JUSTIÇA

MPT da Bahia investiga empresário por coação e assédio eleitoral

Além de espalhar outdoors irregulares pró-Bolsonaro, ruralista é investigado por coagir funcionárias a filmar voto com celular. Casos de assédio eleitoral explodem no segundo turno, de acordo com o MPT
Por Gilson Camargo / Publicado em 20 de outubro de 2022

Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

Encontro de ministros do TSE e do STF com procuradores eleitorais e do trabalho acendeu alerta sobre enxurrada de denúncias de assédio eleitoral no segundo turno: aumento de quase 160%

Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

O empresário gaúcho Adelar Eloi Lutz confirmou que é o autor de áudios divulgados em aplicativos de mensagens sobre coação eleitoral no ambiente de trabalho, mas alegou se tratar de “uma brincadeira com amigos”. O material compartilhado nesta semana foi anexado no inquérito aberto na última segunda-feira pelo MPT para investigar os crimes eleitorais atribuídos ao empresário – propaganda eleitoral irregular, coação e assédio eleitoral. O MPT deu dois dias para a defesa do empresário se manifestar.

Nas gravações que geraram o inquérito, Lutz afirma que forçou trabalhadoras da sua empresa a filmarem o voto com o celular preso ao sutiã no primeiro turno das eleições e que demitiu os funcionários que não votaram em Jair Bolsonaro (PL).

Lutz é ruralista e vive em Formosa do Rio Preto, cidade que fica a 750 quilômetros de Salvador. Em nova gravação publicada na quarta-feira, 19, nas suas redes sociais, ele diz que estava “apenas brincando com amigos”, que não quis cometer crimes eleitorais nem demitiu funcionários como afirma na gravação. Também alega que “nunca prejudicou ninguém” e que desconhece como os áudios foram parar nas redes sociais.

“Eu peço desculpa a todos, inclusive o pessoal da lei. Se for olhar cá em casa, eu tenho gente que trabalha aqui e que a família toda é PT. E eu botei para fora? Botei não. Só disse que tem que analisar, não tem pressão nenhuma”, desconversa.

Propaganda eleitoral irregular

Ele também é investigado pelo MPT da Bahia por propaganda eleitoral irregular por mandar instalar outdoors do atual presidente em Formosa do Rio Preto.

A procuradora Carolina Ribeiro, que atua no caso, também encaminhou ofício ao Ministério Público eleitoral com o relato dos fatos para a abertura de investigação no âmbito da justiça eleitoral. Apesar de ter concedido prazo para a defesa, o MPT já prepara modelo de termo de ajuste de conduta a ser apresentado ao autor das declarações ilegais para que seja negociado logo na primeira audiência.

Este é o segundo caso materializado por meio de provas que o MPT investiga nessas eleições de 2022 no oeste baiano, região conhecida pela forte atividade de produção de commodities agrícolas e que concentra grandes propriedades rurais e alta produção de grãos. Outros seis casos também estão sob análise do órgão, que contabiliza somente na Bahia nove denúncias de assédio eleitoral.

Os dados sobre assédio eleitoral foram atualizados pelo Ministério Público do Trabalho: aumento de quase 160% desde a semana passada, de 173 casos para 447. O estado com maior número de registros é Minas Gerais, com 70 casos, seguido do Paraná (64), Rio Grande do Sul (53), Santa Catarina (54) e São Paulo (46). Nos dois turnos da eleição presidencial de 2018 foram registrados 212 crimes dessa natureza.

No RS, liminar obriga Stara a cumprir legislação eleitoral

No Rio Grande, o MPT obteve liminar contra a empresa de implementos agrícolas Stara, com sede em Não me Toque. A empresa é alvo de uma ação civil pública (ACP) que apura denúncias de coação eleitoral. A liminar impõe oito obrigações a serem cumpridas pela empresa para garantir o direito dos trabalhadores ao voto sem direcionamento.

De acordo com a decisão, emitida pelo desembargador federal do trabalho Manuel Cid Jardon, em resposta a mandado de segurança impetrado pelo MPT-RS, a empresa deve “abster-se de veicular propaganda político-partidária em bens móveis e demais instrumentos laborais dos empregados; de adotar quaisquer condutas que, por meio de assédio moral, discriminação, violação da intimidade ou abuso de poder diretivo, intentem coagir, intimidar, admoestar e/ou influenciar o voto de quaisquer de seus empregados no pleito do dia 30 de outubro”.

A liminar também determina que a empresa se abstenha de obrigar, exigir, impor, induzir ou pressionar trabalhadores para realização de qualquer atividade ou manifestação política em favor ou desfavor a qualquer candidato ou partido político, bem como reforce em comunicados por escrito o direito livre de escolha política dos trabalhadores.

Também caberá à empresa a responsabilidade de divulgar comunicado por escrito a ser fixado em todos os seus quadros de aviso, redes sociais e grupos de WhattsApp, dando ciência aos empregados de que a livre escolha no processo eleitoral é um direito assegurado e que é ilegal realizar campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando ou influenciando o voto dos empregados com abuso da relação hierárquica entre empregador e trabalhador. A Stara também deverá divulgar em seu perfil do Instagram garantias de que não serão tomadas medidas de caráter retaliatório contra os empregados, como perda de empregos, caso manifestem escolha política diversa da professada pelo proprietário da empresa.

Entenda o caso da Stara

No dia 3 de outubro começou a circular em redes sociais e na imprensa comunicado da empresa aos seus fornecedores informando que os investimentos poderiam sofrer redução de 30%, com impacto na cadeia produtiva, condicionado ao resultado da eleição no segundo. Antes mesmo desse documento ter se tornado público, no entanto, a Procuradoria do Trabalho no Município (PTM) em Passo Fundo havia recebido, ainda em setembro, outras denúncias e elementos de tentativas de coação eleitoral, inclusive por meio de áudios, e estava apurando os fatos.

Justiça eleitoral

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, destacou que o enfrentamento ao assédio eleitoral no ambiente de trabalho, em decorrência do período eleitoral é passível de punição. A justiça eleitoral, avisou, “não irá tolerar esse tipo de assédio – caracterizado pela pressão e ameaças de empregadores no ambiente de trabalho para influenciar o voto de empregados”.

O alerta ocorreu após encontro do presidente do TSE com a ministra Cármen Lúcia, os ministros Benedito Gonçalves, Carlos Horbach e Sérgio Banhos, com o vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet Branco, e com o procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira. A pauta da reunião foi o assédio eleitoral durante o segundo turno.

Moraes relatou que os representantes do MP Eleitoral e MPT informaram o registro de mais de 430 representações sobre assédio eleitoral. Eles entenderam a necessidade de atuação conjunta entre a Justiça Eleitoral e o Ministério Público, com trocas de informações e inteligência. “Todos vêm acompanhando a questão não só do assédio, onde empregados que não votarem em determinado candidato ou votarem em tal candidato poderão perder o emprego, ou ainda, que a empresa vai fechar por causa disso”, destacou.

Assédio moral

Em nota técnica, o MPT reafirma sua legitimidade para atuar na prevenção e no combate ao assédio moral organizacional na administração pública. O documento ressalta que “o assédio moral é um risco psicossocial nos ambientes de trabalho e, assim como outras formas de violência, deve ser combatido no ambiente de trabalho”.

O comunicado reforça que a prevenção e o combate ao assédio moral organizacional estão inseridos no contexto do meio ambiente de trabalho seguro e saudável, independentemente do vínculo contratual de trabalho, seja ele celetista ou estatutário.

Fake news e assédio

O ministro ressaltou que o combate às fake news se complementa com o enfrentamento ao assédio moral e eleitoral, e ao trabalho conjunto das instituições, possibilitando que o eleitor tenha liberdade plena na hora de votar.

“Temos que banir esse absurdo. A eleitora e o eleitor devem poder, com a sua consciência, analisando as propostas que foram feitas, escolher o melhor candidato sem qualquer interferência ilícita. Reitero aqui que o assédio moral é crime, como tal será combatido e aqueles que praticarem o crime responderão civilmente, criminalmente e penalmente”, advertiu Moraes.

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