POLÍTICA

Governadores reagem à tentativa de chantagem

Em carta ao presidente Temer, nove estados do Nordeste repudiam troca de financiamentos de bancos públicos por votos favoráveis à reforma da Previdência
Por Gilson Camargo* / Publicado em 27 de dezembro de 2017
Ministro da articulação de Temer, Marun condicionou liberação de recursos aos estados em troca de votos pela reforma da Previdência

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Ministro da articulação de Temer, Marun condicionou liberação de recursos aos estados em troca de votos pela reforma da Previdência

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Em carta pública encaminhada ao Palácio do Planalto nesta quarta-feira, 27, governadores de nove estados do Nordeste repudiaram as declarações do ministro da articulação política Carlos Marun (PMDB-MS), que condicionou a liberação de recursos federais ou financiamentos junto a bancos públicos aos estados a votos pela aprovação da reforma da Previdência. Na terça-feira, 26, Marun afirmou que financiamentos da Caixa Econômica Federal (CEF) são “ações de governo” e que esperava “reciprocidade” dos governadores.

Na carta, os governadores pedem que Temer “reoriente” seus ministros para evitar práticas “criminosas”. “Protestamos publicamente contra essa declaração e contra essa possibilidade e não hesitaremos em promover a responsabilidade política e jurídica dos agentes públicos envolvidos, caso a ameaça se confirme”, alerta o documento, no qual os governadores prometem acionar política e judicialmente os agentes públicos envolvidos, caso a “ameaça” se confirme. “Vivemos em uma Federação, cláusula pétrea da Constituição, não se admitindo atos arbitrários para extrair alinhamentos políticos, algo possível somente na vigência de ditaduras cruéis. Esperamos que o presidente Michel Temer reoriente os seus auxiliares, a fim de coibir práticas inconstitucionais e criminosas”, ressaltam.

Na última semana, em reunião com o governador Jackson Barreto, também do PMDB, o ministro de Temer teria condicionado o financiamento de R$ 560 milhões, junto à CEF, pleiteado pelo estado, aos votos de parte da bancada na Câmara pela reforma da Previdência. A chantagem condicionava a liberação do financiamento somente após a votação da reforma, marcada para 15 de fevereiro. “Marun me falou que há vários contratos com a CEF, mas o governo só vai liberar após a votação da reforma. Achei uma coisa fora de propósito. Me deixou frustrado”, afirmou Barreto. Em entrevista à rádio Tribuna Band News FM, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou que se fosse Temer, “demitiria esse ministro hoje mesmo”. “Isso é uma vergonha. Já mandei recado, dizendo que não conte comigo”. O governador da Paraíba, Ricardo Coutinho (PSB), chamou de “inaceitável” a fala do ministro e ameaçou acionar o STF caso financiamentos sejam prejudicados por eventuais posicionamentos em relação à reforma previdenciária. O ministro negou que suas declarações tenham sido tentativa de chantagem e reafirmou que as liberações de financiamentos públicos em troca de votos a favor da reforma são “ações de governo”.

Quem é Carlos Marun

Integrante da tropa de choque do ex-deputado Eduardo Cunha e indicado por ele para a articulação política de Temer, Marun foi vice-líder do governo na Câmara. Na noite de 25 de outubro após a votação em que ajudou a salvar o presidente de uma denúncia por formação de quadrilha e obstrução da Justiça, o deputado não conseguiu esconder sua alegria e dançou e cantou para jornalistas no plenário. Com isso, virou porta-voz da linha-dura adotada contra oposicionistas. “Os deputados que votaram contra o presidente devem ser excluídos da base e ser tratados como oposição. Não devem ser nem recebidos pelos ministros”, avisou.

Natural de Porto Alegre, Marun fez carreira política em Mato Grosso do Sul. Foi vereador de Campo Grande e deputado estadual, secretário estadual de Habitação e presidente da Agência de Habitação Popular de Mato Grosso do Sul (Agehab), cargos exercidos no mandato do governador André Puccinelli, investigado por fraudes em licitações e desvios de dinheiro público. O ministro de Temer não aparece entre os investigados da Lava Jato. Mas é alvo de processo por improbidade administrativa praticada quando esteve à frente da Agehab, sob a acusação de beneficiar a DigithoBrasil Soluções em Software Ltda., que prestava serviços à Agência, em contratos de R$ 16,6 milhões. Nas eleições de 2014 a empresa foi a principal financiadora da campanha de Marun. Entre as empresas que financiaram a campanha do deputado, há outras envolvidas em corrupção, como a H2L Equipamentos, de Rodolfo Pinheiro Holsback, investigado na Operação Lama Asfáltica, e a Guizardi Júnior Construtora, de Giovani Guizardi, que é réu e delator da Operação Rêmora.

*Com agências.

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