique Cardoso? Por que Barusco (já solto) é até hoje o único ladrão avulso e sem chefe da Lava-Jato?

5 – O senhor grampeou o telefone do ex-presidente Lula e acabou grampeando a presidente Dilma Rousseff. A gravação da conversa entre os dois foi enviada pelo senhor, como se fosse conteúdo de reportagem, à TV Globo. O falecido ministro Teori Zavascki o repreendeu formalmente, porque o senhor cometeu um grave delito. Algum tempo depois o senhor admitiu o erro. Mais tarde, voltou a dizer que agiu em nome do interesse público. O senhor é fornecedor de informações especiais para a Globo, apenas para a Globo, ou também para outros órgãos de imprensa?

6 – Juristas brasileiros e estrangeiros denunciam que a sua tática das prisões preventivas intermináveis (para obtenção de delações) é um recurso primitivo e cruel, fora do que seria razoável no Direito em qualquer país democrático, mesmo que possa ser legal (porque não há prazo limite para prisões preventivas). O senhor continua defendendo esse método e o considera válido para todos os casos, ou apenas para processos que envolvem a sua participação como juiz especial de um caso especial?

7 – Por que o senhor soltou o doleiro Alberto Youssef, condenado a 121 anos de prisão (cumpriu apenas três), se ele era o principal delator da Lava-Jato e o maior operador do esquema de lavagem de dinheiro? Que serviços tão decisivos o doleiro prestou, além das delações (que outros tantos prestaram), para estar em liberdade, mesmo sendo reincidente, desde o episódio Banestado, no qual o senhor também atuou, e sabendo-se que Youssef não cumpriu o acordo de delação naquele caso? Quanto do dinheiro roubado foi devolvido pela Lava-Jato ao doleiro Youssef como compensação por serviços prestados?

8 – O senhor escreveu carta à Folha de S. Paulo, sugerindo ao jornal que censurasse o físico Rogério Cerqueira Leite. O cientista, um dos mais respeitados intelectuais brasileiros, dos mais antigos colaboradores do jornal e membro do seu conselho editorial, escrevera artigo criticando o “esquema fanático” da Lava-Jato. O senhor mantém a posição de quem tem o direito de recomendar a censura de um pensador consagrado simplesmente porque este faz críticas ao seu trabalho? O senhor se considera inatacável por sua missão de juiz especial?

9 – Os jornais já noticiaram que o senhor irá se retirar temporariamente da magistratura, para estudar nos Estados Unidos. Se a sua missão como caçador de corruptos é tão importante e pouco questionada no Brasil, por que, na escolha de prioridades, o senhor opta pelos estudos, ao invés de levar adiante uma operação especial ainda pela metade, que até agora poupou tucanos e bandidos da direita? O senhor repetiria a atitude do ministro Joaquim Barbosa, que condenou um grupo de petistas e afastou-se prematuramente do Supremo, quando o Brasil esperava que ele participasse depois da caçada a tucanos (mesmo que o Supremo não tenha caçado tucano algum)?

10 – O senhor é, como juiz especial, ídolo da direita e da extrema direita. Qual é o seu sentimento, como juiz especial, em relação a essa adoração por parte de pessoas que têm desprezo pela discordância, pela diversidade, pela democracia e pela própria Justiça?

(Como pergunta reserva, esta pequena indagação que o brasileiro não-golpista se faz a todo momento: por que o senhor parou de frequentar eventos de tucanos e de tirar fotos, sempre sorridente, ao lado destes tucanos?)

Moisés Mendes é jornalista e escreve quinzenalmente para o jornal Extra Classe.

Comentários