POLÍTICA

Bolsonaro nomeia juiz que prendeu Lula

Sergio Moro, juiz da Lava Jato, aceitou convite do presidente eleito para assumir fusão da Justiça e Segurança, com agenda “anticorrupção”
Por Gilson Camargo / Publicado em 1 de novembro de 2018
O juiz Sergio Moro chega à casa do presidente eleito na companhia do economista Paulo Guedes, na manhã desta quinta-feira: “agenda anticorrupção”

Foto: Antonio Lacerda/ EFE/ Agência Brasil

O juiz Sergio Moro chega à casa do presidente eleito na companhia do economista Paulo Guedes, na manhã desta quinta-feira: “agenda anticorrupção”

Foto: Antonio Lacerda/ EFE/ Agência Brasil

O juiz federal Sergio Moro, que comanda as investigações da Operação Lava Jato, aceitou nesta quinta-feira, 1º de novembro, o convite do presidente eleito Jair Bolsonaro para ocupar o Ministério da Justiça que será unificado com o da Segurança Pública. O anúncio foi feito por Moro, em nota. “Após reunião pessoal, na qual foram discutidas políticas para a pasta, aceitei o honrado convite”, afirmou. O governo eleito confirmou o nome do juiz de primeira instância para o “superministério”. “Sua agenda anticorrupção, anticrime organizado, bem como o respeito à Constituição e às leis será o nosso norte”, exaltou o presidente eleito no Twitter.

Sergio Moro ficou cerca de uma hora e meia com o eleito. Ao sair da reunião, acenou para as pessoas que se aglomeravam em frente à casa de Bolsonaro, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, mas não deu entrevista. Na nota, Moro lamentou que terá que “abandonar 22 anos de magistratura”. “No entanto, a perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado, com respeito à Constituição, à lei e aos direitos, levaram-me a tomar esta decisão”. Para ele, “na prática, o cargo significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção e afastar riscos de retrocessos por um bem maior”.

Antes da aceitação do convite pelo controverso juiz de Curitiba, o vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, declarou que Moro já havia sido convidado para integrar o governo, caso Bolsonaro fosse eleito. As declarações de Mourão aumentaram as suspeitas da oposição, que acusa Moro de influenciar o processo eleitoral ao tornar público o teor da colaboração premiada do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci.

Constrangimento: em maio de 2017, ao encontrar Moro em um aeroporto, Bolsonaro bateu continência ao juiz

Foto: Reprodução

Constrangimento: em maio de 2017, ao encontrar Moro em um aeroporto, Bolsonaro bateu continência ao juiz

Foto: Reprodução

Parte dos depoimentos foram tornados público por Moro em 1º de outubro, seis dias antes do primeiro turno das eleições. Neles, Palocci acusa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-presidente Dilma Rousseff de participação direta no esquema de corrupção na Petrobras, investigado pela Operação Lava Jato.

IRONIA – A presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, manifestou-se no Twitter, primeiro em tom irônico, quando Moro estava reunido com Bolsonaro, depois atacando a decisão do juiz federal. “Moro será ministro de Bolsonaro depois de ser decisivo para sua eleição, ao impedir Lula de concorrer”, escreveu a senadora.

Segundo Gleisi, o PT “denunciou a politização” das decisões de Moro, no episódio do grampo da ex-presidente Dilma Rousseff em conversa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e no vazamento da delação do ex-ministro Antônio Palocci, nas vésperas do primeiro turno. “Ajudou a eleger, vai ajudar a governar”, afirmou.

Antes da confirmação de Moro, Gleisi criticou o encontro dos dois, lembrando que Bolsonaro afirmou que “Lula vai apodrecer na cadeia” e queria “exterminar os vermelhos”. “Viva juízes isentos como Moro e presidentes democráticos como Bolsonaro”, finalizou.

Juíza de Catanduvas assumirá a Lava Jato

A juíza Gabriela Hardt, que substituirá interinamente Moro na Lava Jato, em cerimônia na Capitania dos Portos do Paraná

Foto: Divulgação

A juíza Gabriela Hardt, que substituirá interinamente Moro na Lava Jato, em cerimônia na Capitania dos Portos do Paraná

Foto: Divulgação

Com a saída do juiz Sérgio Moro da 13ª Vara Federal no Paraná para assumir o superministério da Justiça e Segurança Pública, a Operação Lava Jato ficará sob o comando provisório da juíza Gabriela Hardt, de 42 anos. Já no dia 14 de novembro ela presidirá uma audiência com o ex-presidente Lula sobre o “caso do sítio de Atibaia”.

Ex-juíza corregedora do presídio federal de Catanduvas, praticante de esportes e adepta da natação como costuma exaltar em suas redes sociais, Hardt já assumiu os casos da Lava Jato durante ausências de Moro. Por conta da exposição pública e assédio da imprensa ocasionados por sua atuação como substituta da Lava Jato, o que lhe rendeu até capa de jornal, a juíza criou um blog no qual não faltam elogios ao colega de magistratura. No dia 13 de outubro de 2014, a magistrada reproduziu em sua rede social uma nota das associações de juízes em defesa da Lava Jato e aproveitou para exaltar Moro: “Compartilho abaixo a nota (…) para ciência dos amigos e em homenagem ao juiz federal Sergio Moro, cuja retidão e dedicação me inspiram diariamente na atividade judicante. Nosso país terá muito a ganhar se ele um dia vier a integrar nossa Corte Suprema”.

Em maio deste ano, quando o juiz estava nos Estados Unidos, ela ordenou a prisão do ex-ministro José Dirceu. Assim como ocorreu no caso de Lula, Dirceu teve sua prisão decretada horas depois de o Tribunal Federal Regional da 4ª região, responsável por julgar as apelações das decisões de Moro, negar um recurso decisivo ao ex-ministro. Esvaziada na primeira instância, já que a maioria dos casos investigados já foram remetidos para instâncias superiores do judiciário, a Lava Jato terá um titular definido pelo Conselho de Administração do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4).

Moro vai dividir primeiro escalão com investigados

Associado ao combate à corrupção por seus pares, Moro vai dividir primeiro escalão do governo com investigados

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Associado ao combate à corrupção por seus pares, Moro vai dividir primeiro escalão do governo com investigados

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Com sua “agenda anticorrupção” e “anti crime organizado”, o juiz Sergio Moro irá dividir o primeiro escalão do futuro governo Bolsonaro com suspeitos e investigados por corrupção, a começar pelo “guru” do novo presidente, o economista Paulo Guedes, eventual superministro da anunciada fusão dos ministérios da Fazenda e da Economia.

O economista Paulo Guedes é investigado pelo MPF por crimes de gestão fraudulenta ou temerária

Foto: Fernando Frazão/ Agencia Brasil

O economista Paulo Guedes é investigado pelo MPF por crimes de gestão fraudulenta ou temerária

Foto: Fernando Frazão/ Agencia Brasil

O Ministério Público Federal (MPF) em Brasília abriu uma investigação contra Guedes por suspeita de associação com executivos ligados ao PT e ao MDB para praticar fraudes em negócios com fundos de pensão de estatais. Em seis anos, o economista captou ao menos R$ 1 bilhão dessas entidades. Um procedimento investigativo criminal, instaurado no dia 2 de outubro, apura se o economista cometeu os crimes de gestão fraudulenta ou temerária. Ele é investigado ainda por suposta emissão e negociação de títulos sem lastros ou garantias ao negociar, obter e investir recursos de sete fundos. Entre as entidades estão Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobras), Funcef (Caixa) e Postalis (Correios), além do BNDESPar – braço de investimentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). De acordo com o MPF, as  transações começaram em 2009 com executivos indicados pelos dois partidos investigados atualmente por desvio de recursos dos fundos.

Malta foi indiciado em 2007 pela PF por suspeita de participação na máfia dos sanguessugas

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Malta foi indiciado em 2007 pela PF por suspeita de participação na máfia dos sanguessugas

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O senador Magno Malta (PR-ES), cotado para um eventual “Ministério da Família” de Bolsonaro, foi indiciado em 2007 pela Polícia Federal (PF) por suspeita de participação na máfia dos sanguessugas. Segundo a PF, o parlamentar foi indiciado por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. As investigações da Polícia Federal e do Congresso mostraram que o esquema dos sanguessugas fazia compras superfaturadas de ambulâncias para prefeituras com dinheiro do Orçamento.

Onyx Lorenzoni foi delatado em esquema de propina da Odebrecht

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Onyx Lorenzoni foi delatado em esquema de propina da Odebrecht

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O deputado federal reeleito Onyx Lorenzoni (DEM-RS), eventual ministro da Casa Civil do governo eleito, admitiu envolvido em um escândalo de propina. Em maio de 2017, Lorenzoni admitiu ter recebido R$ 100 mil em propina da JBS, depois que seu nome apareceu na delação dos controladores da empresa, Joesley e Wesley Batista. Relator do projeto das ’10 Medidas contra a Corrupção’ na Câmara, o parlamentar admitiu que o dinheiro doado, que teve como intermediário o presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Carne Bovina (ABIEC), Antônio Jorge Camardelli, não foi declarado. Outro inquérito por caixa 2 que corria contra ele no Supremo Tribunal Federal (STF) e investigava o repasse de R$ 175 mil pela Odebrecht foi arquivado em junho pelo ministro Luiz Fux.

Fraga, da bancada da bala, condenado ao regime aberto por corrupção envolvendo o transporte coletivo no DF

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Fraga, da bancada da bala, condenado ao regime aberto por corrupção envolvendo o transporte coletivo no DF

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Também cotado para o ministério, o deputado federal Alberto Fraga (DEM) que concorreu ao governo do Distrito Federal, mas obteve apenas 5,88% dos votos, foi condenado em setembro desse ano a quatro anos, dois meses e 20 dias de prisão, em regime semiaberto, pela prática do crime de concussão. Ele nega as acusações. Coronel da reserva da Polícia Militar, Fraga lidera a Frente Parlamentar da Segurança Pública, a “bancada da bala”, que lidera o lobby contra o estatuto do desarmamento e a favor do porte de arma de fogo. Na manhã de quarta-feira, 31, o nome do parlamentar atingiu o topo dos trending topics, os assuntos mais falados do Twitter. Como destacou o site Pragmatismo Político, parte das postagens se refere a Fraga como novo ministro do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e cita que ele é condenado na Justiça por corrupção. Em setembro deste ano, Fraga foi condenado a quatro anos, dois meses e 20 dias de prisão em regime semiaberto sob a acusação de pedir (e receber) R$ 350 mil em propina para firmar um contrato entre a cooperativa de ônibus Coopertran e o governo do DF. A decisão é de primeira instância e cabe recurso.

Bolsonaro é réu em uma ação penal no STF por ofensa à deputada federal Maria do Rosário (PT-RS). Antes da eleição em segundo turno, o então candidato virou alvo de uma investigação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre acusações de caixa 2, entre outros crimes eleitorais. O pedido de investigação feito pela representação do candidato do PT, Fernando Haddad, ao TSE, aponta que empresas bancaram ilegalmente o envio de milhares de mensagens por WhatsApp para favorecer a candidatura presidencial de Bolsonaro, conforme publicado em reportagem da Folha de S. Paulo. O ministro Jorge Mussi aceitou o pedido. A decisão aconteceu ao mesmo tempo em que os controladores do aplicativo, detentor de 120 milhões de usuários brasileiros, anunciaram “medidas legais imediatas” para impedir empresas de enviar mensagens em massa. Em uma coletiva na noite de 28 de outubro, a ministra Rosa Weber, presidente do TSE afirmou que tratará como prioridade as ações contra as campanhas de Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) e que caberá ao STF analisar se Bolsonaro pode assumir o cargo, por ser réu.

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