POLÍTICA

ABI promove ato de apoio a Glenn Greenwald e repudia Bolsonaro

"Sociedade não está morta, mas disposta a resistir aos ataques à democracia que têm sido proferidos pelo presidente da República", afirma dirigente da entidade
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 30 de julho de 2019
Greenwald, do site Intercept, que desde junho vem revelando as relações comprometedoras entre juiz e promotores da Lava Jato, virou alvo de ataques por parte do governo

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Greenwald, do site Intercept, que desde junho vem revelando as relações comprometedoras entre juiz e promotores da Lava Jato, virou alvo de ataques por parte do governo

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Convocado há apenas dois dias pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o ato que acontece hoje, 30, em apoio ao jornalista Gleen Greenwald e à agência de jornalismo investigativo The Intercept está “surpreendendo pela receptividade que tem encontrado na sociedade brasileira”. Essa é a opinião do vice-presidente da ABI e responsável pela Comissão de Liberdade de Imprensa da entidade, Cid Benjamin. Informando que nessa manhã, ao atender o Extra Classe, somente ele já teria contabilizado seis entrevistas, Benjamin entende que a repercussão “mostra que a sociedade não está morta e, sim, disposta a resistir aos ataques à democracia” que têm sido proferidos por Jair Bolsonaro. As recentes declarações do presidente da República têm sido alvo de questionamentos e repercutiram intensamente entre as mais variadas entidades associativas e formadores de opinião. A manifestação ocorre a partir das 18h30min no auditório do 9° andar da sede da ABI, na Rua Araújo Porto Alegre 71, Centro, Rio de Janeiro.

Cid Benjamin, da ABI

Foto: José Cruz/ ABr

Cid Benjamin, da ABI

Foto: José Cruz/ ABr

Segundo Benjamin, a atividade marca o que ele considera uma retomada do papel histórico da centenária associação que “estava um pouco apagada, para uma entidade que sempre esteve na vanguarda na luta democrática”, somente tem como ponto a se lamentar: o de estar sendo chamado para contrapor a um “desqualificado como ser humano”.

Para o vice-presidente da ABI, além dos ataques ao fundador do The Intercept, a quem Bolsonaro ameaçou com uma possibilidade de prisão, a declaração recente feita pelo mandatário sobre o pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, mostra que Bolsonaro “não tem compostura e faz chacota sobre a morte de um pai de família”.

Na segunda-feira, 29, ao comentar o encerramento do processo judicial que considerou Adélio Bispo, autor da facada que levou durante a campanha eleitoral, isento de pena devido a doença mental, Bolsonaro ironizou Cruz ao dizer que “um dia” contaria como o pai dele, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, desapareceu na ditadura militar, caso a informação lhe interessasse. “Não vai querer saber a verdade”, disparou Bolsonaro.

Civilização X Bolsonaro

Em solidariedade não só à família de seu presidente, mas também a “todas as famílias daqueles que foram mortos, torturados ou desaparecidos” no país, a Diretoria do Conselho Federal da OAB, o Colégio de Presidentes da OAB e o Conselho Pleno da OAB Nacional, ainda ontem repudiaram as declarações de Bolsonaro. Em nota pública, as entidades reafirmam que todas as autoridades do país devem “obediência à Constituição Federal”, que prevê em seus fundamentos “a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos”. Para a OAB, o cargo de presidente da República exige equilíbrio e respeito aos valores constitucionais, “sendo-lhe vedado atentar contra os direitos humanos”.

Para Santa Cruz, da OAB, declarações de Bolsonaro demonstram crueldade e falta de empatia

Foto: Eugenio Novaes/ OAB/ Divulgação

Para Santa Cruz, da OAB, declarações de Bolsonaro demonstram crueldade e falta de empatia

Foto: Eugenio Novaes/ OAB/ Divulgação

CRUELDADE – Para o presidente da OAB Nacional, as declarações de Bolsonaro são “inqualificáveis” e evidenciam que ele “deixa patente seu desconhecimento sobre a diferença entre público e privado, demonstrando mais uma vez traços de caráter graves em um governante: a crueldade e a falta de empatia”. Felipe Santa Cruz estranha o comportamento de Bolsonaro “que se diz cristão”, lembrando que seu pai, morto aos 26 anos de idade, era da juventude católica de Pernambuco, funcionário público, casado e aluno de Direito. “Minha avó acaba de falecer, aos 105 anos, sem saber como o filho foi assassinado. Se o presidente sabe, por ‘vivência’, tanto sobre o presente caso quanto com relação aos de todos os demais ‘desaparecidos’, nossas famílias querem saber” afirma, ao lamentar o tratamento da perda de um ente querido como se fosse assunto corriqueiro e debochado.

INSUSTENTÁVEL – Concretamente, as falas de Bolsonaro têm recebido o repúdio até de pessoas de sua base aliada. Segundo apurou a jornalista Daniela Lima, da coluna Painel, da Folha de São Paulo, líderes e dirigentes de partidos das mais variadas matizes estão dizendo que os “arroubos retóricos” de Bolsonaro estão crescendo e acreditam ser necessário uma intervenção do parlamento. O mesmo sentimento, segundo a colunista, tem sido verificado no poder Judiciário.

Presidente não tem comportamento adequado e usa fala de botequim, define Marco Antonio Villa, até bem pouco tempo um feroz antipetista

Foto: José Cruz/ ABr

Presidente não tem comportamento adequado e usa fala de botequim, define Marco Antonio Villa, até bem pouco tempo um feroz antipetista

Foto: José Cruz/ ABr

O historiador Marco Antonio Villa, até há bem pouco tempo crítico feroz do PT e do ex-presidente Lula, ao comentar a fala em que Bolsonaro descartava a hipótese de que a Portaria 666 do Ministério da Justiça e Segurança Pública estaria sendo criada para a possível deportação de Gleen Greenwald, disse que o presidente da República não tem comportamento adequado e usa “linguagem de botequim”.

Bolsonaro, na ocasião, disse que Greenwald poderia “pegar uma cana aqui no Brasil”, arrematando “malandro, malandro, para evitar um problema desse, casa com outro malandro ou não casa ou adota criança no Brasil”. Sobre esta declaração, o próprio jornalista de origem norte-americana sentenciou: “O Brasil ainda não é uma ditadura. O presidente não tem o poder de mandar alguém para a prisão”.

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