ECONOMIA

Banco Central independente para quem?

Áudio vazado do banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, reacende a velha polêmica sobre a quem serve a suposta independência do BC
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 26 de outubro de 2021
Em19 de dezembro de 2015 o banqueiro André Esteves saia do Complexo Penitenciário de Gericinó, onde esteva preso temporariamente desde o dia 24 de novembro, no Presídio Bangu 8, por conta de outro áudio vazado no âmbito da Operação Lava Jato. Posteriormente seria absolvido, em 2017, por falta de provas

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

LAVA JATO – Em 19 de dezembro de 2015 o banqueiro André Esteves saia do Complexo Penitenciário de Gericinó, onde esteve preso temporariamente por 23 dias, no Presídio Bangu 8, por conta de outro áudio vazado. Posteriormente seria absolvido, em 2017, por falta de provas

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Às vésperas da sétima reunião do ano Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) para definir a taxa básica de juros, a Selic, áudio vazado do banqueiro André Esteves (BTG Pactual) reacende uma polêmica: Banco Central independente para quem?

O questionamento corre solto nas redes sociais desde ontem, quando o portal Brasil 247 divulgou as falas de Esteves para um grupo interno do BTG Pactual. Segundo o próprio 247, o “striptease do banqueiro revela para os brasileiros que o dinheiro corrompe a democracia e dita as cartas na política econômica, assim como manda em todas as instituições da República”.

Não é para menos. O dono do banco, entre risadas dos ouvintes, relata receber ligações de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, e de Roberto Campos Neto, presidente do BC, para discutir e opinar sobre a política econômica.

No caso de Lira, Esteves disse ter recebido ligação para que se manifestasse sobre a debandada ocorrida no Ministério da Economia. Era recente ocasião do anúncio do calote que será dado aos precatórios para que o governo Bolsonaro possa viabilizar o Auxílio Brasil, programa que o presidente aposta para reverter sua impopularidade e acabar com o Bolsa Família.

Já sobre o presidente do Banco Central, Esteves revelou uma conversa ocorrida há mais de um ano. Roberto Campos Neto queria saber a opinião do banqueiro sobre qual deveria ser o que o mercado classifica como lower bound (limite inferior) da taxa básica de juros.

Senado

O senador Fabiano Contarato (Rede) apresentou nesta terça-feira, 26, pedido de convocação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, p/ explicar, no Senado, suas relações com o banqueiro André Esteves. “Ora, as políticas monetária e de crédito afetam diretamente a rentabilidade de bancos de investimento! Cobramos apuração Já!”, disse.

Pedra cantada

Artur Lira até o momento não se manifestou. Em nota, o BC afirma que é prática de autoridades de supervisão em todo o mundo manter “contatos institucionais periódicos com executivos de mercados regulados e não regulados”.

O escritor Fernando Moraes é um que não engoliu a desculpa do BC. “A promiscuidade entre o presidente do Banco Central e o banqueiro André Esteves explica, para quem não ainda não tinha entendido, por que ‘o mercado’ vinha lutando há tanto tempo por um BC ‘independente’”.

Moraes é jornalista, biógrafo, um homem das letras. Pode até ter o seu conhecimento econômico questionado.

Já com Maria Lucia Fattorelli, auditora fiscal da Receita Federal do Brasil de 1982 a 2010, ex-presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco Sindical) e, atualmente, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, a história é outra.

Em novembro de 2020 ela considerou “uma vergonha” a aprovação da autonomia do BC no Congresso Nacional. Se a decisão, de fato, oficializava o histórico de um BC comandado por banqueiros, vinha com o agravante de que um presidente da República estadista teria que lidar com um BC dos bancos, não do país.

Negócios à parte e arrogância

Outros pontos que estão sendo evidenciados são as falas de Esteves que foram da comparação do golpe de 1964 ao impeachment de Dilma Rousseff aos negócios do BTG realizados durante o governo Bolsonaro.

Lembranças de que o ministro Paulo Guedes (Economia) foi um dos fundadores do Pactual e a compra de uma carteira de créditos de R$ 2,9 bilhões do Banco do Brasil por um fundo operado pelo BTG Pactual que pagou R$ 371 milhões mantêm o cheiro de suspeita nas redes. No caso da transação com o BB, até porque ele nunca havia cedido uma carteira sua a um grupo de fora da holding.

No áudio, além de registrar a importância de Bolsonaro ficar calado para se reeleger, Esteves ainda disse: “os caras (do Congresso e do Supremio Tribunal Federal) não nascem sabendo. Então, não custa nada a gente educá-los”.

Para a presidente da PT, Gleisi Hoffmann, o conjunto do “striptease’ segundo o 247 revela que, além de “preconceito e arrogância”, o conteúdo das conversas do banqueiro de fato evidencia que o mercado financeiro determina as prioridades da Câmara e do BC.

Passado não muito remoto

Em novembro de 2015, André Esteves foi preso pela Polícia Federal em sua casa, no Rio de Janeiro. Ele teve sua prisão temporária decretada após a divulgação de uma gravação obtida pelo Ministério Público Federal, na qual o então senador petista Delcídio do Amaral afirma que André Esteves estaria colaborando para obstruir investigações da Lava Jato. Posteriormente, em 2018, Esteves viria a ser absolvido por faltas de provas e voltou ao controle do seu banco, de onde esteve afastado durante sua defesa.

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