POLÍTICA

Vereadores de Xangri-lá aprovam lei que obriga leitura da Bíblia nas escolas públicas

A assessoria jurídica da prefeitura de Xangri-lá está estudando a possibilidade de ingressar com um recurso para barrar a lei, baseado em parecer da própria Câmara que considera a proposta inconstitucional
Por Flavio Ilha / Publicado em 11 de setembro de 2020
Vereador Valdir Roxo, autor da Lei, explicou que seu projeto não tem relação alguma com religião

Foto: Reprodução/Facebook

Vereador Valdir Roxo, autor da Lei, explicou que seu projeto não tem relação alguma com religião

Foto: Reprodução/Facebook

O presidente da Câmara de Vereadores de Xangri-lá, no litoral norte do Rio Grande do Sul, promulgou no dia 21 de agosto a lei 2.166, que torna obrigatória a leitura da Bíblia em todas as escolas públicas municipais.

De acordo com a lei, de autoria do próprio presidente da Câmara, Valdir Machado Silveira (PSC), a responsabilidade pela leitura será do professor ou professora que abrir o turno escolar da manhã ou da tarde para cada turma.

Constituição

A Constituição brasileira determina que o Estado é laico, ou seja, não pode adotar nenhuma religião em repartições ou órgãos públicos.

A lei, aprovada em 2019, diz que o trecho da Bíblia a ser lido em sala de aula será escolhido de forma aleatória, cabendo também aos docentes a definição se haverá ou não debate sobre o tema abordado. Segundo a justificativa do projeto, o objetivo da lei é “tornar o ambiente escolar mais saudável e altruísta”. O vereador é pastor evangélico na cidade e também atua como cantor gospel. Também é apoiador do presidente Jair Bolsonaro, para quem fez campanha eleitoral.

Unanimidade

O projeto de Silveira, mais conhecido como Valdir Roxo, foi aprovado por unanimidade na sessão de 12 de agosto de 2019. A assessoria jurídica da prefeitura de Xangri-lá está estudando a possibilidade de ingressar com um recurso para barrar a lei, baseado em parecer da própria Câmara de Vereadores que considerou a proposta inconstitucional. “Uma das possibilidades é apresentar um projeto para revogar a lei”, disse o assessor jurídico da prefeitura, Rafael Medeiros.

Erro administrativo

O prefeito da cidade, Cilon Rodrigues da Silveira (PDT), atribuiu a promulgação da lei a um erro administrativo. “Eu deveria ter vetado, mas não fiz isso no prazo e agora houve a promulgação. Em princípio é inconstitucional, mas estamos estudando o que fazer”, afirmou, cauteloso em relação à repercussão da medida junto à comunidade. A Lei Orgânica municipal diz que o prefeito tem 15 dias para sancionar ou vetar qualquer projeto. Se não fizer nem uma coisa nem outra, a Câmara pode promulgar em até 48 horas.

“Nada a ver com religião”

Valdir Roxo, que divide o tempo como vereador e cantor gospel, entre Eduardo e Jair Bolsonaro em 2017

Foto: Reprodução/Facebook

Valdir Roxo, que divide seu tempo tempo como vereador e cantor gospel, entre Eduardo e Jair Bolsonaro, em abril de 2017

Foto: Reprodução/Facebook

Valdir Roxo explicou que seu projeto não tem relação alguma com religião. “Meu objetivo é levar paz às escolas, numa época cada vez mais violenta, só isso”, justificou. Questionado sobre a Bíblia ser a versão oficial do cristianismo, o parlamentar disse que a maioria das pessoas tem fé católica. “O Estado é laico, mas as pessoas são cristãs”, defendeu.

Questionado ainda sobre a obrigatoriedade da leitura, Valdir Roxo disse que sua intenção não é impor nada. “Não é cabresto. É que se deixar facultativo, ninguém faz, entende? A lei só vai trazer bem às escolas, mas tem gente que não quer isso, em geral são comunistas ou esquerdistas”, acusou.

Inconstitucionalidade

O vereador já havia apresentado o mesmo projeto em 2001, que nem foi a plenário devido à sua inconstitucionalidade. Roxo é autor também de uma resolução, de 2020, que obriga a leitura de trechos da Bíblia em todas as sessões da Câmara de Vereadores de Xangri-lá. “Desde que começamos a ler, a paz voltou à Câmara”, garantiu.

A Defensoria Pública de Capão da Canoa, que atende Xangri-lá, já anunciou que estuda ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade no STF contra a lei municipal.

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