POLÍTICA

Distritão privilegiará políticos famosos e celebridades

Modelo de voto adotado no Afeganistão e outros poucos países, se aprovado em reforma eleitoral, pode comprometer ainda mais a democracia brasileira
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 8 de julho de 2021
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) pretende aprovar rapidamente a PEC para que ela tramite no Senad

Foto: Agência Câmara de Notícias

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) pretende aprovar rapidamente a PEC para que ela tramite no Senado antes de agosto

Foto: Agência Câmara de Notícias

“Emendão” é como está sendo chamada em Brasília a proposta de Emenda Constitucional (PEC) 125/2011, autoria do deputado Carlos Sampaio (PSDB/SP) – o mesmo que foi coordenador jurídico da campanha de Aécio Neves, em 2014, e depois da eleição pediu ao TSE a recontagem de votos –. A Proposta tramita há dez anos na Câmara. Após ressuscitada, a PEC voltou a tramitar nas comissões e aguarda parecer da relatora da matéria, a deputada Renata Abreu (Pode/SP).

A ideia original era somente evitar a realização de eleições próximas a feriados. No entanto, 54 artigos enxertados ao texto da PEC prometem, caso aprovação no plenário da Câmara, uma reforma eleitoral ampla.

No meio político, volta à cena, mais uma vez, a polêmica questão do voto distrital, que já foi rechaçado em 2017. Juristas e movimentos sociais questionam a proposição que chamam de Distritão. O entendimento de muitos é o que a democracia no Brasil acabará ainda mais desiquilibrada caso vingue essa modalidade.

Uma coisa é certa. Há forte interesse do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) de aprovar rapidamente a PEC para que ela tramite no Senado antes de agosto, a tempo de fazer valer o possível novo regramento ainda nas eleições de 2022.

Em síntese, os críticos do Distritão enxergam a diluição dos projetos políticos que deveriam ser expressos pelas organizações partidárias, e que personalidades, com mídia a favor, ou pessoas com alto poder aquisitivo para investir em suas candidaturas teriam grande vantagem em relação aos demais candidatos.

Piorando ainda a situação, as diferenças regionais seriam ampliadas. O modelo proposto praticamente torna invisível os eleitores dos municípios menores, pois os votos recebidos por candidatos não eleitos seriam descartados e não mais agregados às legendas partidárias.

Simples, mas não compatível

Brenda Quadros, integrante da Comissão Nacional de Direito Eleitoral da Associação Brasileira de Advogados (ABA)

Foto: Acervo Pessoal/Divulgação

Brenda Quadros, integrante da Comissão Nacional de Direito Eleitoral da Associação Brasileira de Advogados (ABA)

Foto: Acervo Pessoal/Divulgação

Para Brenda Quadros, integrante da Comissão Nacional de Direito Eleitoral da Associação Brasileira de Advogados (ABA), o sistema do chamado Distritão atua aparentemente de forma simples, porque seleciona os candidatos aos cargos legislativos que tiverem melhor desempenho em números de votos, desconsiderando as legendas. Contudo, para a advogada essa “simplicidade” não é compatível com as democracias modernas. “Tanto que é utilizado por somente quatro países no mundo, sendo o maior deles o Afeganistão”, registra.

A advogada lembra que as democracias atuais são complexas e que a Constituição brasileira deixa claro que a forma mais adequada de garantir representatividade legislativa passa pelo “fortalecimento dos partidos políticos, em razão de seu compromisso ideológico e tutela de minorias”.

Segundo Brenda, a ideia de eleger somente os candidatos mais votados acaba dispensando o saldo de votos que seriam destinados a novos candidatos, representantes dos movimentos sociais, ou políticos regionais que poderiam ocupar uma vaga legislativa dentro da realidade do sistema proporcional. Isso, para ela, mina a força política que contempla interesses de uma região. “É um descarte massivo de votos de qualidade”, afirma.

Movimentos Sociais

Dentro da mesma lógica exposta pela advogada, a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, registrou em Nota Técnica, que o modelo que será discutido pela Câmara “enfraquece os partidos e, consequentemente, seus programas políticos”. Condena também o que chama de personalização das candidaturas. “A fama como critério, tende a esvaziar o debate programático”.

A nota lembra que no modelo atual, nenhum voto é descartado, pois são contabilizados para um partido. Isso possibilita a representatividade de municípios menores, que não reúnem uma quantidade de eleitores suficiente para eleger parlamentares da sua região.

A plataforma ainda denuncia que a ideia do Distritão pode estimular a prática do “clientelismo” que pode criar “currais eleitorais” e dificultar a diversificação e renovação dos quadros políticos.

 

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