OPINIÃO

“Faria tudo de novo”

Por Carla Cervera Sei / Publicado em 10 de maio de 2016

“Não é fácil ser demitido, mesmo quando se quer sair e, de certa forma, se esperava por isso”. A fala de uma professora ao ser atendida no âmbito do Núcleo de Apoio ao Professor Contra a Violência (NAP), amplo trabalho de escuta oferecido pelo Sinpro/RS aos professores, aponta para o delicado momento da demissão do profissional após um longo período de trabalho e investimentos. Uma situação que remete ao “luto” a ser vivido.

Para além desse momento difícil, com o qual alguns professores lidam com maior facilidade e outros nem tanto, ressalto algumas questões cruciais trazidas pelos professores em relação às escolas e universidades. Eles estão sentindo “na carne” a lógica capitalista invadindo e transformando as relações de trabalho nas escolas e universidades. Sentem a perda e a troca das relações mais humanas e humanizantes de outrora por um vazio de relacionamento e de transmissão do conhecimento.

Algumas falas demonstram claramente essa percepção: “As escolas estão se tornando empresas, são mercantilistas e o professor, um objeto descartável”. “Não é mais uma faculdade familiar, virou empresa”. “Agora a relação é empresarial e o professor só cumpre formalidades”. “O aluno virou cliente”. Apesar desse cenário, ainda amam o que fazem e não fariam outra coisa.

Mas eles se questionam: até quando ou até que limite seguirão suportando trabalhar em “escolas empresas”?

As escolas de educação infantil merecem atenção especial, visto que as relações de trabalho nessas instituições são “pouco profissionais”, quase voluntárias, de ajuda à escola. Por outro lado, também pude escutar professores muito satisfeitos com algumas instituições que ainda preservam o respeito e o investimento na educação e na figura do professor.

Em relação ao momento da demissão, os professores enfatizam a falta de preparo das instituições. Poucos professores pareciam de fato compreender os motivos de seu desligamento. Mesmo aqueles que se dedicaram por mais de 20 anos, por vezes, foram demitidos através de uma carta. Mostram sua indignação e tristeza pelos anos de investimento, de trabalho, de produção não reconhecidos pelo empregador no momento da demissão.

O que pude escutar remete ao rompimento de um laço com a “escola empresa” em uma lógica de mercado e não do rompimento com a “escola campo da educação”, ou seja, ligada ao desejo de ensinar, de ser professor. Talvez seja isso que os ajude a elaborar a perda vivida, o luto, para poder afirmar que fariam “tudo de novo”.

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