EDUCAÇÃO

Educação pública no RS em queda pelo segundo ano consecutivo

Indicadores do Censo educacional mostram agravamento na redução de matrículas, de turmas e do quadro docente, além do fechamento de escolas na rede estadual
Por Gilson Camargo / Publicado em 9 de fevereiro de 2022

Foto: Cpers/ Divulgação

Flagrante de abandono e descaso: escola indígena localizada no interior do RS

Foto: Cpers/ Divulgação

O número de matrículas na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul diminuiu pelo segundo ano consecutivo, de acordo com o Censo Escolar 2021 divulgado no final de janeiro pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep).

Foram cerca de 43 mil matrículas a menos, o que representa queda de 5,4% no total de alunos nesse nível de ensino. A redução de matrículas do estado representa quatro vezes e meia a média nacional. Em 2021, foram menos 1,2% de matrículas no ensino médio em todo o país.

Fechamento de escolas

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Escola Estadual Basica Professora Erica Marques, em Terra de Areia

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De acordo com o Censo, também houve redução do número de instituições de ensino no estado, o que vem sendo registrado anualmente desde 2016. “Em 2021, foram registradas 2.386 escolas estaduais, quando em 2020 eram 2.410, ou seja, uma redução de 24 instituições (-1%). De 2016 a 2021, verifica-se o fechamento de 171 escolas da rede no RS”, aponta análise do Censo elaborada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese-RS).

A redução do número de escolas representa ainda a suspensão de turmas, ou seja, fechamento de vagas na rede estadual. De 2020 para 2021, foram fechadas mil turmas, de 37 mil para 36 mil. De 2016 a 2021, a redução de turmas atingiu 16,9%: são cerca de 7 mil turmas a menos.

“O fechamento de turmas, muitas vezes associado a enturmações e multisseriações, reduz a capacidade de atendimento da rede, desagrega vínculos e desestimula estudantes, contribuindo para a evasão escolar. Ao fragilizar a oferta, o estado prenuncia cortes maiores, levando ao encerramento de turnos inteiros e ao fechamento de escolas”, alerta Helenir Aguiar Schürer, presidente do Cpers-Sindicato.

Sucateamento

Arte: Dieese-RS

Arte: Dieese-RS

Além do fechamento de instituições, a educação pública no estado piora a cada ano devido à deterioração do patrimônio. Grande parte das escolas estaduais vive em situação de penúria e muitas estão caindo aos pedaços, pois não há investimentos do governo em manutenção ou reformas, aponta o Sindicato.

No ano passado, durante três semanas, de 11 a 26 de novembro, o Cpers promoveu a Caravana da Educação, que apurou as condições materiais e humanas das escolas estaduais e mobilizou os professores em uma campanha por respeito e valorização.

Para a dirigente do Cpers, há um projeto em curso de desmonte das escolas públicas gaúchas, iniciado com o governo Ivo Sartori (MDB) e perpetrado pela atual gestão de Eduardo Leite (MDB) e que visa a entregar a educação pública para a iniciativa privada. O sucateamento das escolas estaduais aliado à política de enxugamento de matrículas e escolas, evidencia a intenção do governo: precarizar para abrir mercado ao ensino privado, priorizando interesses do empresariado, e não da comunidade”, denuncia Helenir.

11 mil professores a menos desde 2016

Arte: Dieese-RS

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O Censo revela ainda que no ano passado a educação pública dos gaúchos perdeu quase 1,4 mil professores, o que representa redução de 3,4% da categoria na comparação com 2020.

Assim como os demais indicadores, esse é um dado que registra uma série histórica de reduções, aponta o Dieese. “De 2016 a 2021, já são quase 11 mil docentes a menos em regência de classe na rede, o que representa uma redução de 22,4%”, constata o estudo do Dieese, elaborado pela economista Anelise Manganelli.

“A queda drástica é consequência ainda dos mais de sete anos sem reposição salarial e da diminuição do poder de compra da categoria, reduzido em mais de 50%”, acrescenta a presidente do Cpers.

EJA: corte de 56% nas matrículas desde 2019

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Em 2021, milhares de matrículas da EJA só foram homologadas após pressão do magistério e das escolas

Foto: Cpers/ Divulgação

Em 2019, o Rio Grande do Sul contava com mais de 71 mil matrículas na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em 2020, esse total caiu 40,9%, para cerca de 42 mil; e, em 2021, não chegou a 31 mil, redução de mais 25,6%.

Nos últimos três anos, portanto, o estado oferece 56% menos matrículas nos cursos de EJA. São mais 40 mil jovens e adultos excluídos.

O estado tem mais de 5 milhões de pessoas que não concluíram a educação básica, sendo 60 mil em Porto Alegre.

O professor de História Silvio Alexandre de Oliveira, do Neeja Paulo Freire, de Porto Alegre, relata o esvaziamento dos Núcleos Estaduais de Educação de Jovens e Adultos (Neejas).

Esvaziamento dos Neeja

A capital gaúcha possui outros quatro núcleos Darcy Vargas, Darcy Ribeiro, Vicente Scherer e Menino Deus, além dos prisionais. Ele explica que antes da pandemia o Paulo Freire chegou a ter uma média até 2,5 mil inscritos.

“Veio o fechamento das escolas, o retorno no modelo híbrido, trabalho semipresencial, depois com turmas reduzidas. Finalizamos 2021 com 1,1 mil e neste início de ano estamos com uns 150 inscritos”, explica.

Oliveira conta que a maioria dos jovens e adultos que não tiveram acesso ou não concluíram o ensino médio desconhece essa modalidade de ensino.

“Nossa batalha é permanente para divulgar o Neeja, explicar para as pessoas que se trata de educação pública, com aulas que se adaptam à realidade e ao horário delas. A gente faz isso porque é um direito dos trabalhadores ter acesso à educação pública e também porque o governo do estado quer fechar os Neejas”, ressalta.

Transporte e alimentação

Os estudantes de Neeja são jovens e adultos que querem e que precisam estudar e não estão conseguindo em função da crise econômica, lembra o professor. “Eles estão abandonando os estudos para priorizar o seu trabalho e muitos enfrentam o aumento de carga horária, são informais, ou estão na busca por trabalho”.

Para ele, a crise colocou a escola em segundo plano para a maioria dos brasileiros. “O que a gente observa, inclusive conversando com professores das escolas regulares, é que as crianças, assim como os jovens e adultos, estão abandonando a escola pela questão econômica do país. Por não ter recursos ou por necessidade de ajudar as famílias no sustento. Muitos alunos do Neeja não têm sequer dinheiro para a passagem do transporte coletivo ou para a alimentação”, alerta.

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