POLÍTICA

STF suspende portaria sobre trabalho escravo

Tentativa de abrandamento da fiscalização do trabalho análogo à escravidão visava a agradar ruralistas e angariar votos na Câmara para barrar segunda denúncia contra o presidente
Da Redação* / Publicado em 24 de outubro de 2017
Rosa Weber determinou que a suspensão vigore até que o caso seja apreciado em caráter definitivo pelo plenário do STF. A ministra é relatora de outras duas ações contra a portaria

Foto: Carlos Moura/SCO/STF

Rosa Weber determinou que a suspensão vigore até que o caso seja apreciado em caráter definitivo pelo plenário do STF. A ministra é relatora de outras duas ações contra a portaria

Foto: Carlos Moura/SCO/STF

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar (decisão provisória) suspendendo os efeitos da Portaria 1.129, do Ministério do Trabalho, que alterou a conceituação de trabalho escravo para fins de concessão de seguro-desemprego.

A decisão da ministra foi dada em uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) aberta pela Rede na semana passada. Rosa Weber acatou os argumentos do partido de que a portaria abre margem para a violação de princípios fundamentais da Constituição, entre eles, o da dignidade humana, o do valor social do trabalho e o da livre inciativa.

Para a ministra, ao “restringir” conceitos como o de jornada exaustiva e de condição análoga à de escravo, “a portaria vulnera princípios basilares da Constituição, sonega proteção adequada e suficiente a direitos fundamentais nela assegurados e promove desalinho em relação a compromissos internacionais de caráter supralegal assumidos pelo Brasil e que moldaram o conteúdo desses direitos”.

“A conceituação restritiva presente no ato normativo impugnado divorcia-se da compreensão contemporânea [sobre o trabalho escravo], amparada na legislação penal vigente no país, em instrumentos internacionais dos quais o Brasil é signatário e na jurisprudência desta Suprema Corte”, argumenta a ministra.

Rosa Weber determinou que a suspensão vigore até que o caso seja apreciado em caráter definitivo, mais aprofundadamente, o que deve ser feito pelo plenário do STF. A ministra também é relatora de outras duas ações contra a portaria, mais uma ADPF, aberta pela Confederação Nacional dos Profissionais Liberais, e uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada segunda-feira (23) pelo PDT. O Ministério do Trabalho informou que irá recorrer por intermédio da Advocacia Geral da União (AGU).

RETROCESSO – No dia 16 de outubro, o Ministério do Trabalho publicou no Diário Oficial da União (DOU) a Portaria 1.129, assinada pelo ministro Ronaldo Nogueira, na qual dispõe sobre os conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas de escravo, com o objetivo de disciplinar a concessão de seguro-desemprego a pessoas libertadas. A portaria abranda o conceito de trabalho escravo ao afirmar que apenas será considerada escravidão “a submissão do trabalhador sob ameaça de castigo, a proibição de transporte obrigando ao isolamento geográfico, a vigilância armada para manter o trabalhador no local de trabalho e a retenção de documentos pessoais”.

Na prática, o governo Temer tenta fragilizar as regras da fiscalização do trabalho análogo à escravidão por exigência da bancada ruralista da Câmara. Os deputados que defendem os interesses do agronegócio ameaçavam votar pelo prosseguimento da segunda denúncia da Procuradoria-geral da República em que Temer é acusado de organização criminosa e obstrução à justiça. A denúncia foi rejeitada na Comissão de Constituição e Justiça no dia 17 de outubro e agora será votada em plenário.

Além de acrescentar a necessidade de restrição da liberdade de ir e vir para a caracterização da jornada exaustiva, por exemplo, a portaria também aumentou a burocracia da fiscalização e condicionou à aprovação do ministro do Trabalho a publicação da chamada lista suja, com os nomes dos empregadores flagrados reduzindo funcionários a condição análoga à escravidão.

A portaria gerou reações contrárias de entidades como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

*Com a Agência Brasil e STF.

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