JUSTIÇA

“Não sei quem entregou documento”, diz Torres à CPMI sobre minuta do golpe

Integrantes da CPMI contestam versão do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do DF sobre o documento encontrado em sua casa pela PF
Da Redação / Publicado em 8 de agosto de 2023
“Não sei quem entregou documento”, diz Torres à CPMI sobre minuta do golpe

Foto: Bruno Spada/ Agência Câmara

Em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro, Torres alegou que o documento não tem valor

Foto: Bruno Spada/ Agência Câmara

O ex-secretário de Segurança do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça Anderson Torres disse nesta terça-feira (8) aos integrantes da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro que o texto chamado de ‘minuta do golpe’ é uma aberração jurídica e que não sabe quem entregou ou produziu o documento.

Ministro da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, Torres era secretário de Segurança Pública do DF no dia dos ataques às sedes dos três Poderes. Na ocasião, ele estava nos Estados Unidos.

Anderson Torres chegou a ser preso por 117 dias, a pedido da Polícia Federal, acusado de omissão. Atualmente, está solto e usa tornozeleira eletrônica.

“No dia 10 de janeiro, durante uma busca e apreensão em minha casa, a polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta, que vai para a coleção de absurdos que constantemente chegam aos detentores de cargos públicos”, disse.

“Vários documentos vinham de diversas fontes para que fossem submetidos ao ministro. Em razão da sobrecarga de trabalho, eu normalmente levava a pasta de documentos para casa”, completou. “Os documentos importantes eram despachados e retornavam ao ministério, sendo os demais descartados. Um desses documentos deixados para descarte foi o texto chamado de ‘minuta do golpe’”, relatou Torres.

No depoimento à CPMI, ele classificou o documento como imprestável para qualquer fim, uma aberração jurídica. “Esse papel não foi para o lixo por mero descuido. Não sei quem entregou esse documento apócrifo e desconheço as circunstâncias em que foi produzido. Sequer cogitei encaminhar ou mostrar para alguém.” Ele disse ainda que soube pela imprensa que outras pessoas receberam documento semelhante.

Torres destacou que tem interesse no esclarecimento dos fatos e que teve atuação técnica e profissional nos cargos em que ocupou, agindo dentro da lei. Ele ressaltou ainda que, como ministro, respeitou a autonomia das polícias e nunca interferiu em investigações. Ele lembrou que, após os fatos de 8 de janeiro, retornou assim que pode ao Brasil e se apresentou à Justiça.

Acampamentos

 
Sobre os acampamentos de manifestantes em frente aos quartéis, em Brasília, após as eleições, o ex-ministro disse que a Polícia Federal teve total liberdade para monitorar esses acampamentos. “Nunca houve omissão ou leniência de minha parte enquanto ministro da Justiça em relação a esses acampamentos. Nunca houve impedimento para que fossem monitorados ou investigados”, afirmou.

“Quando assumi a secretaria de Segurança do DF, minha primeira ação foi tratar do desmonte do acampamento em frente ao quartel general do Exército”, acrescentou. A retirada total do acampamento, de acordo com Torres, estava planejada para o dia 10 de janeiro.

Protocolo descumprido

Segundo Anderson Torres, como secretário de Segurança do DF, até dia 6 de janeiro à noite ele não tinha qualquer informação de que haveria “ações radicais” no dia 8. E garantiu que, se o protocolo de ações integradas (PAI) previsto para o dia das manifestações tivesse sido seguido à risca, os atos teriam sido evitados.

O protocolo de ações integradas, conforme Torres, proibia as pessoas de portarem, durante manifestações, instrumentos capazes de produzir lesões corporais e danos ao patrimônio, como mastros de bandeira, canos de PVC, materiais metálicos e madeiras. O protocolo previa ainda o fechamento da Esplanada dos Ministérios.

“O que posso afirmar com toda a segurança é que houve falha grave na execução do PAI. Se tivessem cumprindo à risca o plano, os atos do dia 8 de janeiro não teriam sido consumados”, garantiu.

Anderson Torres disse que viajou de férias com a família no dia 6 à noite, após aprovar o protocolo de ações e enviar a todos os envolvidos. O ex-ministro acrescentou que a viagem foi programada com antecedência e que as passagens foram compradas no dia 21 de novembro. Torres disse aos parlamentares, no entanto, que não teria viajado se tivesse recebido os alertas sobre os atos violentos.

Ele disse ainda que, ao assistir aos atos de vandalismo, chegou a passar mensagem para o secretário em exercício para impedir que os manifestantes se aproximassem do Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que o Planalto e o Congresso já estavam invadidos, mas “ele não conseguiu impedir”.

Polícia Rodoviária Federal

Sobre as acusações relativas a operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para cercear o direito do voto, especialmente no Nordeste, Anderson Torres disse à CPMI que não houve interferência do ministério sobre a PRF.

“Ninguém deixou de votar, e o próprio TSE reconheceu isso. O comparecimento no segundo turno foi superior ao primeiro turno”, disse. Ele acrescentou que nunca questionou o resultado das eleições de 2022 e que colaborou com a equipe de transição de governo. 

Silêncio na CPMI

Embora Torres tenha decidido falar, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, autorizou o ex-secretário a ficar em silêncio durante a oitiva. Moares disse, porém, que Torres tem o dever legal de “manifestar-se sobre os fatos e acontecimentos relacionados ao objeto da investigação”.

A decisão permite que o ex-ministro seja acompanhado por advogados durante o depoimento na CPMI e proíbe o contato pessoal e individual com os senadores Marcos do Val (Podemos-ES) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

O presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA), no entanto, informou que a advocacia do Senado concluiu que os senadores poderiam estar no mesmo recinto e questionar o depoente durante a oitiva.

O requerimento para ouvir Torres como testemunha foi feito pela relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA).

Trapalhadas da caserna

Militares lotados na ajudância de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), na tentativa de encobrir diálogos de teor golpista, apagaram mais de 17 mil mensagens da caixa de entrada dos e-mails, nos computadores do Palácio do Planalto, mas esqueceram ou desconheciam que era necessário apagar também os conteúdos da lixeira. O ato falho foi noticiado pela GloboNews e ganhou repercussão em jornais e nas redes sociais nesta terça-feira.

O acesso de servidores da atual gestão à troca de mensagens entre funcionários do governo anterior, foi noticiado pela repórter Isabela Camargo. O comentarista do canal pago de notícias da Globo, Octavio Guedes interrompeu o boletim às gargalhadas e colocou no ar uma vinheta do programa Os Trapalhões.

“É isso. A gente observa pelo levantamento que tinha um modus operandi que era deletar da caixa de entrada, mas faltou ali uma informação básica: tinha que deletar novamente. Só um fez e os outros auxiliares do ex-presidente não tiveram o mesmo cuidado”, reiterou a repórter.

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