POLÍTICA

Deputados recebem alerta sobre danos da PEC do orçamento de guerra

Auditoria Cidadã da Dívida aponta problemas jurídicos, constitucionais, econômico-financeiros e sociais na PEC 10/2020, que está em votação na Câmara
Por Gilson Camargo / Publicado em 28 de abril de 2020
Antes do início da votação, deputados receberam notificação que alerta sobre os danos da PEC 10/2020

Foto: Agência Câmara

Antes do início da votação, deputados receberam notificação que alerta sobre os danos da PEC 10/2020

Foto: Agência Câmara

De autoria de Rodrigo Maia (DEM) e de outros nove deputados de vários partidos, a proposição que permite a separação do orçamento e dos gastos realizados pelo governo para enfrentamento da crise de saúde do orçamento geral da União foi devolvido à Câmara.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2020, impõe o “orçamento de guerra” com regras que terão vigência durante o estado de calamidade pública, ou seja, até 31 de dezembro deste ano, e convalidam os atos de gestão praticados desde 20 de março.

A justificativa da proposta é criar um regime extraordinário para facilitar a execução do orçamento relacionado às medidas emergenciais, afastando possíveis problemas jurídicos para os servidores que processam as decisões sobre a execução orçamentária.

Depois de passar pela Câmara, o texto substitutivo do projeto foi aprovado no Senado em 17 de abril. Devido às alterações dos senadores, foi devolvido para nova votação dos deputados. A matéria foi incluída na pauta desta terça-feira, 28.

Receita para promover a desordem econômica e social

Fattorelli com os parlamentares do PSol: orçamento é de guerra, mas os recursos vão para os bancos privados

Foto: Alesp/ Divulgação

Fattorelli com os parlamentares do PSol: orçamento é de guerra, mas os recursos vão para os bancos privados

Foto: Alesp/ Divulgação

Após a confirmação de que o presidente da Câmara incluiria novamente a sua proposta na pauta de votação da casa, a Auditoria Cidadã da Dívida (ACD) enviou notificação extrajudicial a todos os deputados federais “para garantir que cada um deles tomou conhecimento dos diversos e graves problemas de ordem jurídica, constitucional, econômico-financeira e social envolvidos na PEC 10/2020”.

O documento alerta os parlamentares sobre os “impactos danosos à sociedade brasileira” e propõe que sejam deliberadas medidas para superar os diversos problemas elencados antes da deliberação da proposta pelo Plenário.

O orçamento de guerra, como passou a ser denominada a proposta entre parlamentares, levanta o teto de gastos que foi instituído pela PEC da morte em 2019 e torna sem efeito a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Com isso, libera o governo para gastar recursos públicos de forma indiscriminada, sem auditorias, e até adotar medidas vetadas ao gestor público, a exemplo da transferências de recursos entre órgãos e ministérios – as pedaladas fiscais alegadas pelo parlamento para justificar o golpe que afastou a presidente eleita Dilma Rousseff em 2016.

A medida ainda autoriza o Banco Central a negociar títulos da dívida pública no mercado financeiro, o que envolve a especulação de alto risco que movimentam R$ 1 trilhão ao ano.

Na versão aprovada pelos senadores, o Banco Central só poderá atuar nos mercados secundários, adquirindo esses títulos privados apenas de quem já detenha os papéis, como bancos e fundos de investimentos.

De acordo com a entidade, essa alteração ressaltada pela Câmara, confirma o que vem sendo denunciando: “o dinheiro das compras feitas pelo Banco Central irá para instituições financeiras – bancos e fundos de investimentos –, e não para empresas”, aponta a ACD.

De acordo com os auditores, a primeira vítima do “orçamento de guerra” serão os recursos públicos, que poderão ser fatiados para socorrer a iniciativa privada e os bancos. “A maior parte dos recursos serão realocadas das áreas sociais”, alerta Maria Lúcia Fattorelli, coordenadora da Auditoria Cidadã.

Em um debate com os parlamentares do PSol Carlos Giannazi (deputado estadual) e Celso Giannazi (vereador da São Paulo), na Alesp, no dia 13, Fattorelli denunciou que o aporte de R$ 1,2 trilhão feito com o discurso de “dar liquidez ao mercado” não está chegando às pequenas empresas na forma de empréstimos baratos. Ao contrário, os bancos estão calculando o risco da operação e repassando esse custo, o que resulta em juros ainda mais altos.

De acordo com a Auditoria da Dívida, esses são os principais riscos aos quais o orçamento de guerra expõe a sociedade e a ordem econômica:

Provoca prejuízo de trilhões de reais aos cofres públicos,por meio de grave autorização para que o Banco Central opere no mercado secundário (de balcão), podendo comprar derivativos sem lastro e debêntures, sem limite de valor;

Admite que tais compras ocorram sem a identificação dos beneficiários, sem obedecer aos “Procedimentos Mínimos” recomendados pela Anbima, sem a possibilidade de investigação efetiva, sem limitar o prazo dos derivativos sem lastro e debêntures, sem a exigência de contrapartida alguma ao país;

Permite que o Banco Central pague por tais derivativos sem lastro e debêntures com recursos públicos, afetando gravemente o orçamento federal e provocando aumento exponencial da dívida pública, cujo peso recairá sobre o povo brasileiro;

Representa, na prática, a troca de papéis podres dos bancos por títulos da dívida pública federal, que ainda renderão juros mensalmente aos bancos, enquanto o Banco Central ficará com os derivativos sem lastro e debêntures em seu balanço;

Possui dispositivo que “legaliza” a incorreta emissão de novos títulos da dívida pública para pagar juros,o que já vem sendo praticado de forma inconstitucional pois burla o Art. 167, III conforme denunciado desde 2010;

Altera a Constituição Federal durante estado de calamidade pública, afrontando diretamente a proibição constante do Art. 60 § 1º da própria Constituição para situações equiparáveis(estado de sítio, de defesa, intervenção federal), nos quais a participação popular e o funcionamento do poder legislativo ficam prejudicados;

Está em sentido oposto aos objetivos fundamentais da República (Art. 3º da Constituição), pois o seu custo elevadíssimo subtrairá trilhões para servir aos bancos, impedindo a destinação de recursos para o desenvolvimento nacional, impossibilitando também a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.

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