POLÍTICA

Ministro do Trabalho é afastado do cargo

Operação da Polícia Federal investiga envolvimento da cúpula do ministério em organização criminosa que fraudava registros sindicais
Por Gilson Camargo* / Publicado em 5 de julho de 2018
Agentes da Polícia Federal cumprem mandado de busca no Ministério do Trabalho

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Agentes da Polícia Federal cumprem mandado de busca no Ministério do Trabalho

Foto: José Cruz/Agência Brasil

O ministro do Trabalho, Helton Yomura, foi afastado do cargo na manhã desta quinta-feira, durante a terceira fase da Operação Registro Espúrio, deflagrada pela PF para aprofundar as investigações sobre a atuação de uma organização criminosa que concede registros sindicais de forma fraudulenta no Ministério do Trabalho. “A pedido da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República, serão impostas aos investigados medidas cautelares consistentes em proibição de frequentar o Ministério do Trabalho e de manter contato com os demais investigados ou servidores da pasta, bem como a suspensão do exercício do cargo”, informa nota divulgada pela PF.

Em nota, a defesa do ministro informou que irá recorrer da decisão que o afastou do cargo. “O ministro do Trabalho, Helton Yomura, adotou rigorosas providências institucionais para a garantia do interesse público, podendo se destacar: exoneração imediata de todos os servidores sob investigação, abertura de sindicância e processos administrativos para averiguação dos fatos e suspensão de todos os atos que pudessem provocar repercussões no âmbito da investigação”, afirma o comunicado dos advogados César Caputo Guimarães e André Hespanhol.

Os policiais chegaram às 6h no Anexo 4 da Câmara dos Deputados, onde cumpriram mandados de busca e apreensão no gabinete do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP). O parlamentar, que é um dos investigados, acompanhou pessoalmente a operação. “A investigação é natural. O Ministério do Trabalho hoje pertence ao PTB. A minha atuação no marco regulatório do transporte e na área do transporte tem muito sindicatos, e eu tenho um assessor que se relaciona com eles, é natural que se faça investigação na área de sindicatos dos caminhões. Ainda mais que nesta semana eu aprovei a anistia para os caminhoneiros que foram multados, então o trabalho é natural. Mas, nada a temer. Eu trabalho aqui há 28 anos, sou ficha limpa”, afirmou Marquezelli, atribuindo a ação da PF ao fato de ser relator do projeto que anistia as multas aplicadas às transportadoras durante a greve dos caminhoneiros.

O deputado Nelson Marquezelli aguarda enquanto agentes da Polícia Federal realizam buscas em seu gabinete na Câmara dos Deputados

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O deputado Nelson Marquezelli aguarda enquanto agentes da Polícia Federal realizam buscas em seu gabinete na Câmara dos Deputados

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“A informação que a delegada [da PF] deu para nós é que serão investigados todos os deputados do PTB, todos do PDT e do Solidariedade que, nos últimos dez anos, foram os três partidos que tiveram na sua mão a direção do Ministério do Trabalho”, revelou o deputado, que defendeu um de seus assessores envolvido nas investigações, com quem trabalha há mais de dez anos.

Três agentes da PF deixaram o prédio do Ministério do Trabalho carregando um malote com documentos apreendidos e, ao todo, a terceira fase da operação deve cumprir dez mandados de busca e apreensão e três de prisão temporária em Brasília e no Rio de Janeiro. Os mandados foram expedidos pelo Supremo Tribunal Federal.

Segundo o comando da PF, a ação desta quinta-feira cumpre investigações e coleta de material das primeiras fases da Operação Registro Espúrio, que indicam a participação de novos suspeitos e “apontam que importantes cargos da estrutura do Ministério do Trabalho foram preenchidos com pessoas comprometidas com os interesses do grupo criminoso, permitindo a manutenção das ações ilícitas praticadas na pasta”. A operação foi lançada no final de maio, quando a PF fez buscas em gabinetes da Câmara dos Deputados e nas sedes dos partidos PTB e Solidariedade, além de centrais sindicais.

De acordo com a Procuradoria Geral da República (PGR), as investigações apontam que “os investigados utilizam rotineiramente os cargos para viabilizar a atuação da organização criminosa e para solicitar tratamento privilegiado a processos de registros sindicais”.

Esquema estruturado em cinco núcleos

A Operação Registro Espúrio foi deflagrada pela Polícia Federal no dia 30 de maio deste ano, que mobilizou 320 agentes para o cumprimento de oito mandados de prisões preventivas, 15 de prisões temporárias e 64 de busca e apreensão no Distrito Federal, São Paulo, Goiás, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais. Os deputados Paulinho da Força (SDD-SP), Jovair Arantes (PTB-GO) e Wilson Filho (PTB-PB) estão entre os primeiros investigados por fraudes no sistema de registro sindical. As investigações preliminares indicaram que o grupo montou um esquema que funcionava em secretarias do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) responsáveis pela análise de pedidos. Os gabinetes dos três deputados federais passaram por busca e apreensão. Leonardo José Arantes e Rogério Papalardo Arantes, sobrinhos do deputado Jovair Arantes estavam entre os alvos de mandato de prisão.

De acordo com uma petição enviada ao STF pela Superintendência da Polícia Federal, no decorrer do inquérito foi identificada a existência de um esquema criminoso estruturado em cinco núcleos de atuação: administrativo, político, sindical, captador e financeiro. A petição informa pagamentos de até R$ 4 milhões pela liberação de um único registro sindical. O “núcleo administrativo” da fraude envolve dez servidores da pasta, encarregados pela quadrilha de viabilizar as fraudes que incluíam o desrespeito à ordem cronológica dos requerimentos e o direcionamento dos resultados dos pedidos. Já o “núcleo político”, de acordo com a PGR, é composto por parlamentares e ex-parlamentares que indicavam e mantinham em cargos estratégicos da Secretaria de Relações do Trabalho do MTE os servidores que faziam parte do esquema e eram contatados pelo “núcleo sindical”, composto por interessados nos registros adulterados. A intermediação entre os sindicatos interessados nos registros e o resto da quadrilha era feita por lobistas e advogados. “O esquema se completava com a atuação do núcleo financeiro que viabilizava os pagamentos (das entidades sindicais para os envolvidos) por meio da simulação de contratos fictícios de trabalho”, conclui o parecer da PGR.

Servidor aponta participação do ex-ministro do trabalho no esquema

Apontado pela Polícia Federal como um dos principais operadores do PTB e da União Geral dos Trabalhadores (UGT) no Ministério do Trabalho, o ex-servidor do ministério Renato Araújo Júnior afirmou em depoimento que era mero “cumpridor de ordens” no esquema de concessão de registros sindicais fraudulentos e apontou o envolvimento do ex-ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira (PTB-RS), que se licenciou da pasta em dezembro de 2017 para reassumir mandato de deputado federal e é candidato à reeleição. Júnior, que foi exonerado do cargo de coordenador de registro sindical no ministério e responde a uma ação de improbidade pelo envolvimento na quadrilha, afirmou ter recebido diversos pedidos da UGT para registros de entidades vinculadas à central sindical, “muitas vezes sem os requisitos necessários para tanto” e que os “pedidos eram, na verdade, ordens veladas”, vindas do presidente da UGT, Ricardo Patah, e de outros nomes relacionados à central sindical. Revelou que Patah tem ligações com Nogueira e que fazia pedidos ao ex-ministro. No segundo depoimento à PF, em 31 de maio, o ex-servidor, que está preso no Complexo Penitenciário da Papuda afirmou que os pedidos da UGT eram direcionados não somente a ele, “mas também a Renata Frias Pimentel, Leonardo Cabral, Carlos Lacerda e ao próprio ministro Ronaldo Nogueira” e “que futuramente pode declinar a participação de alguns deles nas fraudes sindicais”.

*Com informações da Polícia Federal, PGR e Agência Brasil.

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