MOVIMENTO

Entregadores por aplicativos paralisam em todo o país

Categoria denuncia condições de trabalho precárias, arbitrariedades por parte das empresas e sistema injusto de avaliação e remuneração
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 1 de julho de 2020
Paralisação na ponte Octávio Frias de Oliveira, no Brooklyn, em São Paulo: a cidade tem entre 50 e 70 mil entregadores de aplicativos

Foto: Twitter/ Reprodução

Paralisação na ponte Octávio Frias de Oliveira, no Brooklyn, em São Paulo: a cidade tem entre 50 e 70 mil entregadores de aplicativos

Foto: Twitter/ Reprodução

O #BrequeDosApps, como tem sido chamado nas redes sociais o movimento de entregadores de aplicativos como Uber Eats, iFood, Rappi e Loggi, foi considerado um sucesso pelos organizadores. Mobilizado basicamente por outro aplicativo, o WhatsApp, adesões foram contabilizadas nas maiores cidades do Brasil. Alessandro da Conceição, o Sorriso, presidente da Associação de Motoboys Autônomos e Entregadores do Distrito Federal (Amae-DF) registra que os vídeos e áudios que recebeu nesta quarta-feira, 1º, demonstram grande movimentação e barulho na busca de melhores condições de trabalho de várias partes do país. “Só eu faço partes de grupos do Acre, Espírito Santo, Bahia, São Paulo, Rio”, exemplifica.

Conceição, da Associação de Motoboys Autônomos e Entregadores do DF: “Eles estão ganhando milhões nas nossas costas e dizem que a gente é autônomo, mas não nos deixam ser autônomos”

Foto: Arquivo Pessoal

Conceição, da Associação de Motoboys Autônomos e Entregadores do DF: “Eles estão ganhando milhões nas nossas costas e dizem que a gente é autônomo, mas não nos deixam ser autônomos”

Foto: Arquivo Pessoal

Além da mobilização dos entregadores no WhatsApp, nas redes as postagens das lideranças também pediram que os consumidores não realizassem pedidos como forma de apoio aos trabalhadores, que se consideram extremamente explorados pelas plataformas de tele-entrega.

Mesmo que nem todos os entregadores tenham parado, o movimento foi uma demonstração de força da categoria, segundo o motoboy Simões, do Rio de Janeiro. “A gente está fazendo o nosso papel. O movimento aconteceu”, comemora.

Em comum, Sorriso e Simões relatam a grande receptividade e apoio que receberam da população. “O pessoal bateu palmas. Fizeram vídeos e colocaram no Facebook”, diz, relata Simões, visivelmente emocionado. Simões é um exemplo evidente de uma das reivindicações, além da melhoria do pagamento por entrega. Para evitar uma suspensão ou bloqueio que diz ser realizado arbitrariamente pelas empresas pediu para não ter seu nome totalmente identificado.

Para ele, as manifestações de carinho que foram colhidas enquanto as motos e bicicletas desfilavam em protesto no Rio conferem uma dignidade que lhes é negada pelas plataformas. “Não somos arruaceiros; somos trabalhadores e estamos gritando. A gente precisa ser ouvido. Isso é importante”, desabafa.

Vídeos e barulho ensurdecedor

Concentração na Praça da Alfândega, em Porto Alegre

Foto: Twitter/ Reprodução

Concentração na Praça da Alfândega, em Porto Alegre

Foto: Twitter/ Reprodução

A adesão dos trabalhadores da categoria se estendeu por todo o Brasil e uma multiplicação de vídeos de manifestantes ao lado de motos e com mochilas de entregas nas costas tomaram contas das redes sociais.

Em Belo Horizonte (MG), entregadores questionam o valor repassado de R$ 3,50 por entrega e que é o mesmo independente das condições climáticas e pedem reconhecimento de direitos.

Em cidades como São Paulo, São Luís, MA, e Florianópolis, SC, trabalhadores ainda realizaram bloqueios de estabelecimentos e centros comerciais de onde parte a maioria das entregas.

Apesar do caráter nacional da paralisação, São Paulo foi a cidade com mais movimentação nas redes sociais. Com uma estimativa de 145 mil entregadores prestando serviços para os aplicativos de tele-entrega no país, a cidade tem entre 50 e 70 mil trabalhadores do ramo, de acordo com Edgar da Silva, presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (Amabr).

Questão trabalhista e de imagem

Entregadores de comida por aplicativos paralisam em todo o país

Foto: Reprodução

Movimento em Brasília: longos trajetos e tarifa irrisória

Foto: Reprodução

O debate sobre a relação de trabalho entre aplicativos e entregadores tem se fortalecido ao mesmo tempo que as plataformas estão se tornando cada vez mais relevantes. No Brasil, a Justiça trabalhista já tomou decisões favoráveis e contrárias ao reconhecimento do vínculo empregatício dos trabalhadores. No mundo, governos discutem formas de dar mais direitos a quem presta serviços por meio dos aplicativos.

Para o motoboy Sorriso, a paralisação de hoje não é a primeira, nem será a última. “Eles estão ganhando milhões nas nossas costas e dizem que a gente é autônomo, mas não nos deixam ser autônomos”. É assim que ele sintetiza também um dos motivos da manifestação: o sistema de pontuação que as plataformas criaram para dar “qualidade” aos seus serviços.

“Como é que você pode chamar alguém de autônomo se você não pode rejeitar uma corrida ou deixar de trabalhar um ou dois dias pra não ser suspenso ou bloqueado?”, indaga. Ao mesmo tempo que ironiza, Sorriso denuncia: “A IFood diz que não bloqueia, mas a gente sente na pele que isto acontece”.

Executivo de um aplicativo ouvido pelo Extra Classe que também pediu para não ser identificado disse que as plataformas acreditam que o movimento não dê um grande impacto operacional e financeiro no momento. A preocupação concreta é o possível efeito negativo que a paralisação pode ter para a imagem das empresas.

DIREITOS MÍNIMOS – A Central Única dos Trabalhadores (CUT) divulgou nota de apoio à greve dos entregadores de aplicativos. “A organização da categoria é o caminho para colocar limites às empresas de aplicativos e garantir direitos e trabalho decente. Redução das taxas e aumento da remuneração das entregas com remuneração mínima, limite de jornada, alimentação durante a jornada, licença remunerada, seguro de vida e seguro saúde, responsabilidade com a manutenção dos instrumentos de trabalho, equipamentos de proteção e garantia de condições de segurança para a realização do trabalho são obrigações das empresas, bem como o fim da política de pontuação e de bloqueio. Trata-se de direitos mínimos, básicos”.

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